quinta-feira, 29 de junho de 2017

OS INCÊNDIOS CONTINUAM NA LÍNGUA DOS PIRÓMANOS…


Por muitas festas e folguedos que nos cerquem, é impossível passar indiferente a Pedrógão Grande, como impossível é atravessar o fogo sem chamuscar a pele. Logo à entrada, uma conclusão linear: um incêndio, tal como uma desgraça, nunca vem só. É o que se passa diante dos nossos olhos. Acabaram-se os fogos naquela encosta beirã, outros se reacenderam na praça pública. Incendiários à solta aí andam nos jornais, nos cafés, nas escolas, nos laboratórios e, sobretudo, no caldeirão-mór chamado Parlamento. Há quem os chame de bombeiros sem bomba e até, na gíria do ridículo, ‘treinadores de bancada’. É vê-los por quanto é beco sem saída a perorar, esbracejar e espumar ciência de cordel, num vale-tudo para incendiar papel e tinta a granel. Tenho seguido conferências e conferencistas, debates, debutantes e debutados, especialistas e experimentalistas, todos num tropel de contradições tais que dariam para colocar as teses e o seu contrário, em paralelismo esclarecedor. Alguns casos:
Que deveria repor-se o gado nas serras para limpar os terrenos. Mas logo os vegetarianos e ambientalistas mandam escorraçar os pobres bichos do seu habitat natural.
Que deveriam regressar ao seu estatuto os guardas florestais, ampliar as Corporações de Bombeiros e pagar-se-lhes um salário melhor. Mas lá vêm os da guarda, os marinheiros, os precários, os da pré-reforma, os professores, os médicos, todos com sua razão para puxar o lençol à sua testa, ficando desabados os pés dos ‘soldados da paz’.
Que deveriam restabelecer-se os extintos governadores civis como eixos indispensáveis à coordenação das operações. E do outro lado, a inutilidade do posto face à descentralização dos poderes e transferências para as autarquias.
Que deveria combater-se a desertificação do interior. E, ao mesmo tempo, eliminam-se juntas de freguesia, escolas, agências bancárias, correios e centros de saúde.
Que deveria combater-se a proliferação dos eucaliptais. E logo esperneiam os industriais e os agricultores de poltrona gritar que o sector “garante ao nosso PIB  2800 milhões de euros anuais através das pasta e do papel”.
Que deveria (nem a caça escapa) reinstaurar-se o velho regime cinegético, com facilidades e apoios aos caçadores, como vigilantes ‘pro bono’ da floresta. No entanto, não são poucas as suspeitas da classe sobre as vantagens decorrentes dos incêndios.
Que deveriam  os donos dos latifúndios baldios ser obrigados a limpar as terras, sob pena de lhes ser retirado o título de propriedade ou, no mínimo, a vendê-las ao Estado, reinstaurando a sábia “Lei das Sesmarias”. Mas logo salta o dogma das sanções sobre a propriedade privada, previstas e punidas no nosso ordenamento jurídico, tanto por lei ordinária como  pela nossa Lei Fundamental.   
Para sintetizar: Que deveriam ser alocar-se verbas substanciais ao planeamento florestal e ao coberto agrícola, uma vez por todas, já que nunca tal aconteceu neste país. Porque “a floresta é o nosso futuro”. E de arrasto gritam de outros quadrantes: “O mar é o nosso futuro”… “A saúde é o nosso futuro”… “A educação é o nosso futuro”.
Onde achar quartel para conter tantas chamas e conciliar tantas contradições?!...
No Fórum da Liberdade, todas as críticas são admitidas e todas as soluções comportam um valioso peso contributivo. O que repugna, porém, é o virulento dardejar de setas em fúria por parte de alguns que, tendo culpas antigas no cartório, irrompem desenfreados, olhos de tição em brasa e cara de barrotes queimados, bradando e vociferando, como se só agora descobrissem a velha “Caixa de Pandora” onde sempre viveram acomodados, insensíveis.
Enquanto a barafunda inunda o espaço, há gente que sofre. Tanto as vítimas inocentes como aqueles que, por mandato público, são chamados a intervir e  resolver. A todos, uma palavra e um voto: Força, porque a tarefa é imensa, Ars longa, vita brevis! Tocar na floresta é construir para a eternidade.

29.Jun.17

Martins Júnior

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