quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

“O PRAZER DE VER TRUMP A DERRETER-SE”

                                                      

“O arco sempre tenso perde a elasticidade” – já o descobriram os filósofos epicuristas da velha Grécia. Por isso e para que ele não perca  a  capacidade  propulsora que lhe é intrínseca, torna-se necessário descomedi-lo, destemperá-lo de vez em quando para que, ao retesá-lo de novo, ganhe a energia de uma flecha afiada.  Traduzindo em linguagem nossa, de animais sensitivos, é saudável descontrairmo-nos, dar largas à ‘insustentável leveza’ da brisa que povoa o nosso crânio, enfim, soltarmos uma gargalhada vadia. Porque a rir também se aprende.
É o caso. Devo confidenciar que uma das mais subtis formas do talento humano vou encontrá-las, imaginem, nos chamados cartoon’s dispersos em jornais e revistas. Acontece, até,  comprar uma publicação só pela imaginação criadora do cartoonista de serviço. Se uma imagem vale mil palavras, posso afiançar que, em certos traços de génio, uma caricatura vale mil imagens.
É o que transcrevo, hoje, do El País, com o mesmo título que lhe deu o jornalista. Tudo por causa de uma vela. “O prazer de ver Trump  a derreter-se”.
As voltas e retortas que uma vela pode dar. Símbolo da fé, velório de saudade, canção felicitante de aniversário natalício, chama de amor romântico na mesa de namorados – tudo isso, tudo, reduzido a uma escancarada gargalhada de caserna… A metamorfose semântica de um nobre  significante e o verrinoso sarcasmo do seu significado! Aí está o talento de Curro Chozas  e Juan Oubina, criativos publicitários, ao espalharem por milhões de americanos, milhões por todo o mundo, o busto de Trump, moldado em cera maciça, ostentando na cabeça o pavio cerebral, símbolo da esquizofrenia megalómana e da sua mais requintada auto-destruição.  Enfim, um bobo, nada  devendo à boçalidade de Nero. Para ‘iluminar’ a cena e a sua mensagem, uma ingénua legenda: “É só uma questão de tempo”!
                                                       

O poder da ironia! Esse toque de estética e virulência que imortalizou o ‘nosso’ Eça! “Sete gargalhadas e meia à volta da muralha  da cidade bastam para deitá-la ao chão”…  Quando trabalhada com mestria,  a sátira é mais poderosa que um exército.
Tenho para mim que a “vela de Trump” fez mais estragos que as tentativas de empechment  já ensaiadas, sem êxito, do Senado americano. Ouso mais: o “Trump de cera” já o destruiu mais que os ameaçadores mísseis do atarracado  norte-coreano. Aquele pavio erecto tem a potência de uma implosão silenciosa, em que o protagonista é autor e vítima de si próprio.
Resta saber se, enquanto duram as 170 horas de lenta combustão do ‘bolo’ encerado, o homem terá tempo de vingar-se de Curro Chozas, cartoonista espanhol, residente em Los AngelEs…  Risadas à parte, não deixa de ser deprimente para o nosso mundo a vela – e, mais que a vela astuta, o perigoso  vexame do país mais poderoso do planeta.
“É só uma questão de tempo” – oxalá  seja assim. Para a salvaguarda civilizacional do século XXI.

25.Jan.18

Martins  Júnior.

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