quinta-feira, 29 de novembro de 2018

TODA A NOITE AGUARDANDO A MANHÃ


Mais que homenagem - recordando e acompanhando Francisco Álvares de Nóbrega, “O Nosso Camões” (1773-1806)


Não te levanto trono nem ara
Não te coroo a fronte do louro dos poetas
Hoje
Sentado no penedo desta noite rara
Espero aquela “hora atenuada”
Em que viste “a primeira luz do sol sereno
Em pobre sim mas paternal morada”

Seguir-te-ei os passos pela estrada
Da Banda d’Além ao Cais do Desembarcadouro
Que ainda guarda a tua infância
No chão pedrado que transformaste em ouro

Contigo rumo ao monte funchalense
Parnaso da Ilha varanda capital
De onde largaste a brisa e o vendaval
De rimas glosas sátiras éclogas canções
Com que douraste o céu cinzento
Do Funchal

Ver-te no alto das torres do poético festim
Foi como ver o sol de Abril futuro
Nascer dentro de mim
Mas depressa se fez noite de breu
Quando outro Torres de satânico solidéu
Te sufocou te agrilhoou e sepultou
No antro vil do sacro Aljube
Onde o velho Satã devora a juventude

Na mesma cela do crime e do ultraje
Curto contigo a mágoa o desespero
De ver em ferros o justo o inocente

Connosco está Barbosa du Bocage
Vate Sadino o combatente
Elmano teu e nosso Talismã
Da Liberdade que chega
No primeira colina da manhã

Foi o mais ledo e o mais amargo
De todos os avatares
Vimos fugir o Torres o déspota mitrado
E vimos logo surgir Luis Rodrigues Vilares
O Arcanjo Libertador
Que nos quebrou as grades do pérfido Aljube

Mas tarde chegou a manhã da Liberdade
Contigo subi a ladeira da rua estreita
De São João Nepomuceno
Deitei-te na enxerga como se ajeita
Um sem-abrigo justo sereno

Por tuas mãos
Já mortiças mutiladas
Do tormento e não da idade
Fechaste as cortinas da vida
E abriste as janelas
Da perdida Liberdade

Partiste lá longe
E eu fiquei
À beira-rio de Machico
Por isso toda a noite
Aqui fico
Olhando aquela janela
Para entregar-te a manhã
Serena e livre
Que tanto sonhaste
E nunca alcançaste

29.Nov.18
Martins Júnior


terça-feira, 27 de novembro de 2018

DEZ ANOS É MUITO TEMPO?!...


                                                

Serão breves as palavras, mas “linda, longa é a melodia imensa”  que nelas vai! Assim teria classificado Sebastião da Gama o dia em que toda a madureza etária de Machico e, simbolicamente com ela, os idosos de todas as paragens   festejaram o 10º aniversário da sua Universidade Sénior. Este ano, o anúncio do Natal não esperou pelas asas brancas dos anjos de Belém. Quem o trouxe foram as mãos calejadas e as faces enrugadas dos anjos terrestres, a população idosa do concelho.
E foi essa a “linda, longa melodia imensa” que inundou Machico numa semana de expressivas comemorações. Desde o desfile da canção nacional, o fado, sexta-feira última, até às tertúlias e conferências sobre o “envelhecimento positivo” e o trabalho académico de investigação acerca das “universidades seniores”, a Terceira Idade de Machico tem manifestado uma vitalidade anímica que em nada (só no cômputo dos anos, talvez) desmerece da juventude outrora vivida.
No vasto salão de festas onde se realizou o convívio respirava-se uma atmosfera de optimismo e franca simpatia. Ao olhar do observador atento não escapou a mensagem de toda aquela gente, cada qual com a sua história de luta e sofrimento, irmanando no mesmo abraço as montanhas e o mar, pois todos quantos ali estavam provinham dos cinco pontos cardeais do concelho, tantos quantas as cinco freguesias que o compõem. Particularmente tocante e comovedor foi ver ali, em directo, a “sénior”  de 87 anos, feliz e ligeira como uma ave, aproximar-se e partir  o bolo-rei de aniversário, com a elegância e o pragmatismo que sempre cultivou há quase nove décadas.
Que bela festa| de Natal, plena e intimista, da qual se podia dizer – a apoteose do provérbio, “Uma só alma e um só Coração”! Tanto melhor, por ser inteira e verdadeira. A Junta de Freguesia de Machico, em cujo local a Universidade Sénior está sediada, saiu feliz e prestigiada desta histórica efeméride, secundada pela Câmara Municipal, que também marcou presença notória.
10 anos é muito tempo? – talvez para a inexperiente infância da vida. Mas para  quem há décadas se passeia nas ondas da história, ora calmas, ora agitadas, significam apenas o sopro leve sobre as velas de mais um aniversário.  Palmas e cânticos. E um Voto: Que continuem sempre acesas as velas da renovada juventude da  Universidade Sénior de Machico!

27.Nov.18
Martins Júnior
                                                                                                                                                                                               


domingo, 25 de novembro de 2018

REGIME POLÍTICO DA IGREJA CATÓLICA?... MONARQUIA, POIS CLARO!


                                                                   

         Os mais entendidos acrescentam: Monarquia Absoluta.
         Fundamentação jurídico-canónica: “O Senhor é Rei”. E hoje, domingo último do ano litúrgico é, precisamente, a grande Festa do Cristo-Rei! Por tudo quanto é santuário, igreja ou modestíssima capela ecoam hossanas “àquele que vem em nome do Senhor-Rei do Universo”
Como e porquê se instaurou o regime monárquico sob a égide do Rei-Cristo`?... Tudo começou desde os alvores da criação do mundo e, mais impressivamente, com o transgeracional mito do povo judeu: desejoso de libertar-se .dos povos opressores que o dominavam e lhe sufocavam a autonomia, os hebreus estruturaram o seu “corpus” doutrinal e constitucional na perspectiva da realeza perdida e da sua recuperação gloriosa na pessoa de um Messias, Rei Poderoso, que destronaria o regime colonial em que vivia o judaísmo e proclamaria um novo Reino  e um novo Rei, sucedâneos do período áureo de David e seu filho Salomão.
A partir de então, sobretudo no século IV,  marcado pelo imperador Constantino Magno, a Igreja adoptou, sem questionar, a primitiva matriz do judaísmo e, mais tarde, di Islamismo) (as três religiões do LIVRO (a Bíblia), arvorando na testa  e no estatuto de Cristo o magnificente título de Rei. E firmou trono imperial, Constituição e Práxis de um verdadeiro Reino, com palácio, exército, banca, tribunais, embaixadas, contabilidade fiscal de impostos, mordomias e, pasme-se, com um corpo policial de élite, denominado guarda suíça, ainda no activo, a qual o Papa Francisco ainda não conseguiu extinguir. Quanto aos titulares de cargos eclesiásticos, alinhou-os em príncipes (bispos e cardeais), embaixadores, monsenhores e subalternos, em tudo talhado à imagem e semelhança da hierarquia militar, desde general a “soldado raso”. Para que nada ficasse omisso, o legislador eclesiástico reservou títulos e comendas identitárias à classe episcopal, obrigando-os a antepor  ao nome de baptismo o chancela real de “DOM”. o mesmo título reservado aos reis.
A este propósito, seja-me permitido partilhar com os meus amigos,  uma ligeiro excerto da entrevista  que a agência “Ecclesia”  transmitiu hoje, domingo, pelas seis horas, via RDP, (como de resto faço sempre antes da minha primeira eucaristia das sete da manhã) . No programa, dois sacerdotes, Daniel e Rui (não sei se algum deles será o futuro inquilino do nosso Paço Episcopal) trocavam impressões sobre a sua ordenação episcopal que ocorreu hoje à tarde em Lisboa. O que vivamente mais me impressionou foi o tratamento que mutuamente se davam um ao outro: “Como disse o sr. D. Daniel, …”.  e o outro correspondia no mesmo tom: “Como disse o sr. D. Rui…”, num desenrolar de ideias e projectos, repetidamente salpicado de DOM para ti, DOM para mim, DOM para cá, DOM para lá. Quere-se dizer: ainda não eram bispos (sê-lo-iam à tarde) e já se deliciavam numa troca de mimos e galhardetes de acentuado pendor palaciano.  Desculpar-me-ão os reverendíssimos interlocutores, mas para os meus 80 anos de vida e 56 de padre, aquele ritual cheirava-me a velha neftalina fora-de-prazo…
E porquê fora-de-prazo?
Respondo com outro pergunta. Terão eles (e nós também) posto em causa o dilema  da verdadeira identidade do nosso, o histórico Rei-Cristo?... Alguma vez aceitou Ele que lhe chamassem Senhor DOM Jesus?... E quando é que a liturgia católica exigiu ou incluíu, relativamente ao seu Fundador, a nomenclatura Senhor DOM Cristo?... E então?... Por outras palavras: a qual tipologia real pertencia Jesus?
Deveria deixar a cada um de vós a merecida resposta. Mas, para encurtar tempo, ousarei dizer, sem prejuízo de contradita, que o Jesus-Rei diante de Pilatos nada tem a ver como a pompa imperial do Vaticano. Direi que o nosso Rei-Jesus não possuía palácio, nem banca,  nem guarda-costas, nem exército, nem embaixadas. Não era ditador, juntava-se aos pobres, amava os marginais, comia com os pecadores,  compreendia  até as prostitutas. Ele a si próprio se definiu diante de Pilatos: ”O meu Rino não é deste mundo… Eu sou Rei da Verdade”.  Na era em que vivemos, Francisco Papa incarna, como nunca antes se viu, a condição do autêntico Rei Cristo, “aquele que transporta consigo o cheiro das ovelhas”, como ele próprio afirmou. Por isso, os corvos da falácia rondam, rancorosos, à sua volta.
Se a Verdade liberta, também a Verdade mata. Porque os seus opositores matam quem a defende. Por isso, enquanto o monarca absoluto do figurino papal e seus sequazes sentam-se em tronos dourados, almofadados, o nosso Rei-Jesus tem por trono o cadafalso da cruz onde foi assassinado. Razão tinha Milenati  quando escreveu aquele precioso livro “O Vaticano contra Cristo”.
No Domingo de Cristo-Rei, que fecha o calendário religioso de 2017/2018, deixei aqui esta reflexão, como quem tem sede da água pura da Verdade, ainda que tenha de correr riscos emergentes nesse caminho pedregoso. Todos os dias peço licença para alistar-me como soldado militante do seu verdadeiro Reino!

25.Nov.18
Martins Júnior

sexta-feira, 23 de novembro de 2018

ONDE NÃO ESTÁ EÇA NO PORTUGAL DE HOJE E NA MADEIRA DE AGORA?


                                                                      

         Baptizei hoje a minha mensagem com a charada, em título de capa, de uma conhecida revista portuguesa que há uns meses teve a ousadia de atirá-la  para o inquilino dos jardins de Belém. Assim pergunto eu: Onde não está Eça de Queirós? Razão directa: os últimos dias de Novembro estão cheios do autor d’Os Maias: em 25 (1845) é o seu nascimento e em 30 ( 1888) passam 130 anos sobre a publicação do seu melhor romance.
         O que trago para estes dias poderosamente “ímpares” não é o elogio do prodigioso polígrafo – com apenas 55 anos de idade, deixou-nos uma incomensurável produção literária – mas o sortilégio da sua presença viva no mundo actual, mais concretamente em Portugal e na Madeira. E o que mais impressiona nesta ‘descoberta´ é, de um lado, a versatilidade das diversas fases da história e, dentro dela, a imutabilidade dos comportamentos humanos. Se em Gil Vicente deparamo-nos com a galeria das várias tipologias comportamentais na viragem de século (XV-XVI), outrossim verificamos em Eça na transição do século XIX para o século XX.
         Tudo quanto relatam os historiadores dessa época nós o encontramos nas imorredouras páginas d’Os Maias. Lembro-me aqui de Almeida Garrett e do velho aio Telmo Pais, do Frei Luis de Sousa, quando confirmavam  que Camões, com um só olho, via mais que os restantes mortais. Pois, podemos também afirmar que o monóculo de Eça, muito mais que potentes telescópios, abarcava o passado, o presente e o futuro da condição humana, a sua psicologia, as reacções sociológicas e o ridículo das suas atitudes. Ontem como hoje e hoje como ontem.
         Não acham por aí o negreiro Monforte, explorador sereno e frio do comércio de escravos?... Basta percorrer os banqueiros (negreiros hodiernos) resguardados numa sombria clandestinidade! E o Palma Cavalão, de pena fácil, não os vemos em redacções de certos jornais, virados, despudoradamente subservientes ao poder e ao capital organizado? E o tal Dâmaso Salcede, sósia do anterior, preguiçoso, calculista, camaleão invertebrado que babuja e rebola conforme a onda do poder?!...Então ainda ninguém se cruzou com o intelectual João da Ega, o diletante escritor das sempre prometidas e nunca iniciadas Memórias de um Átomo. Eles aí andam e pavoneiam-se, impantes, enfatuados, com canudos sem curso, como doutores ministros sem pasta?!...
Não obstante a ocasional vigilância do escrutínio popular sobre as bancadas parlamentares e a subsequente acção governativa, ainda hoje persistem focos de insalubridade político-social, magistralmente  descritos no hipódromo, do capítulo X, onde  o verniz e a hipocrisia não conseguem tapar a corrupção e a vilania das sofisticadas classes burguesas. E quanto à doentia religiosidade da mulher de Afonso da Maia, em que é que ela difere das intermináveis procissões, novenas e incensos da maior parte dos nossos templos?!...
Quanto a Carlos da Maia e à  relação incestuosa com Maria Eduarda, escandalosamente reiterada, apesar do conhecimento dos factos, aí já se revela a aceitação do absurdo, a impotência de agir, o  laissez faire, laisser passer, na administração pública, nos tribunais, nos negócios, nos desportos e até na religião. Felizmente, observa-se com simpatia a presença de uma Oposição  que deve permanecer sempre vigilante e lúcida para não permitir os mesmos abusos, os mesmos incestos e compadrios de outros tempos.
Serve o presente texto de sugestão para quem sentir o bom senso e o bom gosto de ver desfilar a polícroma galeria humana que nos doou Eça de Queirós. Porque ler Os Maias, 130 anos depois, é ver o filme, a novela e, nalguns casos, a choldra da hora que nos coube viver, seja a nível internacional, nacional ou regional. Vale a pena refazer a trama e reescrever com figuras e factos de hoje a saga real em que somos actores e espectadores, sem talvez darmos por isso. Como bem observou José Rentes de Carvalho, “Eça põe-nos em frente de um espelho desagradavelmente fiel”. Mas – acrescento eu – com outro dinamismo e outra combatividade que não tiveram João da Ega  e Carlos da Maia, os românticos vencidos da vida.

 23.Nov.18
Martins Júnior                                                                                                                                                                                                                                                s                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                        

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O DUELO DAS IMAGENS NO DIA DA TV


                                                             

            Como são-no todos os dias de festa, este é também dia de exame.
         Por ser festa, eu te saúdo, TV-Caixa, que tanto tens de mágico e  malabarista-ilusionista de feira! Reconheço-te o supremo poder de erguer e derrubar presidentes, ditadores, vilões e heróis. Temo, mas não te invejo, a tirania de entronizar no altar da praça o mais vil dos carrascos e de queimar inocentes na fogueira dos templos.
         Foi esse o teu império, onde levantastes a torre de menagem – inexpugnável, imbatível – até ao dia em que o clic de um dedo infantil te derrubou do trono. Hoje, em cada vão de escada ou em cada mão vadia reina um outro império imagético que faz implodir, num sopro, todo o teu poder de outrora. E se quando nasceste soaram as campainhas das boas novas, preto-e-branco ou coloridas, hoje ressoam os carrilhões do mundo inteiro face ao nascimento das novas tecnologias – net, twitter, instagram e afins – que te ombreiam e ultrapassam. Para bem?... Para mal?... Entre as duas barricadas, venha o demo e escolha. Os Trump’s e os Bolsonaro´s arrumaram-te as botas. Oxalá o sabor amargo da derrota das “caixas mágicas” te ensine a mudar de caminho.
         Bem sei que não é tua a culpa, TV-Caixa! São as mãos que te pegam e te despem, são os míseros serventuários do poder político-financeiro que te tornam mestra ou prostituta, são os famélicos refugiados da fome ou das imerecidas benesses os que te fazem bela ou nauseabunda. Também és o joguete de interesses que não são (ou não deveriam ser) os dos teus consumidores.
         Para reconquistar o paraíso perdido das tuas audiências, terás de mudar de caminho – o de ser mais inteligente, arguta e sábia que as tuas concorrentes. Mas, para desdita nossa, parece que são elas a ler-te a cartilha: queres competir com os monótonos esgares de futebol logo na abertura da emissão, perdes tempo e dinheiro (que é de todos) com  passeatas nocturnas por bares e etilizáteis acordes  de publicidade gratuita e, ainda por cima, pregas-nos com entrevistadores “pau-de-toda-a-obra”, tão enfadonhos como as perguntas que dirigem aos convidados da “região demarcada”. E, se não achares abusivo da minha parte, deliciosa caixa-amiga, ordena que os teus serventes saiam da alcova onde moras e façam-se à estrada em busca dos informes fidedignos de que a população carece e deseja.
         Em dia de festa, um Voto: que voltes a ser mensageira e mestra do Povo que é teu credor e legal destinatário!

         21.Nov.18
         Martins Júnior         

segunda-feira, 19 de novembro de 2018

ROMAGEM DA GRATIDÃO


                                                             

Nas “oitavas” dos oitenta, sou eu que hoje bato à porta de todos quantos cercaram o  denominado “chão sagrado” do adro da Ribeira Seca e aí desenharam um coração de luz e som que se alargou por todo o extenso vale da freguesia.
Bato à  porta para lhes dizer que a festa foi sua, cabendo-me apenas o ensejo e o pretexto da sua realização. E nisto vai a minha enorme gratidão.
Bato à porta do Grupos Folclóricos do Caniçal, com a pujança e o brilho da terra onde o sol nasce primeiro. Do Grupo Folclórico de Machico, portador da genuína tradição da primeira capitania da Madeira. Do Grupo Folclórico de Água de Pena, com o viço e a frescura de uma Fénix renascida. E do Grupo Folclórico do Porto da Cruz, com sabor telúrico à ecologia e ao vinho novo da festa do povo. A sua participação, a título gracioso, jamais será esquecida.
Bato à porta dos deputados presentes, sem distinção de partidos. Dos representantes autárquicos, Assembleia Municipal, Câmara Municipal, Juntas de Freguesia de Machico, Caniçal e Água de Pena. A sua presença, para além da protocolar oficialidade, brilhou acima de tudo pela mensagem de fraternidade sem fronteiras.
Bato à porta do amigo de gema, Padre José Luís Rodrigues, hasteio firme da luta solidária, agradecendo-lhe o poema que teve a gentileza de  dedicar-me  e que foi declamado durante a liturgia de Acção de Graças. Incluo neste abraço o Padre Agostinho César Jardim Moreira, do Porto; do Padre Manuel Armando Marques, de Aveiro; do inquebrável Padre Tavares Figueira e de outros tantos amigos que não cabem neste exíguo espaço.
Bato à porta dos artistas presentes na festa que mantiveram e enriqueceram a alegria do povo: os convidados do programa “Musicas do Arco da Velha” e seu  apresentador Rogério Capelo ; dos cordofones "Braguinhas da Ribeira Seca" , na pessoa do prof. Nuno Mendonça; do grupo de jovens locais e a surpresa final do já familiar Ruben Aguiar. Junto, ainda, a partilha logística dos “Amigos da Música” e da firma “Soledes”. Nesta “tribuna” de preciosa colaboração pragmática, ficam gravados os nomes dos paroquianos que decoraram todo o recinto das festas e a dinâmica feminina encarregada de prover à preparação e ao serviço das mesas.
Bato, comovido, à porta e ao coração de duas mulheres, .Paula Franco e Irene Catanho, pela surpreendente imaginação criativa que revelaram na concepção e realização da colectânea de pensamentos dispersos no meu ‘blog’ e a que deram o sugestivo título “LEGADO”. Trabalho aturado e minucioso, esse de pesquisa e selecção, que muito aprecio e mais agradeço, bem como o prefácio do conterrâneo e amigo Prof. José Eduardo Franco e o posfácio do Prof. Nélio Martins. Dentro do mesmo corpo e do mesmo espírito do “LEGADO”, guardo, como num relicário guarda-jóias, os testemunhos do Prof. Pe. Anselmo Borges, Frei Bento Domingues, Prof’s Teresa Nascimento, Raquel Varela, Bernardo Martins.
Finalmente, bato à porta do Grupo Coral, na pessoa do seu distinto Maestro e compositor  Nélio Martins, primeiro pela criação e harmonização da canção original que me dedicou e, no mesmo plano, pela cativante interpretação que lhe foi dada pelo Coral de Machico.
   A quantas mais portas terei de bater, nestas “oitavas” dos oitenta? A tantas e a todas as que, de longe e de perto, estiveram dentro do coração desenhado, a luz e som, no adro da Ribeira Seca. Todas as horas do dia e todos os dias da semana não chegarão para esta minha romagem de gratidão, sobretudo para dizer que o lucro maior de uma homenagem consiste na certeza de que a sua mensagem chegue a todos e em todos permaneça: a força da Vida no círculo do Amor!

19.Nov.18
Martins Júnior
     

sábado, 17 de novembro de 2018

NEM OITO NEM OITENTA – O Melhor da Festa!


     Homenagens há muitas, como os chapéus e as ilusões. Mas uma só é verdadeira e é aquela que começa e acaba no coração da colectividade. As homenagens de teor individual, estáticas e narcisistas, têm um único destino: tão depressa se levantam, quão depressa abortam e morrem. Porque ficam amarradas a um poste – seja ele de ouro ou de prata, seja lago azul ou envernizado charco -  e dali não saem..
        Homenagens vivas, verdadeiras são as que nascem no grande mar vermelho do coração do povo e para lá voltam, depois de contornar a ilha, o vale, a casa humilde que lhes deu o mote. A homenagem individual é fechada e estéril, a homenagem colectiva é aberta, franca, expansiva e reprodutiva. Porque regressa, aumentada e multiplicada, à sua nascente original.
        Assim vi o mar de gente, de tantos e tão diversos lugares, entrar no portal sereno da Ribeira Seca e ali fecundar de sonho e primavera os oitenta novembros, irmãos gémeos de todos quantos ali se abraçaram em meu redor. Ali sentiu-se o palpitar de todas as vidas e o seu ritmo – sempre longo e sempre breve – até soarem as badaladas finais que unem o berço à sepultura. Pelo meio está o recheio: a força, o optimismo, os prantos e sorrisos, as pétalas que sobrepujam os espinhos. E todos ficámos mais jovens e dinâmicos, galvanizados daquela nobre ambição de expandir mais vida nos lugares de onde viemos.
        Agradecimentos mil, redobrados pelas presenças amigas. Mas o melhor da festa foi aquela menina que ostentava nas mãos uma espécie de brinquedo em forma do cardinal “oito” revestido de um amarelo dourado. “Porquê esse brinquedo ?”, perguntei. Junto aos pais, ela prontamente respondeu; “É que eu faço hoje oito anos, é a minha prenda”. Que beleza! Ali riscou-se o velho aforismo “nem oito nem oitenta”. Pois ali foi mesmo “oito e oitenta” ao vivo, seguido de um diálogo emotivo e animador. Caminhos que se cruzam – uns que começam e outros que se cumprem, há oito longas décadas!
Aos de perto e aos de longe, unidos no chão sagrado da Ribeira Seca ou pelas redes sociais, o meu afecto e a minha gratidão num caloroso “Bem Hajam”.  E vivam, vivam!!!     
        16.Nov.18
        Martins Júnior

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

VERTIGENS QUE COMANDAM A VIDA – “Abyssus abyssum invocat” (Sl.42,7)


                                                                 

             É da terra-prosa que hoje me apetece discorrer e em cima dela correr e correr de olhos vendados como quem já lhe conhece  de cor as passadas, Porque, mesmo sem nos darmos de conta, até as equações  aparentemente mais enigmáticas reduzem-se, afinal, a meras evidências do quotidiano, É o que vem descrito no título deste Senso&Consenso.
         Comecemos por aí: um abismo chama por outro abismo, um desejo breve  cria um desejo maior e a sede de um cigarro atrai o ‘fulgor’ de um haxixe, Não vale a pena ‘dourar a pílula’, porque a prosa da terra assim decreta. O “vulgar de Lineu” espanta-se, afunda-se ou enfurece-se perante certos escândalos criminais, quando, feita uma análise sem preconceitos, chega-se à conclusão mais evidente: por aquele caminho já se esperava.
         Casos abundam e o mais difícil é ver-se uma excepção. Quem diria que de um episódio festivo que é o desporto havia de sair um aborto de reacções, contradições, agressões, prisões, cauções e toda a série de traições que acabam em veementes confrontos judiciais?... E o alarde compulsivo da comunicação social, quem chegou mais cedo, quem perguntou primeiro, quantos quilómetros de fita, quanta gente destacada, a qualquer hora do dia ou da noite, quanto dinheiro em horas-extra, enfim, batedores de estrada, mendigos de mão estendido para apanhar em salvas de prata um bocejo disforme ou um traquejo ordinário de suas majestades trapaceiras! E fica meio-mundo pasmado de baba diante de tantas enormidades,
         Como foi possível chegar a tão degradante desconserto, tanto da parte dos figurantes como dos espectadores?
         Muito simples: o menino, antes de nascer, já era sócio, o papá começou a levá-lo às arenas de cifrões e palavrões contra o árbitro; o menino e a menina prestam-se à ridícula promoção de entrar em campo pela mão de um ‘batidão da bola’;  mais tarde, um amigo calha apertar-lhe os dedos com um charro inofensivo, passa à coca e, vai daí, toca a rebate, vamos em cima deles,  “vamos dar cabo deles”. Outra vez, tribunais, detenções, condenações.
E tudo começou sem dar por isso. Em tudo na vida. Os grandes criminosos por bagatelas ocasionais. Os gatunos por umas moedinhas deixadas em cima da mesa de casa. Os assassinos por divertidas cenas de bullying sem nexo. Sempre um abismo a chamar por outro abismo!
Daí que a grande pedagogia da humanidade, graúdos e miúdos, deveria consistir num crescimento sincrónico, vigilante e actuante, num sentido ascendente e continuado. Porque assim como o abismo puxa abismo, também a colina chama pela montanha mais alta, rumo ao cimo da perfeição, sempre inatingível, mas sempre desejada!
O jovem marinheiro iniciou a subida à gávea do navio e aos poucos  foi galgando até ao instante em que olhou para baixo e a vertigem quase fê-lo desistir. Mas o comandante, atento e vigilante, bradou-lhe: “Olha para a gávea do mastro, olha sempre para cima”. E alcançou o sonho!
Para vencer a vertigem dos abismos, nada mais belo e eficaz que a filia das alturas!
15.Nov.18
Martins Júnior

terça-feira, 13 de novembro de 2018

PLENÁRIO NACIONAL DO SOFRIMENTO E DA RESISTÊNCIA


                                                            

Está na ordem do dia o grande dilema com que se debate a ciência da comunicação. De um lado, a imprensa e o audiovisual estandardizados, com os seus códigos, a sua formatação e conteúdos arvorados em dogmas a que todos devemos tributo. Do outro lado, a invasão das redes sociais, as quais se atiram como abutres devoradores dos cérebros, das emoções e das sociedades.
Neste combate desigual há vencedores e vencidos. Entre os vencidos jazem caídos na choça, ou quase nela, os meios tradicionais de comunicação, os quais vêem tremer os alicerces da sua hegemonia  gratuitamente herdada desde tempos imemoriais, enquanto do outro lado da barricada campeiam e pavoneiam-se os twitter´s, os instragam´s e afins, cujo potencial bélico arrasa tudo à sua passagem. Veja-se a vitória do ditador Bolsonaro e do “vilão” Trump. Lamentavelmente a imprensa e o audiovisual, numa tentativa ilusória de sobrevivência, deixam-se resvalar na promíscua miragem .dos seus rivais, servindo ao público o mesmo produto inquinado, o sensacionalismo soez, os escândalos sociais, sexuais e vicinais, as intermináveis mesas desportivas, tão redondas e ocas como a bola que discutem. Chega a ser deplorável, nauseabundo o antro em que vegetam certos conteúdos e certos centros emissores,
Entretanto, no meio pantanoso em que se afundam os habituais programas, fomos ontem surpreendidos por um lampejo de coerência e lucidez no visionamento de “PRÓS&CONTRAS”, onde  Fátima  Campos Ferreira teve a coragem de  trazer para a ribalta da nação o mundo tormentoso que percorre os subterrâneos da sociedade e que nós, intencionalmente ou não, tratamos de esconder como um tabu.
Expôs-se ali em palco e ‘ao vivo´ o drama dos CUIDADORES INFORMAIS. Pais que cuidam de um, dois e três filhos vítimas de paralisia infantil. Filhos que desistem do seu futuro profissional para tratar de um pai ou de uma mãe atacados de esquizofrenia. Uma esposa que tudo deixou para assistir, vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas, ao marido idoso, vítima de esclerose múltipla. Ninguém que visse o programa terá ficado de coração enxuto, ao percorrer esse cortejo pré-fúnebre que diante dos nossos olhos se foi desenrolando.
Só me ocorria ao subconsciente o sentido poema de Gomes Leal  - a “Senhora Duquesa de Brabante” diante do filho “raquítico, enfezado, excepcional, todo disforme, malquisto”.  Quando o “monstro” morreu houve festa no palácio, arraiais na ruas, o próprio pai ria às gargalhadas. Mas…
Só, sobre o esquife do disforme morto,
Chora, sem trégua, a mísera mulher
Chama os nomes mais ternos ao aborto
Mesmo assim feio, a triste mãe o quer
Mas naquele plenário familiar (todos, desde o ecrã até ao nosso divã, todos nos sentíamos irmãos da mesma família) o que mais me sobressaltou não foi  pranto nem desespero, mas a capacidade de resistência, “mais do que prometia a força humana”,  daqueles cuidadores, quase todas mulheres, de fronte erguida, sofrido sorriso no olhar, frescura estóica no rosto, expondo sem complexos os seus dramas e exigindo acompanhamento e apoios adequados por parte de quem governa .
E foi precisamente este valor mais alto – o da consistência psíquica de amar e resistir que  motivou hoje  o nosso “Senso&Consenso. Não. por masoquismo ou comiseração. Ver para crer. E querer. E agir. Poucas vezes se viu na TV um testemunho tão eloquente e mobilizador.
Por este Parlamento Maior do sofrimento humano, ou, como diz o Papa Francisco, por este superior “Hospital de Campanha”, na televisão pública, as minhas saudações!
13.Nov.18
Martins Júnior
          

domingo, 11 de novembro de 2018

SÃO MARTINHO, O MAIOR NO SÉCULO IV - “SÃO” MARTINHO, O MAIOR NO SÉCULO XX !!!


                                                      

          Desde há 1700 anos, anda ele de terra em terra e de boca em boca, montado não na sela do cavalo imaginário mas no mito e, muito mais, na superstição saloia entre lagares e pipas que levianamente atravessam fronteiras e gerações. Ele é o cidadão de nobre linhagem que depois se fez voluntário servo e monge  e, mais tarde, chamado à mitra da catedral de Tours. Expurgado o seu culto dessas abusivas colagens (como se do Baco pagão se tratasse) Martinho, o santo aberto e generoso para com os marginalizados da cidade, bem merece condigna e secular homenagem.
         Mas outros Martinhos houve, E a história registou. Um deles, herói e irmão do massacrado povo de Timor, esteve connosco. Aqui, na Madeira, Funchal. Aqui, em Machico, Ribeira Seca. De nome inteiro, Martinho da Costa Lopes, a sua história e o seu drama consubstanciam-se  no drama e na glória de Timor Lorosae. Era o tempo da anexação dessa ilha pelo governo da ditadura de Jacarta, Face às ameaças e investidas do ditador Shuarto, impôs-se sempre o administrador apostólico de Dili (bispo Martinho da Costa Lopes) defendendo e incentivando os seus conterrâneos na luta pela sua identidade patriótica, recusando-se mesmo a obedecer às directivas do episcopado indonésio, despudoradamente aliado do usurpador ditador do regime.
         Sofreu os ataques ao seu bom nome e à própria integridade física, foi preso, sempres ostracizado e considerado “persona non grata” pelo poder político anexante, cujo afã maquiavelicamente premeditado visava expulsá-lo da Sé e do território de Timor. Mas o valoroso prelado nunca se vergou nem se deixou seduzir pelas promissoras benesses dos invasores. O mais degradante e repugnante, a todos os níveis, foi o Vaticano. Em vez de tomar a defesa intransigente do seu “filho qualificado”, porque nomeado por Roma, a Igreja dirigida pelo Papa João Paulo II aliou-se ao poder político de Jacarta e tudo fez para expulsar o pastor da Igreja Timorense, recambiando-o para Lisboa, terra de exílio do velho e patriótico lutador do povo. Ali viveu, numa pobre casa, privado da família e de conforto mínimo, desprezado pelo Patriarcado.
         Foi nessa altura que a Junta de Freguesia de Machico, então presidida pelo Dr. Bernardo Martins, convidou-o a visitar a Madeira, onde foi friamente recebido pelas autoridades regionais, tanto civis como religiosas. O escândalo maior veio da Igreja Diocesana, porque mandou publicar no seu órgão oficial, o Jornal da Madeira, e em grandes parangonas esta vergonhosa  Nota Episcopal”: O BISPO DE TIMOR NÃO É BISPO”. Indigno, blasfemo!
Como a gravura em epígrafe documenta, o modesto mas heróico pastor timorense, acompanhado pelo Padre Tavares Figueira e por mim,  falou à multidão apinhada junto ao palco aberto da Ribeira Seca, deixando no coração de todos os presentes  a mais emotiva e comovente impressão, pois disse-o com a autoridade de quem viveu e sofreu a dura repressão da ditadura indonésia. Mais tarde, ouvimos dizer que o intrépido (para mim, o Santo e Mártir) bispo de Timor falecera em Lisboa, exilado e só, sem que, ao menos,  a Igreja lhe dedicasse a homenagem que merecia. Veio-me então à memória o poema de Reinaldo Ferreira; “O Herói serve-se morto”!
Machico não o esqueceu, Aquando da minha gestão à frente do município, a Assembleia Municipal, por proposta do executivo camarário, aprovou à então recém-construida estrada que liga a Ribeira Seca ao Moinho da Serra, a designação  toponímica de “RUA DOM MARTINHO DA COSTA LOPES, BISPO DE TIMOR”.  Quem o conheceu e escutou ‘ao vivo’ a sua mensagem, o palpitar do coração do povo  timorense e, com ele, dos  oprimidos  do mundo inteiro, não pode atravessar aquela rua, sem primeiro perfilar-se em sentido, e saudar aquele Martinho Maior – São Martinho do Século XX -  e dizer-lhe que ele está dentro de nós, na nossa ideia e na nossa acção.
Faz hoje precisamente 100 anos o dia do seu nascimento: 11 de Novembro de 1918. No dia do Armistício em que acaba a I Grande Guerra, aí outra guerra começava. E outro herói, pacífico guerreiro, entrava em campo para libertar o seu povo, o de Timor e o de todo o Mundo!
Salvè, São Martinho do Século XX !!!

11.Nov.18
Martins Júnior   
    


sexta-feira, 9 de novembro de 2018

MACHICO – CAPITAL DO MAIS ANTIGO E GENUINO PATRIMÓNIO IMATERIAL DA MADEIRA


                                                               
                 Que fora a primeira estância da ilha onde puseram pé Tristão Vaz e Gonçalves Zargo – todos sabíamos. Primeira capitania da Ilha, também. O que, porém, ainda não tinha sido dito em grande angular, como merecia, foi o investigador da tradição oral cantada que veio trazê-lo hoje a Machico. E é a grande nova deste 9 de Novembro. Rui Camacho, fundador e proto-animador da Associação Xarabanda, revelou-nos em primeira mão que foi em neste concelho que os etnógrafos  estudiosos do folclore madeirense encontraram as raízes mais genuínas dos cantares ilhéus.
E provou-o através da produção discográfica, gravada “in loco”, pelos exímios e exigentes cultores da arte, António Aragão e Artur Andrade, na década de 70 do século passado. Provou-o, ainda, pelas pesquisas e documentação do grande folclorista M. Giacometi. Descobrimos hoje, pela investigação de Rui Camacho, que grande parte das trovas disseminadas por toda a ilha, entre as quais a emocionante “Canção de Embalar”, são oriundas do torrão primeira da ilha, Machico e suas freguesias, com predominância para Porto da Cruz e Caniçal.
Mais emocionado fiquei por ver-me imprevistamente  retornado a um passado longínquo, quando Aragão e Artur me apareceram na Ribeira Seca, ‘armados’ das velhas máquinas de gravação e me pediram para indicar quem soubesse de rimances, xácaras e novelas medievais. Mandei-os pelas encostas daquele  vale profundo e, qual a surpresa maior, quando vejo na capa da edição discográfica aqueles meus amigos e amigos, gente “rude mas verdadeira” do sítio da Ribeira Seca, tocadores e cantadeiras, ‘charambistas de peso’. Já todos se finaram, mas felizmente não levaram para a tumba fria as canções e as vozes quentes que, em 1982,  a Associação Xarabanda teve o talentoso rasgo  de reeditar.  
Para além das competentes prestações dos historiadores intervenientes na iniciativa, ora em curso, da Câmara Municipal de Machico – “EDUCAÇÃO E PATRIMÓNIO” -  esta foi a nota mais original e marcante, porque fez-se justiça, enfim, a uma cultura autóctone e a um povo que durante 40 anos (também não esqueço!) foi carimbado pela ignara e tacanha intelligenza governativa da Região como “terra do terceiro mundo”. Afinal – e hoje ficou magistralmente demonstrado -  Machico afirma-se como o repositório fidedigno de uma história de 600 anos! Não admira, pois, que aqui tenha sido o meio eco-histórico adequado para que nascesse e se consolidasse o mais eloquente testemunho cénico do Achamento da Ilha, justamente cognominado de “Mercado Quinhentista”, o qual mereceu, finalmente, o reconhecimento oficial e o apoio da governação regional.
No mesmo fôlego de são patriotismo local, como cantava o nosso Maior “Camões Pequeno” (passe a hiperbólica antítese), torna-se pertinente propor a quem de direito que as “Comemorações dos 600 Anos da Descoberta” tenham em Machico o seu mais condigno e genuíno epicentro.
Porque daqui nasceu a Madeira!

09.Nov.18
Martins Júnior