É
uma luva na mão dos dias aquilo que hoje me trouxe ao teclado ‘bloger’. Pelas
razões que abaixo direi.
O
Sínodo, ora em curso no Vaticano até 27 de Outubro, tem preenchido páginas, ‘écrans’,
redes e capilares sem conta da informação global. E bem as merece o epicentro
do magno acontecimento. Desde os bastidores até à ribalta do palco, é tudo um
deslumbramento feérico, quase esotérico, extraterrestre, celestial: as vestes
brilhantes, de um verde moço matinal nos ombros de septua-octogenários, as
delicadas rendas agarradas ao escarlate das mangas, as mitras flamejantes, a
plenitude salomónica dos coros que se misturam à mística do incenso oriental…
Assim se abre e assim se há-de fechar um debate que, entre outros temas, tem a
ver com as alterações climatéricas, o aquecimento global e os atentados
ambientais, mais intensamente, os crimes do governo Bolsonaro na grande
Amazónia.
Grandioso,
belíssimo, laudabilíssimo o projecto pontifício que reúne a fina flor dos
príncipes da Igreja, com destaque ascensional para bispos, arcebispos e
cardeais. Da parte de Francisco Papa não duvido do seu empenho – repetidamente
investido em incontáveis lições públicas -
sempre solícito em levar ao mundo a urgência inadiável do seu brado
apocalíptico, consignado na encíclica Laudato
Si: o respeito pela nossa “Casa Comum”, o Planeta.
No
entanto, ouso colar-me à dúvida - se das centenas de antístites e purpurados ali
reunidos em assembleia poderá surgir a nova seiva que irrigará e purificará a
terra e o ambiente que habitamos. Para amar a Terra – “ Irmãos, Amai a Terra”. já
proclamava Nietzsche – é preciso
mergulhar dentro dela, “trazer o cheiro das ovelhas”, como disse Francisco,
lutar frontalmente, ao lado daqueles que as defendem dos lobos devoradores. Não
me parece que o cheiro das ovelhas e a transpiração do húmus criador se acomodem à sumptuosidade das faustosas
basílicas. Do mesmo modo, as reformas emanadas dos vértices altaneiros levam décadas
e séculos a descer até ao chão onde assentam as bases das pirâmides. Outras
vezes, nunca chegam. Não me sai da retina aquela cena (sempre religiosamente
aceite) de ver uma grada e bem identificada sotaina vermelha na tomada de posse
de Bolsonaro. A diplomacia palaciana não se dá bem ( e nunca deveria dar-se) com
a verticalidade pura da Verdade!
Onde
quero chegar com esta minha reflexão?
Por
mais sublimes e proclamatórias que sejam as grandes assembleias, os sínodos e
as encendradas conclusões aí redigidas, tudo corre o risco de esfumar-se como
incenso fútil se não for o povo, os cristãos de base, os pastores nas aldeias,
os habitantes da terra a tomarem nas suas próprias mãos a vanguarda das
operações. É nas raízes da árvore que reside a garantia de uma boa produção.
Não é na ponta dos galhos ou na fronde da ramagem. Tenho para mim que o grande
contributo, o maior, que a Igreja poderá dar à civilização é respeitar a
identidade dos povos, a sua idiossincrasia, educando-os para assumir eles
próprios o amor às causas justas e deixando-os, ampliando se for preciso,
conduzir com dignidade e consistência o rumo dos acontecimentos. De pouco ou
nada serve sobredourar excelentes citações bíblicas. Não esqueçamos que no
Brasil foram, incrivelmente, os “Evangélicos” que deram o poder ao ditador
destruidor do pulmão do mundo, a Amazónia.
É
preciso que, neste e noutros segmentos da vida em sociedade, as hierarquias não
matem a iniciativa dos cristãos de base. Antes pelo contrário, deverão dar
livre curso às suas justas reivindicações e estratégias de acção. Foi neste
registo positivo que católicos brasileiros, reunidos em Belém do Pará,
prepararam o documento reivindicativo que os seus bispos levaram ao Sínodo
vaticano. Por isso, no penúltimo ‘blog’ referi-me a uma “Igreja incendiária,
anti-bolsonária, revolucionária”! E interrogava-me: Que termos – sinónimos ou
antónimos – usaremos para a Igreja europeia, romana, portuguesa, madeirense?
Termino,
retomando a ‘luva’ dos dias, com que comecei. É que hoje, precisamente hoje, comemora-se o dia do Papa João XXIII. Foi ele
o Grande Promotor do Concílio Vaticano II. Constituiu o maior acontecimento da
Igreja do século XX, a que deram inestimáveis contributos os grandes pensadores
e reformadores, de dentro e fora da hierarquia romana. A todos João XXIII
recebeu-os e transpôs muitas das suas sábias conclusões para os textos oficiais
do Concílio. Na altura, falou-se numa verdadeira revolução de uma Igreja
caduca, desencarnada do mundo e da vida. Disse-se mais: Que estávamos perante
um Novo Pentecostes.
Era-o,
de verdade. Mas, que é que fizeram dele? Alguém o vê por aí?
Os
analistas, teólogos, liturgistas, filósofos são unânimes, pelo menos no tocante
a Portugal, em afirmar que o Concílio Vaticano II ainda não chegou à Igreja
Portuguesa. Ficou-se pelos titulares hierárquicos que o meteram nos arcanos das
sacristias. Dizem que só com este Papa Francisco começam a florir as raízes
conciliares. Passado mais de meio século!!!
O
Concílio Vaticano II iniciou-se em 1962
e encerrou-se em 1965.
Sem
bases, jamais haverá vértice. As bases
somos nós!
11.Out.19
Martins
Júnior
De aordo com o texto, permite-me fazer uma pequena correção técnica. As raizes, sem dúvida que são uma das partes mais importantes das árvores, mas ée nas folhagens, através da fotosintese que a seiva bruta se transforma em seiva elaborada, o pão das plantas, é através dessa grande função que as plantas nos ajudam, absorvendo o CO2 da atmosfera e libertando o oxigénio....A planta é um conjunto de raízes, caules, folhas, flores, frutos e uma grande rede vascular de por onde circula toda a seiva, nos dois sentidos. Sem folhas as plantas não viveriam...As plantas de folha caduca como o nome indica, ficam sem folhas durante alguns meses e passam por uma dormência em que não gastam o seu "stock" alimentar formado durante o período de actividade da planta e depois usam essas mesmas reservas para iniciar um novo ciclo....Um abraço
ResponderEliminar