Hoje,
a minha noite é toda uma vigília. Não de velório sobre a laje fria de quem se
finou, mas de sentinela atenta, vigilante de um castelo onde nascem e crescem exércitos
construtores de novos mundos e novas gerações.
É
porque – já passaram 246 anos – uma jovem mãe passava as dores do parto para ‘deitar
ao mundo’ uma das maiores almas nascidas em terro insular. Era Francisco Álvares
de Nóbrega, o infante ilhéu, que aguardava a luz da madrugada de 30 de Novembro
para assentar arraiais não só na
história das terras de Tristão Vaz
Teixeira mas nos anais de “todo o homem que vem a este mundo”.
É
facto repetido que todos os anos Machico ressuscita das cinzas o seu patrono
maior. Mas o que não é sobejo – nem nunca o será – é o nosso olhar desperto e o
nosso espírito vidente diante daquele que antecipou uma era nova para os
futuros inquilinos deste planeta que hoje é nosso.
Sei
que o povo de Machico, através da sua Junta, tornará viva a memória de
Francisco Álvares de Nóbrega em sessão comemorativa, na sua sede, pelas 19
horas. Mas, pela minha parte, volto o rosto para o sol nascente de amanhã e
deixo-me ficar absorto mas dinâmico na contemplação de alguém que percorreu
estes caminhos, sentiu as mesmas pulsões e atirou pata a chama do Futuro as
achas-ideias que ciclicamente renovam a humanidade. Vejo-o na galeria dos Libertadores,
lado a lado entre os heróis que deram tudo, a própria vida, para que os vindouros alcançassem os vastos horizontes a que têm
direito. Comparo-o, na mesma linha de rumo, ao altíssimo músico e co-autor do “Canto
Solidário”, José Mário Branco – ambos tocados pela mais arraigada e dolorosa “Inquietação”,
face a um mundo longe dos seus sonhos.
E
enquanto a noite desliza no vale, vou trauteando como uma prece e um anseio
longínquo excertos da canção que lhe compus em 2014:
“Irmão de Bocage e de Camões
Quebraste os grilhões
Onde outros algemam a Verdade
Longe da terra e dos teus que já não
tinhas
Deixaste sereno a vida ingrata
E sepultaste o monstro antigo
De vis garras mesquinhas
Hoje voltas de novo
Belo firme vertical
Alçando ao mar e à terra
Deste teu berço
Canto Imortal”
29.Nov.19
Martins Júnior
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