No pandemónio obsessivo em que se está tornando a epidemia, quase pandemia, do “corona-vírus”, o que mais impressiona é a psicose do medo – medo global, visceral, que infecta toda a gente e que nos faz duvidar de tudo e de todos: da própria família, dos amigos, dos locais de trabalho e até dos lugares e estilos de culto. O clima de desconfiança e de tensão social e ambiental que tomou conta dos portugueses, e não só, transportou-me para um outro tipo de virose, a virose política do terror, durante os 48 anos de ditadura, em que o “avejão” perseguidor com rosto de “Pide” causou traumas insuportáveis que terminaram nos “hospitais” das prisões nacionais. Tudo ficou extinto com o 25 de Abril de 1974.
Nunca o viu
alguém
Nem lhe
tocou o ombro
Por não
vê-lo nem tocá-lo
Cresceu-lhe
o unicónio do assombro
E por ser
informe ficou disforme
O avejão
lunar
Metade
monstro metade oculto avatar
Não tem
olhos nem boca
E as asas
dorsais
De breu
Sufocam sem
som quanto se move abaixo do céu
Ninguém o vê
Só tem
ouvidos não tem orelhas
Omnipresente
Ubíquo
ausente
Todos o
temem nos becos sem telhas
No vão das
escadas vigilantes
Foragidas
clandestinas
Como nas
cátedras gigantes
E nas magras
oficinas
Ninguém sabe
quem é quem
O filho não
conhece pai
A filha não
conhece mãe
Ninguém sabe
quem o trai
Porque o
avejão disforme
Nunca se
cansa nem dorme
E os ouvidos
sem orelhas
São
invisíveis centelhas
Nas
fogueiras da prisão
Coroado
O avejão
soturno sem lei
Tem o
mandato do rei
Entra no
templo
Veste mitra
e solidéu
Infecta
o confessionário
E do
inocente faz réu
Assim
Portugal
Epicentro
viral
Das negras
epidemias
Do medo -
mortalha nacional
Hospital?
Só o forte
de Caxias
E o sal do
Tarrafal
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Mas naquela
noite
O avejão do
terror
“Desde o
Minho até Timor”
Tombou
E o
vírus-coroado
Da mortalha
nacional
Foi Saúde e
Liberdade
Bandeira de
Portugal!
03.Mar.20
Martins Júnior
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