Foi
uma semana de seis dias para albergar uma caterva interminável de
milénios, os vencidos e os vincendos: do
passado, do presente e do futuro. Trazem na fronte esquálida e no traje
andrajoso a marca da sua indisfarçável
identidade: os pobres. Em cena mais restrita esteve a Rede Europeia
Anti-Pobreza, mas na rede vieram todos os guetos, cantos e recantos de todo o mundo,
com maior espanto os que vivem connosco, à nossa beira, dentro e fora de cada
um de nós.
Habituados e placidamente
ancorados ao cais da nossa comunicação social - dominada pela minoria governante
que se ufana de representar a absoluta maioria dos governados – ficamos em
sobressalto quando as estatísticas nos vêm informar (e sacudir!) que as Pérolas
Atlânticas, Açores e Madeira, vão nuas, despromovidas e, em vez dos
propagandeados anúncios de prostituta fina (como lhe chamou um
dia o seu autocognominado ‘dono’ quase vitalício) afinal andamos nós,
madeirenses, com 20.000 pobres às costas, todos os dias. E por ficarem nas
nossas costas nem damos por eles ou nem sentimos o peso que carregamos.
Da avalanche noticiosa quotidiana,
o som e o tom que nos chegam é o de que somos a nota máxima das Região Insulares
turísticas do mundo, a melhor rede
cibernética dos media, a maior cobertura eléctrica, a mais rica em termos aquíferos, o melhor clima, a mais
vasta Laurissilva, a mais avançada assistência médica, o maior porto de cruzeiros, o mais ‘genuíno’ carnaval carioca,
a mais excêntrica Festa da Flor e – cereja cruzada em cima do bolo laranja-azul
cerúleo – o melhor futebolista do planeta! Em tudo e arredores, somos os
maiores e os melhores. E, para acabar com qualquer ruído adverso, a banda arrasa-o,
‘com brio e independência’, rufando até à surdez: A Economia cresce!
É aqui que entra - e remexe
o lixo do palácio publicitário ilhéu – a denúncia feita em plena capital
madeirense pelo presidente nacional da Rede Europeia Anti-Pobreza, Monsenhor
Agostinho Cesário Jardim Moreira: “Apregoam que o crescimento económico está em
alta, mas esse crescimento não chega às pessoas”.
Conheço suficientemente a
personalidade e o pensamento de Jardim Moreira, a sua frontalidade positiva e
construtiva, desde o dia em que o vi discursar em dia emblemático, 10 de
Dezembro de 2010, aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, no salão nobre da Assembleia da República,
perante ministros e deputados, onde sinalizou em termos vigorosos a trajectória
e consequente estratégia para a erradicação da pobreza: “Sabendo-se que são
necessárias cinco gerações para que uma família estigmatizada pela poreza saia
dessa condição, não bastam políticas assistencialistas ou intervenções
cirúrgicas sazonais. O que se reclama é uma estratégia de futuro, assente no corpus
legislativo que sai desta Casa e rigorosamente aplicado pelo poder executivo”.
E aqui na Madeira, nesta
Semana Anti-Pobreza, ousou mapear o caminho para a luta dos Direitos Humanos,
nesta área social, impantando como indicador primeiro e último a seguinte predisposição: “É preciso muita humildade para
ver a Verdade e agir em conformidade”. Isto dito, no salão nobre da Assembleia
Legislativa Regional, face a face de Presidentes, Deputados. Secretários e as
chamadas forças vivas da governação.
“Não é vergonha ser pobre”,
cantou a nossa imortal Amália, E eu acresento: pobre, sem culpa. Mas vergonha
maior não há e mais desumana que normalizar assimetrias gritantes, estrangular
mil almas para fazer um rico, deixar passar a céu-aberto o fétido esgoto da
corrupção, abrir as comportas ao crime organizado nas off-shores em
território incógnito.
Pode o Papa enviar cartas a
Deus e à sua Justiça, mas os tribunais divinos não têm sucursais neste mundo. Podem
as instâncias caritativas matar a fome de um dia ou de uma geração, mas com
isso não tiram da pobreza uma única família. É preciso mais. É preciso que os
pobres atirem borda-fora as migalhas que caem da mesa dos ricos e, em vez
disso, lutar, votar contra os arvorados benfeitores de circunstância. É preciso ouvir e agir conforme o veredicto de
Vinicius de Morais, no Operário Em Construção.
É caso para lançar outro
pregão: Pobres de Todo o Mundo, UNI-VOS”.
Os
Impérios também caem. Como caíram o Império Romano, o Império Britânico, o
Império Português. E como esperamos ver frito e condenado a pagar aos vassalos
o ‘inabalável’ Império dos Salgados Santos Espíritos!
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