Não
se trata de novo cartaz de equipa ou um (permitam-me o abuso) new look da fábrica, muito menos de propaganda intensiva da marca. Foi o encontro
de ontem que, a convite do novo bispo, reuniu o clero madeirense. Trago-o, em
jeito de reportagem, à mesa deste fim-de-semana, sobretudo por afigurar-se-me,
menos nas linhas e mais nas entrelinhas, que um horizonte matinal, mais arejado
e claro, começa a desenhar-se na paisagem regional, no que toca à interpretação
do fenómeno religioso.
Sensibilizou-me,
em primeira mão, o local desta reunião magna: a nortenha freguesia do Porto da
Cruz, a mais distante da sede do concelho, acentuadamente marcada pela
ruralidade. No meu caso pessoal, revivi aquele cenário singular, talvez único
na história da Madeira, em que o bispo David Sousa, recém-nomeado para a ilha,
teve de desembarcar no Porto da Cruz, em Dezembro de 1957, após várias
tentativas frustradas na baía do Funchal, tal era a levadia intransponível que
durante dias assolou a capital madeirense. Indício ou não, foi este mesmo bispo
que me conferiu a ordenação em 1962, uma circunstância indelével na vida de um jovem. Aliada a esta
reminiscência, tocou-me também a coincidência de ter sido o Porto da Cruz uma
visita quási diária, inerente às minhas funções executivas, exercidas durante oito anos consecutivos, na
década de noventa do século passado.
Ultrapassados
estes considerandos episódicos, dois batentes - impossíveis de conter – soaram à
minha porta. Um deles, o mais insistente, foi a constatação de tantos “operários
da messe” ao serviço nesta porção de território insular. A foto demonstra-o à
evidência, mercê da capacidade mobilizadora do novo líder diocesano. Para mim,
que há quase 50 anos era afastado destes ajuntamentos, surpreendeu-me o número
e a qualificação etária dos presentes: quase todos jovens! E da surpresa passei
à interrogação: Qual será a crença da Madeira na mão destes jovens?... Que
farão eles para reconduzir a ilha à pureza inicial do povoamento e, mais do que
isso, às fontes evangélicas abertas no mundo pelo Mestre da Galileia?...
Persistirão na modorra de um dolce farniente devocionista e, por isso,
imobilista, serventuários dos poderes reinantes, à imagem e semelhança de “Eméritos”?... Ou farão da palavra, da acção e da sua juventude
uma alvorada nascente no coração de crentes e não crentes?!...
A
resposta foi surgindo, ténue e genérica inicialmente, depois mais consistente e
incisiva, no comentário que o novo bispo apôs ao texto litúrgico onde se falava
da “ovelha perdida que o pastor, deixando as noventa e nove no aprisco, foi buscar a essa,
a ovelha tresmalhada”, que todos consideravam como tal. Casual ou não, a
parábola evangélica motivou ponderosos motivos de introspecção pastoral –
individual e colectiva – ficando implícita uma interpelação, para não dizer, um
sério e saudável desassossego de consciência. Um texto a rever e guardar. Só
faltou apostrofar como o Mestre: “Quem tem orelhas de ouvir, que oiça”!
No
entanto, para que ninguém se arrogasse a tentação de juiz acusador e atirasse “a
primeira pedra”, lá veio a receita final de auto-análise e tolerância
pedagógica: “A ovelha perdida é cada um de nós”. E somo-lo, de facto, alguma
vez na vida. Excelente conclusão que dá passagem directa à lição deste domingo,
quando os Doze decidiram incendiar o povo samaritano - pela má recepção que lhes
deu - e receberam da boca do Mestre a
sábia sentença, da compreensão e da tolerância: “Não façam isso”!
Que
se dissipem trevas antigas e faça-se a Luz de um Novo Dia!
29.Jun.19
Martins Júnior
Só poderia ser esta a reflexão, douta e adequada. Comungo da alegria sonegada no coração de cada um. Cumprimento todos e, em especial, aquele com quem dividi experiência intensamente sentida por um povo
ResponderEliminarque agora respirou fundo.