Decididamente
o Papa é o elo mais fraco.
Quem
o faz assim, frágil, isolado, alvo fácil, bradando aos quatro ventos, qual náufrago
erguendo o poema heróico no meio das ondas revoltas? Não são os agnósticos, não
são os homens da ciência e da arte, nem mesmo os ateus. Quem o difama, então, quem o chama de herege, quem o ataca tão
ferozmente que nem a centenária guarda suíça do Vaticano consegue defendê-lo?...
São os seus próprios fâmulos, os da sua casa, sucedâneos dos intolerantes “Familiares
da Santa Inquisição”. Eles são cardeais e bispos, eles são “funcionários de
Deus”, amanuenses clericais e, na base e em força, os
fundamentalistas da fé, também chamados de “ultraconservadores católicos” .
”Vimos,
ouvimos e lemos, não podemos ignorar” – apetece cantar, gritar a plenos pulmões
a canção que fez renascer o autêntico animus
evangelicus, uma alma nova para a Igreja e para o mundo, aquando da
proclamação do Concílio Vaticano II, entre 1962-1965. Pois, hoje também vimos, ouvimos e lemos o que acaba de acontecer
em Roma: Católicos ultraconservadores roubaram de uma igreja e deitaram ao
rio Tibre cinco imagens oriundas da
Amazónia, as quais representavam a gestação e a exaltação da vida.
Porquê?
Porque
no Sínodo que ora decorre em Roma até 27
de Outubro, o Papa recebeu com honras
oficiais um grupo de representantes dos
povos indígenas da Amazónia… Porque aos que criticavam a sua indumentária nativa,
inclusive as vistosas penas ornamentais, o Papa fez saber que elas ali não eram menos dignas que os barretes
cardinalícios… Porque tomou a defesa da ecologia e do respeito pela floresta da
Amazónia, contra aqueles que queriam ver o Papa amarrado à sacristia e ao
palácio “apostólico”… Porque o Papa censurou e emendou a passividade dos que
tornam obrigatória a práxis dogmática do “Sempre foi assim e nada se pode mudar”…
Por tudo isto e pela abertura à verdade, à ciência, à natureza, à nossa “Casa
Comum”, levantam-se agora os ultraconservadores (nome demasiado pomposo para
designar os atrasados costumeiros, paralíticos do espírito) fariseus
autocráticos, ditadores intolerantes (como veremos no próximo domingo) que se
arrogam ter Deus preso no congelador dos seus crânios e a Religião embalsamada
na naftalina do velho baú dos defuntos ignorantes.
A
essa “estirpe” de brâmanes intocáveis, o Mestre da Galileia se hoje cá voltasse
repetiria com a mesma veemência: ”Raça de víboras, sepulcros caiados por fora e
podres por dentro. Vós não entrais no
reino e não deixais ninguém entrar”!
Por
isso, repito o que deixei incluso no texto de anteontem: o Papa é o elo mais
fraco. “Coitado do Papa Francisco – dizia-me um amigo teólogo - não o deixam fazer nada, logo lhe caem em cima
os corvos e os abutres do Vaticano”. Ao atirarem ao Tibre as cinco imagens que
ele acolheu com carinho, foi a ele próprio que os católicos “exemplares”, os
ultraconservadores deitaram ao rio! Temos
que resgatá-lo, dar-lhe força e apoio, não apenas recebendo com entusiasmo as
suas instruções, mas antecipando-nos na descoberta da verdade, mesmo que isso
cause fissuras no castelo de marfim, carunchoso e insalubre de velhos
preconceitos com que a ignorância e a deformação do tempo nos marcaram. Tal
como o servo ou o subalterno, em qualquer segmento produtivo, adivinha e
pressente a vontade última do seu senhor, assim seremos nós, vigilantes e
criativos na demanda da verdade, à luz da ciência, da história, do
esclarecimento global.
Até
em ambientes restritos da nossa quotidiana vivência colectiva, podemos abrir
clareiras na paisagem anímica dos nossos “Compagnons de route”. Lendo,
estudando, esclarecendo. Connosco, os ultraconservadores (que os há no meio da gente,
sobretudo ignorantes) nunca se atreverão a deitar ao mar o Papa Francisco!
23.Out.19
Martins Júnior
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