Não
retiro uma letra nem muito menos me arrependo de ter inscrito o “Covid” no receituário dos antídotos mais
eficazes contra a miopia global e, sobretudo,
contra a cegueira institucionalizada. ‘Sua Exª Covid’ apresenta-se com o rótulo de “O melhor
ventilador da sociedade”.
E
sai reforçada esta nomenclatura, particularmente na estação orçamental. É neste
cabo tormentoso que governos – do maior ao mais pequeno – se afadigam, mexem,
remexem, furam e perfuram, até queimar
os neurónios, para apresentar a prova de fogo do seu exercício: o Orçamento. Porque é nessa delicada passagem de nível que
se identifica a matriz de um regime. E não só: é aí que os seus titulares alcançam
o pódio ou, em alternativa, caem irremediavelmente ao rio.
O
Orçamento reflecte a desejável interacção entre governantes e governados. Assim
deveria sê-lo, no princípio, no meio e no fim da sua elaboração e da sua
concretização. A um povo pequeno, autómato seguidista, dá-se um orçamento magro
e desajeitado, como um fato à medida. A um Povo esclarecido e vigilante, os
lideres terão de esforçar os músculos, abrir os cordões e esticar os dedos para
entregar-lhe credenciais de um plano ajustado à sua dimensão. É aqui que toma
posse o velho aforismo: “Cada povo tem o governo que merece”. Assim fosse!
E
é também nesta conjuntura que se dividem as águas: investir nas pessoas ou
investir fora delas. Em ‘fora delas’ inclui-se aquele furor febril do betão
ciclópico, do alcatrão, do pavilhão, do turbo-poluição, da máquina e, por
todos, do robô. Poderá ser monumental, espectacular, estrondoso, ainda que desadequado
aos destinatários, descartável no terreno e obsoleto no tempo. O que importa é
que resulte em pândega fina e pandemónio arraialesco, sobretudo em vésperas de
novo parto eleitoral.
Do
outro lado, está o investimento nas pessoas. É esta a pedra de toque que define
outro povo inteligente e outra geração de governantes. Não terei necessidade de
abrir a quem me lê o extenso e rico álbum da família humana (à qual
pertencemos) para monitorizar os capítulos e as rubricas de um orçamento em cuja
centralidade impere a Pessoa: a cultura do pão e o pão da cultura, a saúde, o
ambiente, a sociabilidade e a vizinhança, o “outro” em vez do “eu”, a
liberdade, a fraternidade, a segurança. É muito mais alto o Ser que o mais
estratosférico mausoléu do Ter.
É
certo que tudo em convertível em moeda sonante. Certo que tudo é dinheiro e
pão. Mais dinheiro que pão: o betão dá pão, o alcatrão dá trigo, o fumo poluidor
dá massa, o mar também dá a carne e a terra dá o peixe. E até da cinza do
caixão sai a refeição, de mesa e toalha lavada. De tudo precisa o inquilino que
habita o planeta
Mas
a Pessoa é mais que o seu acidente, maior que o seu acessório. É conhecido o sábio axioma, formulado na
pergunta: “Quantos pobres são necessários para fazer um rico?”. E ouso eu
perguntar: “Quantas pessoas, quantas vidas são sacrificadas só para satisfazer
delírios megalómanos de governantes sem escrúpulo, obcecados por se perpetuarem
no poder e sustentarem catervas de apaniguados subservientes?”. Por desdita nossa, vivemos num laboratório de “velhas
glórias, cujo indomável verve político consistia em fazer do povo ilhéu uma
manada acéfala atrás de um monumental (?) betão inaugural.
E
se tudo quanto trago escrito traz a marca da universalidade e da
intemporalidade, aplicável a todos os regimes e a todos os lugares, ganha maior
actualidade nos tempos que correm. O ventilador “Covid” aí está para higienizar
as mentes e as altas instâncias, ‘convidando-as’ (direi, obrigando-as) a olhar
para as pessoas. Quem sabe se não estaremos hoje a pagar a factura de
Orçamentos virados para fora da Pessoa, para a super-industrialização, para o híper-consumo,
para a destruição das fontes da vida e da felicidade?!
Homens
e Mulheres do Poder e da Grei:
Que
os Orçamentos saídos das vossas mãos sejam um lugar onde se veja e sinta o
primado da Pessoa Humana! Onde todos possamos viver e respirar!
15.Out.20
Martins Júnior
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