No
estreito espaço regulamentar que, à mesa, nos separa, cabem oitenta longos anos, outras
tantas translações deu o planeta terra em volta do sol e cerca de trinta mil
rotações sobre si mesma. Todos os mares e todos os rios permutam o abraço
cíclico das águas correntes de todas as vidas, no mínimo canal que separa o velho
e a criança.
O
brilho das palmas infantis canta no olhar preso à chama iluminante, talvez
encadeado por sonhos não sonhados, por caminhos nunca andados, por miragens de
míticas viagens. Para o octogenário, o sopro das palmas frágeis da criança
lembra o apagar do pavio em fim de ciclo.
Os
dois – o ancião e a infante - mergulham
no mesmo aniversário narcísico, momento centrípeto de euforia, em que tudo lhes
toca e converge.
Para
ela, porém, virá o tempo de dar-se, abraçar a terra e a vida, deslocalizar a centralidade
para o mundo em seu redor. E construir, erguer, cumprir!
Para
ele, chegou a hora de retrospectivar: o que construíu - ou não, as torres que
ergueu - ou não, o que - sim ou não - ficou cumprido. E, enquanto fumegar a
chama, ainda que bruxuleante, é o tempo de escutar o bater primaveril das palmas infantis por entre
o nevoeiro das folhas vespertinas caídas no chão: “Continua! Ainda falta
cumprir o lugar, o teu e o da gente a que pertences! Falta ainda cumprir-te a ti mesmo”!
A
todos quantos – incontáveis de momento - estiveram comigo nesta mesa, à
distância de um toque de telemóvel ou internet (e, sobretudo, de coração)
brindo com a taça cheia da minha gratidão, registando a força das suas mãos,
mais que a das palmas, enfunando as
oitenta e duas velas desta “Nau Catrineta” onde navego!
Somos
apenas um episódio na grande ‘novela’ da História.
Que
o nosso episódio – o de cada um de nós, mesmo em tempo de pandemia – enobreça e
faça encantar a narrativa em que somos actores e autores indissociáveis,
atentos e necessários.
Bem
hajam!
17.Nov.20
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