Entre
o finar e o desconfinar, é longo o caminhar. Mas fizémo-lo desde as seis da
manhã de todos os dias até alcançarmos o cume da montanha. Foi hoje o dia de içar
bandeira – a bandeira do Desconfinamento.
O Natal da Saudade veio primeiro e trouxe-nos o verbo ‘finar’. Com ele vieram
todos quantos, antes de nós, abriram caminho e alcatifaram o chão macio que
hoje pisamos, enquanto o deles fora coalhado de espinhos e abrolhos.
Com eles também aprendemos a ‘afinar’
os nossos passos, a nossa língua, o nosso paladar pelo Código da Vida, perpetuando a honrosa memória
dos antepassados.
Outras vezes, fomos levados a ‘desafinar’
dos nossos maiores e, por isso mesmo ficámos menores, sempre que o fizemos. Em
contrapartida, tivemos a coragem de ‘desafinar’ de uma sociedade corrupta
quando nos obrigava a baixar a cerviz, como servos da gleba. Honrámos também a memória dos antepassados quando dissemos NÃO aos ditadores, os grandes, os médios e os
pequenos!
Ao longo do percurso, ficámos a saber o
que era ‘confinar’. Quantas gerações viveram e ainda vivem irremediavelmente
confinadas à miséria mais horrenda! Mas, se alguma vez confinar significou
condenação e ferrete escravizador, outras vezes, ‘confinar’ foi ‘condição sine qua non para chegar mais além.
Em dias e horas de confinamento social,
descobrimos que o momento é de metamorfose e metanóia: tempo oportuno de ‘refinar’, de refundar o passado, o
presente e o futuro. É neste refinamento que está o ganho. Chamem-lhe
transformação, conversão, mudança, que eu prefiro classifica-lo de fenómeno
bio-cultural de fotossíntese essencial à
vida, Mudar de caminho, enrijecer os joelhos frouxos, endurecer a fibra
visceral que nos mantém unidos e resilientes – eis o refinamento que se nos
impõe para o sucesso dos nossos passos e para o êxito da sociedade a que
pertencemos.
E chegámos ao topo. Desfraldamos a
bandeira vitoriosa, onde se lê em caracteres gigantes: DESCONFINAR. Por ironia
dos tempos, está-nos vedado o desconfinamento físico. Mas não nos podem “cortar
a raiz ao pensamento”. Desconfinar é
aprender os caminhos da liberdade e da autonomia. Para lá chegar é necessário
percorrer as seis estações que visitámos nas madrugadas que nos levam à Festa
da Vida.
Per
angusta ad augusta – ensinavam os antigos. É através dos desfiladeiros pesarosos que alcançamos os
píncaros augustos da paisagem.
Para início do almejado Desconfinamento
(tão perto e tão longe!) aprendamos a respirar fundo. Na respiração começa a
saga da Liberdade! É como nascer de novo em cada instante – é viver o Natal, o
Feliz Natal.
23.Dez.20
Martins
Júnior
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