Embora
há muito tempo aguardada, caiu hoje como uma bomba a decisão do Juiz de
Instrução Criminal sobre a tristemente famosa “Operação Marquês”.
Impossível,
quanto precipitado e insensato, seria captar em poucas linhas deste blog as mais de seis mil páginas das alegações
e respectivas conclusões. No entanto, ninguém poderá ficar indiferente ao
essencial que daí resulta, desde os seus fundamentos às implicações e
perplexidades sobre o Estado de Direito e a sua aplicação na barra da Justiça.
Ai,
a justiça dos homens!…Ai, os homens que vestem a Justiça!... Ai, a distância e
as injustiças que medeiam entre a Justiça material e a Justiça formal!...
Se,
na opinião de alguns juristas, o que hoje se passou serve de instrumento para
educar o cidadão comum na apreciação e censura de decisões judiciais
arbitrárias, fruto do impulso primário dos magistrados, por outro lado e na
mesma medida, afirmam comentadores abalizados que no palco judicial desta tarde
assistiu-se a uma peça de teatro temerário, a que podia dar-se o perigoso
título de “Requiem pelos julgadores e
um vitorioso Urra,Urra pela Justiça”.
“Não
julgueis, para não serdes julgados” – vem de longe esta máxima, mas que não
pertence às sebentas do Curso de Direito. Porque julgar é preciso. E porque é
preciso julgar, devem os julgadores dotar-se, exigir-se a si próprios, uma
escrupulosa consciência, a um tempo férrea mas humanista, sólida e cega mas
sensível, tendo em vista não apenas a verdade formal, mas sobretudo a verdade
material dos factos.
Mas,
onde encontrar um módulo exemplar desta estirpe dentro de um corpo feito da
mesma carne e dos mesmos ossos que o réu que tem à sua frente? Basta olhar para
o abracadraba ocorrido no Brasil no
processo Lula: o juiz que o condena e lhe veda a candidatura à presidência
brasileira, surge como ministro da Justiça do novo presidente, demite-se pouco
depois e – oh paradoxo dos paradoxos! – vem outro juiz absolver o mesmo réu…
Como suportar a sentença da justiça russa que reduz à prisão o herói Navalny,
só por contestar o poder político vigente? Ou como poderá julgar o presidente
americano, quando o juiz supremo é nomeado pelo mesmo presidente?!...
Quanto
criminoso absolvido e quanto inocente condenado?!... Em todo mundo, em todos os
continentes, em todas as ilhas, nesta nossa ilha também?...
Uma
tremenda chamada de atenção aos legisladores, aos políticos deputados e aos
operários (oxalá assim se considerassem) operários operantes da Justiça!
Reproduzo aqui o pensamento do jurista Miguel Poiares Maduro, citado em 2010
pelo saudoso Prof. Saldanha Sanches, no seu livro Justiça Fiscal: “O direito não deve tornar-se uma espécie de
faroeste jurídico, em que praticamente todo o tipo de comportamento oportunista
tem de ser tolerado desde que seja conforme com uma interpretação formalista
estrita das disposições relevantes e que o legislador não tenha expressamente
tomado medidas para impedir esse comportamento”.
Sem cair na veleidade,
por vezes epidérmica e populista, das ‘bocas do mundo’ em julgamentos-opiniões
populares, deve dizer-se que o cidadão tem um papel preponderante, decisivo, na
feitura das leis, mormente quando nos parlamentos se lançam as bases e os
trâmites de toda a acção cível ou penal. Mas, infelizmente, a voz do povo não
chega lá!
Em
conclusão, aspiremos - e façamos por
isso – a que nos nossos tribunais se assentem julgadores dotados da sabedoria e
da perspicácia de um Rei Salomão, severo mas sensível, robusto mas humanista!
09.Abr.21
Martins Júnior
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