domingo, 19 de setembro de 2021

QUEM METEU A BÍBLIA NA CAMPANHA ELEITORAL ???

 

          “Qualquer semelhança é pura coincidência” – é o que costuma dizer-se de acontecimentos ou circunstâncias que apresentam afinidades, sem que nada tenham em comum. Mas hoje  (direi mesmo, durante toda a semana) o caso muda de figura: estamos perante duas realidades ou dois episódios que nos interpelam no mesmo tom agressivo, embora em partituras diferentes.

         Refiro-me aos textos que o LIVRO – sempre a minha inseparável estação hebdomadária -  nos oferece neste início de semana. E, em paralelo, a agitação palavrosa das campanhas eleitorais. Há uma estreita consonância entre os dois, por mais estranho que pareça! Ambos confluem no mesmo leito, como os meandros de um rio se fundem na mesma corrente. Daí  a questão introdutória, que me proponho decifrar: “Quem meteu a Bíblia na campanha eleitoral?”

1.     A democracia restituiu ao Povo a soberania. Todos se acham herdeiros e administradores da sua porção democrática, para cuja posse canalizam esforços, investimentos, finanças, altifalantes, palcos, redes sociais  (e muitas ‘suciais’). Que pretendem? O poder, ou seja, entrar na galeria dos poderosos. Com que armas? As melhores, as piores, as directas e as clandestinas, os insultos, as calúnias e, nalguns casos, a liquidação do adversário, arqui-inimigo. Abramos o Livro da Sabedoria, capítulo II: Armemos ciladas ao justo, destruamos o pobre que é, claramente, coisa inútil, vamos apertá-los com ultrajes e torturas, até liquidá-los de vez, humilhando-os de morte vergonhosa. A nossa lei é a força”.  Nesta refrega, dita democrática, estarão os candidatos ao poder vacinados contra a prepotência do mais forte sobre o mais fraco?  Será o seu culto a razão da força ou a força da razão?!

2.     A volúpia do poder cega os ânimos. Os interesses classistas – e quase sempre a sofreguidão egoísta mesclada de salpicadas benesses para o povo - não conhecem fronteiras nem têm linhas vermelha. É a sentença maquiavélica de que “os fins justificam os meios”.  Leiamos, então, a Carta de Tiago, capítulo III: “Essa estratégia e essa sabedoria não vêm do alto, são terrenas, animalescas, demoníacas. Cobiçais e não alcançais, por isso vos vingais e matais. A justiça é só  fruto da paz”.

3.     Para aqueles que comem o seu e o alheio, os que tudo querem açambarcar, aos quais não há mando que os farte, que andam como saltimbancos a saltar de um trapézio para outro, doentes incuráveis do poder total, do partido único, do lugar cimeiro entre todos os primeiros, só lhes resta o estupefaciente de Marcos, capítulo IX:

Entre vós, quem pretende ser o primeiro, seja o último e o servo de todos”.

     Sendo muitas as variantes da ânsia do poder (mais que as do covid/19) todas se encontram, para desencontrar-se, neste tríptico vicioso em redor da urna de voto. Por isso, deixo ao livre curso da vossa iniciativa a análise desses espécimes que tanto se podem circunscrever ao meio restrito que habitamos como se alargam às mais altas esferas de comando regional, nacional, mundial.

     Foi pura coincidência da Liturgia a colocação dos textos citados neste Domingo, mas as semelhanças entre as realidades descritas são verosímeis e pesadas, porque atingem a muge do problema, qual seja o da preparação propedêutica para exercer o poder. Nesse esforço de verdadeiro tirocínio global entra a pedagogia da sensibilidade, da mundividência serena e corajosa, da visibilidade sócio-cultural, económica e até espiritual das comunidades, cujo temão  todos os candidatos pretendem  alcançar.

Em jeito de conclusão, à pergunta “Quem meteu a Bíblia na campanha eleitoral?”,  aponho, com mais vigor e pertinência, estoutra questão: “Quantos candidatos estarão dispostos a seguir o Manual de Pedagogia Política que neste Domingo lhes ofereceu o LIVRO?”.

 

19.Set.21

Martins Júnior

 


1 comentário:

  1. Justíssima reflexão. Também a fiz (não com tanta sabedoria), ontem, porque me indispõe tanta insensatez apregoada a todos os ventos por todos os quadrantes políticos que vociferam contra tudo e todos, mas não dizem que vão trabalhar para minimizar as assimetrias do nosso povo simples e ávido por justiça social e humana. Um abraço de amizade e gratidão ao P. Martins.

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