quinta-feira, 23 de maio de 2019

PARABÉNS À VIDA PLENA!


                                                      

Em maré alta eleitoral, o meu voto vai para a Vida! Voto na longevidade numérica. Mas muito mais voto na longevidade algébrica, envolvendo neste conceito não apenas a leitura linear do cômputo dos anos, mas acima de tudo a latitude global do tempo de existir.
Hoje cabe a Eduardo Lourenço a glória de subir os 96 degraus do pódio da Vida – um troféu do qual não pode orgulhar-se a generalidade dos mortais. No entanto, maior que o seu extenso curso cronológico ascende a amplitude do pensamento com que dilatou uma história quase centenária. Nisto se distinguem as multiformes dimensões da vida: o espírito ultrapassa ilimitadamente as aparentes fronteiras do corpo. Neste sentido afirmou Eça de Queirós acerca do líder do “Grupo dos Cinco”, Antero de Quental: “Ele tinha alma para sete famílias”.
E é precisamente nesta encruzilhada interpretativa que à quase mítica longitude  existencial de  Eduardo Lourenço decidi juntar a exígua vereda de alguém que não logrou a metade sequer daquela idade: Fernando Pessoa! Aquele ergue-se vitorioso do alto dos seus 96! Este abandonou na tumba um corpo de apenas 47 anos de vida respirável.
Fico-me, então, dividido (e, ao mesmo tempo, inteiro e uno) perante esta inexorável disjuntiva: Qual dos dois é o maior? Quem encheu os anos e preencheu melhor a grande paisagem da vida: Lourenço ou Pessoa? Qual mais forte e plena será: a mensagem de Pessoa ou o legado de Lourenço?
A conclusão é líquida e transparente: assim como “os homens não se medem aos palmos”, também o pensamento e a vida não se cingem aos ponteiros do cronómetro. O que importa é atingir a plenitude da medida que nos foi doada em determinado tempo histórico. Por outras palavras, o que é preciso é encher até ao cimo o vaso de argila que nós somos. Porque ´é então que o vaso, quando cheio, já não será de argila mas de ouro e diamante transfigurado.
Grande é Eduardo Lourenço. E grande será sempre Fernando Pessoa.  
Porque ambos ganharam a plenitude de estar aqui. Como bem  definiu  o génio pessoano:
  Para ser grande, sê inteiro: nada
       Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
        No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
        Brilha, porque alta vive.

23.Mai.19
Martins Júnior

1 comentário:

  1. De um mestre, espera-se sempre a intocável narrativa e o prazer de o ler demoradamente. Porque, destes três mestres do pensamento intelectual, não sei, qual deles, é o mais intangível na criatividade do mundo das letras. Desta, abstenho-me de comentar.

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