domingo, 25 de agosto de 2019

“NÃO TE CONHEÇO DE LADO NENHUM” !


                                                         

A cada qual, seu fim-de-semana. E a cada gosto, sua companhia. Daí, a interminável banca do mercado hebdomadário: a uns o puro lazer, o sol, a praia, a montanha, a outros os arraiais, o pimba ou  o jazz,  e à turbamulta de muitos outros  as chuteiras do “rei-foot”, que pode abranger tudo o mais que seja o fútil. A cada paladar, a sua fruta.
Da minha parte, até por coincidência de funções e serviços, opto por companhia e fruição a descoberta de Alguém que, de tão mal conhecido, foi classificado pelo teólogo sul-africano Albert Nolan como “Esse Grande Desconhecido”,
Hoje, surgiu ao meu encontro esse tal “Grande Desconhecido” (e paradoxalmente tão badalado) com um traço “novo” da sua personalidade. Para vê-lo, podem fazer como eu: abrir o Livro e ler umas nove ou dez linhas sobre essa personagem. É em Lucas, 13, 22-30. Habituados que estamos a cultivar uma imagem do Mestre da Galileia em poses fotogénicas, olhos lânguidos hipnotizados por uma estranha constelação algures ni firmamento ou como um condenado à galé da cruz, fazedor de milagres, hoje apresenta-se-nos bem diferente. Ele próprio reconstitui o cenário e a personagem:
“O dono da casa fechara as portas e preparava-se para dormir. Batem-lhe à porta. O homem vê quem é, conhece o ´noctívago grupo ‘visitante’ e responde-lhes de lá de dentro: “Vão-se embora. Não sei de onde sois, nem vos conheço”. A trupe do exterior volta ao batente da porta, insiste  e faz valer os seus argumentos: “Tu dizes que não nos conheces? Então não te lembras que andámos juntos, comemos e bebemos contigo? Nós seguimos-te sempre quando falavas em público, na sinagoga, nos  caminhos, nas praças. E não nos conheces? Olha bem e deixa-nos entrar”. O dono da casa explode: “Já disse e repito  que não vos conheço de lado nenhum. Tirem-se já da minha porta”
         São imensas e duras as ilações desta breve parábola, em que o “dono da casa” é o Mestre Jesus e a trupe envolve todos os devotos oportunistas, os pseudo-crentes fundamentalistas, os rigoristas, os aduladores, os espiões ao serviço dos magnates do Templo, enfim, a chusma de estrategas do grande palco do mundo, uns ignorantes, outros ambiciosos à espera das benesses hierárquicas, mas todos capazes de matar o Homem.
         Mais que as duras ilações, acompanhou-me todo o dia a redescoberta deste traço do Líder Nazareno. Para Ele, pouco ou nada contam os espectáculos das multidões, por mais proclamatórios e lisonjeiros que sejam. Ele detesta todas as expressões de populismo, hipocrisia e devocionismo balofo. Ele é o Homem da verticalidade, da acção e não receptáculo de incensos, palmas e votos pios, muito menos de encenações embusteiras, sob a capa de culto oficial.
Durus est sermo hic – poderíamos repetir a mesma reacção dos judeus contra o Mestre, noutras circunstâncias da sua vida. “É forte demais esta conversa”!... Mas é a realidade. É sobretudo para a classe a que pertenço, os eclesiásticos, os hierarcas, os do topo da pirâmide e os que a estes se atrelam como rémoras parasitas, no dizer do grande Padre António Vieira. Não é diferente a linguagem contundente do Papa Francisco, quando invectiva a Cúria Romana, onde vegetam malevolamente, os cardeais, coroados com o ridículo título de “príncipes da Igreja”.
Correndo o risco de pisar linhas vermelhas da Dogmática institucional, ouso pôr em dúvida certas nomeações para “Santos”, as chamadas beatificações e  canonizações. E argumento;  Quem é um homem para poder nomear “Santo”, Perfeito, quase Divino, um outro ser da sua  mesma condição?... Será que o “Dono do prédio”  receberá em sua casa aqueles que lá se apresentam com as credenciais assinadas por um outro homem investido de um poder mundano, emanado de eleitores residentes no mundo?\
Talvez esteja a resposta incluída na supra citada fala do  "Dono do prédio"... 

25.Ago.19
Martins Júnior

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