Fim
de semana e fim de Agosto. Fim de férias e de festas. Foguetes em estalos do
fim. E, enfim, o anunciado estertor de
candidatos ao galarim do poder e
da fama.
Mas
não vou por aí. Vou para onde me leva, como habitualmente, o Livro lido de
sábado para domingo. Não tanto pela letra quanto pelo espírito que em cada
linha se nos revela. E o que nos revela é o rosto lavado e livre do meu Mestre
Nazareno. Vale a pena abrir o texto de Lucas, 14.1.7-14.
Em
nenhum parágrafo, em nenhuma linha o Místico de Nazaré evoca, muito menos
invoca, o Senhor Deus, o Pai, o Templo, o Santuário. Tão-só uma nótula de
civilidade, das boas maneiras, apenas um código de conduta no protocolo social,
cirurgicamente dirigido, no caso em apreço, à burguesia urbana de Jerusalém. Cheia
de humor negro, verrinoso, é verdade, mas pautada sempre pelo equilíbrio, esta
mensagem tal qual se vê não ultrapassa as raias das normais etiquetas da praxe
quotidiana.
Foi
por cenas idênticas que os fariseus e sumos-sacerdotes do Templo ostracizaram o
Mestre, trataram-no por Satanás, tentaram convencer a ,multidão de que Ele era a
reincarnação de Belzebu. Porque Ele só falava do homem e da mulher, acariciava
as crianças, curava os enfermos, promovia o ser humano em todas as suas
dimensões. O “crime” do Nazareno era o de abrir portas e janelas nos cérebros
manietados e apodrecidos dos seus contemporâneos. Na centralidade de toda a sua
movimentação pública estava a humanidade, por vezes acima da divindade, mas sempre
ao lado dela. Para a sociedade teocrática do seu tempo, cilindrada como estava sob
as botas cardadas de um deus moisaico, armado e justiceiro, a mundividência do
Mestre e a sua nova pedagogia constituíam
uma afronta aos poderes oficiais. Daí, a “excomunhão” que os auto-proclamados
donos da religião descarregaram contra Ele, até ao cúmulo do assassinato.
No
episódio de hoje e de amanhã, o Mestre observa a estratégia bacoca dos
convidados àquele jantar, cada qual espreitando a melhor oportunidade de agarrar
os primeiros lugares na mesa de honra. É a ganância de mil braços, o oportunismo
despido, o assalto programado. É aí que
brilha o nosso Mestre com o seu discurso transparente e breve, mas
tremendamente cáustico para uma plateia de brasonados pelo dinheiro, iluminados
pela prosápia classista do farisaísmo pseudo-religioso:
Naquele
tempo,
Jesus entrou, a um sábado,
em casa de um dos principais fariseus
para tomar uma refeição.
Todos O observavam.
Ao notar como os convidados escolhiam os primeiros lugares,
Jesus disse-lhes esta parábola:
«Quando fores convidado para um banquete nupcial,
não tomes o primeiro lugar.
Pode acontecer que tenha sido convidado
alguém mais importante que tu;
então, aquele que vos convidou a ambos, terá que te dizer:
‘Dá o lugar a este’;
e ficarás depois envergonhado,
em casa de um dos principais fariseus
para tomar uma refeição.
Todos O observavam.
Ao notar como os convidados escolhiam os primeiros lugares,
Jesus disse-lhes esta parábola:
«Quando fores convidado para um banquete nupcial,
não tomes o primeiro lugar.
Pode acontecer que tenha sido convidado
alguém mais importante que tu;
então, aquele que vos convidou a ambos, terá que te dizer:
‘Dá o lugar a este’;
e ficarás depois envergonhado,
Parece
que ainda não estava satisfeito o nosso Mestre. Faltava-lhe a cereja em cima
daquele bolo do seu discurso. Proletário entre capitalistas, apesar de
convidado pelos distintos “pares da aristocracia reinante” que excluía os
párias da sociedade, Ele não se conteve sem denunciar ali, ao vivo, as
gritantes assimetrias sociais do seu tempo, o paradoxo abissal que aquela fina
e lauta mesa escondia. E arranca com esta sentença capital:
Jesus disse ainda a quem O tinha
convidado:
«Quando ofereceres um almoço ou um jantar,
não convides os teus amigos nem os teus irmãos,
nem os teus parentes nem os teus vizinhos ricos,
não seja que eles por sua vez te convidem
e assim serás retribuído.
Mas quando ofereceres um banquete,
convida os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos;
«Quando ofereceres um almoço ou um jantar,
não convides os teus amigos nem os teus irmãos,
nem os teus parentes nem os teus vizinhos ricos,
não seja que eles por sua vez te convidem
e assim serás retribuído.
Mas quando ofereceres um banquete,
convida os pobres, os aleijados, os coxos e os cegos;
Para
quê mais palavras?... Ó grande Mestre, intrépido arauto da Justiça e do Direito
no reino dos homens! Razão tenho eu em dizer e repetir; “Se cá voltasses, eu punha
a minha cabeça onde tu pões os pés”.
Tremenda
e inexorável sanção para os pregadores
da sua mensagem!
Devorador
que sou de homilias e demais oratória sacra, devo confessar o quanto me
incomoda e até indispõe no corpo e no espírito quando, em certos sermões, sobretudo
nas festas religiosas de verão, oiço o orador que, em quinze vocábulos, repete
dez vezes o nome de Jesus, o Senhor e similares, daí partindo para voos esotéricos,
a que chamam meditações sagradas. Aprendamos com o Mestre. Directo, fraterno,
humano! Agora percebe-se, em plena evidência, a grande paixão do sábio Padre
Teilhard de Chardin, que dedicou toda a sua vida de cientista a demonstrar que
é pelo humano que se chega ao divino.
Na
ponte que liga Agosto a Setembro, o Mestre dá uma portentosa lição de
urbanidade e educação cívica e social. Por isso, não estarei longe da verdade
ao afirmar, durante largo tempo, que em certas circunstâncias o povo precisa
mais de educação que de religião!
31.Ago-01.Set/19
Martins Júnior
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