Eu,
que não sou nada atreito a expor “estados d’alma” nestes dias ímpares, muito
menos “despir-me” em público (até por isso detesto os estendais do facebook) venho hoje descarregar toda a
bílis e todos os autoclismos em cima de tanto charco, de tanta sarna e de tanta
babugem que os ecrãs, os opinadores, os ‘achistas’ os locutores e os loquazes políticos
de alto a baixo despejam diante da nossa cara, presa aos noticiários.
É
de uma interminável tragicomédia-de-rua aquilo que nos é servido, “ao almoço,
jantar e ceia” (assim fala o dialecto madeirense), dando a impressão que cada
cena é uma imbricada trança que reproduz outras tantas quantas os figurantes
quiserem. Dá também a impressão que nós, os inquilinos terráqueos, não passamos
sem isto, algo que faça faísca que produza o medo, depois a desconfiança e, no
fim, a sentença no banco dos réus.
A Pandemia em três Actos,
ao abrir o palco do século XXI.
Primeiro,
o pânico que a todos nos tolhia, com a garra adunca da morte batendo à nossa
porta e nós a esconder-nos como tímidas crianças nos biombos do confinamento. A
seguir, o intermezzo allegro ma none troppo que nos fez aliviar, tergiversar,
divertir, para logo nos fecharmos como monges orantes acendendo velas nas aras
da Pfizer, da AstroZeneca, da Moderna e
afins. E elas vieram. E foi o Terceiro Acto: quando se esperavam solos de
trompetes e marchas proclamatórias, eis que por causa de uns escorregadios “chico-espertos”
(isso é algo tão estranho que não rime com o português decerto?…) por causa desses mosqueteiros de
pacotilha e alguidar volta outra vez a guerra, os quilómetros de fita em
estúdio, as quadraturas, as
circulaturas, os eixos maléficos e os réus de lesa-magestade.
Poupem-nos.
Poupem-me. Façam o que têm a fazer e andem para a frente! Já há traças demais
com que nos coçar.
Por
tudo isso, preferi outras companhias. Sabia que as encontro todos os anos nesta
viagem tricircular, entre 4-5-6 de Fevereiro, Em 4, assisto ao nascimento do fundador do
moderno Teatro Português, Almeida Garrett, no ano de 1799. Em 5, acompanho à
última morada em 2003 o maior poeta moçambicano, José Craveirinha, depois de o
ter visitado em Maputo, três anos antes. E em 6, de 1608, saúdo a natividade do
‘Imperador da Língua Portuguesa’, o Padre António Vieira. Sinto-me bem, ouvindo
as oportunas mensagens de cada um deles. Tão oportunas e frescas como
buganvílias roçando os nossos ombros, quer dizer, plenamente aplicáveis à
pandémica e babélica barafunda que anda por aí. Ofereço-vo-las, de bom grado;
De
Almeida Garrett, de ironia cáustica sobre os políticos e seus apaniguados:
Dizia-me um secretário de
Estado, meu amigo, que para se repartir com igualdade o melhoramento das ruas
por toda a Lisboa deviam ser obrigados os ministros a mudar de rua e bairro
todos os três meses.
De
José Craveirinha, o seu ânimo libertador e a esperança no dia futuro, como um
girassol por entre os espinheiros da exploração humana:
Do ódio e da guerra dos
homens
Das mães e filhas
violadas
Das crianças mortas de
anemia
e de todos os que
apodrecem nos calabouços
cresce no mundo o
girassol da Esperança
E
do maior e mais eloquente Orador da Pátria Lusa, este pregão tão solene e
imperativo como uma Encíclica Urbi et
Orbi:
Nós somos o que fazemos. O
que não se faz não existe.
Portanto, só existimos
nos dias em que fazemos. Nos dias em que não fazemos, apenas duramos.
Agir
em conformidade. Fazer. Alumiar. No
4-5-6 de Fevereiro faço o meu Tríduo Pascal antecipado, com aqueles “que da lei
da morte se vão libertando” e, por isso, continuo a vê-los e ouvi-los no ecrã planetário
onde todos os dias nasce a Luz e ”Cresce o Girassol”!
05.Fev.21
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário