Está
na moda chamar poetas e trovadores à língua dos políticos para emoldurarem em
arco-bandeira a prosa repetida do seu verbo mobilizador. Jorge Palma tem sido o
preferido da nossa praça, desfraldando aos quatro ventos em fúria: “Enquanto houver estrada pra andar, a gente
vai continuar, Enquanto houver vento e mar”.
Não fujo ao ritmo e, ao acordar com os
tímpanos martelados com tantas e quantas rajadas de prego – a mais notória,
aqui perto, a chumbada canhota do Orçamento de Estado em abraço contra-natura
com a dextra inconciliável do Parlamento – a que se juntam as guerras
fratricidas das mesmas famílias, do PSD,
na São Caetano, e do CDS, no Largo do Caldas, enfim, um caldo escaldante
que nos deixa em torno de parafuso imparável.
Como quem entra no forno das
ressonâncias hospitalares, parece que um camião furibunda passa a toda a hora
em cima das nossas cabeças: é a Espanha na demanda das nascentes fluviais, á
Polónia em refrega forense contra a União Europeia, é a França em batalha naval
com as traineiras do Reino Unido, é a China comprimida com a problemática dos
combustíveis, as alterações climatéricas, os piratas elevados aos altares dos
paraísos fiscais,as pandemias galgando invernos e vidas, já sem falar na obesa
Coreia do Norte e os mísseis de longo alcance.
Quem é que atura viver um instante mais neste crematório global a que
fomos atirados desde que nascemos?
“Inquietação, Inquietação! – é o que
mais (ou menos…) define este tempo. Razão tinha karen horney quando observou e escreveu “APersonalidade
neurótica do nosso tempo”. E mais lógica e sensibilidade reclamava o
saudoso e persuasivo cantautor José Mário Branco, ao compor tão
expressiva balada de protesto.
Que fazer?... Há quem se alheie por completo
de todos os noticiários, há quem fuja para o deserto do seu quarto, curtindo dores
e moendo fantasmas, há quem adormeça nos estupefacientes de leituras místicas à
mistura com devocionismos de cordel. E há quem vá à farmácia buscar a droga
inútil, porque já a traz de si. Há ainda
quem se afogue nas ‘salsas ondas’ do desespero ou no voo sem retorno de uma ponte
sobre o rio, seco de água e vazio de esperança.
Por mim, prefiro recorrer ao
laboratório inesgotável dos pulmões (falo
do mecanismo mais íntimo da fisiologia humana) lá onde se opera a maravilhosa
fotossíntese do ar que nos envolve: Respirar!
Aconselham
os psicólogos e nutricionistas que a respiração pentagonal – cinco vezes ininterruptas,
mas serenas – restitui-nos a calma interior e segura o nosso olhar perante a
babilónia tresloucada do mundo em que vivemos.
Respira!
E depois, se mais não puderes fazer, ‘limpa o teu rosto, perfuma a tua cabeça’
e põe na tua rua, na tua aldeia, na tua cidade – põe mesmo ao rubro e de
verdade – aquela canção, amarela de girassol arábico e azul da abóbada que nos
cobre: “No meio da escuridão, em vez de amaldiçoares as trevas, acende ao menos
uma candeia”!
E
respira, respira sempre o ar da liberdade possível – a tua quota de ar livre
que nenhum poder te pode tirar!
29.Out.21
Martins Júnior
Bom dia, desde o Brasil....Sempre acutilante, conciso e direto ao ponto!
ResponderEliminar