quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

SEMPRE PRESENTE CONNOSCO: PORQUE NÓS É QUE PRECISAMOS DELE !

                                                                       


Não é - e nunca foi, desde tempos imemoriais – um beija-mão protocolar aquilo que  dá pelo nome de homenagem a Francisco Álvares de Nóbrega, o poeta-filósofo que acompanhou e intensamente viveu a turbulência libertadora da Revolução Francesa de 1789. O seu estro poético plasmado nos seus sonetos ombreou, em alguns excertos, com o de Camões e mais impressivamente com o de Manuel Maria Barbosa du Bocage, seu contemporâneo e companheiro de cela nas masmorras do Limoeiro, em Lisboa.

A vida e obra de Francisco Álvares de Nóbrega são o seu maior e único monumento que nos legou. Ninguém lhe guardou a efígie e nem nunca ninguém até hoje soube o local onde depositaram o caixão. E porque é o seu ‘genoma’ matricial a maior herança que nos deixou, Machico jamais esquecerá o seu lugar sempre presente connosco. Porque não é ele que precisa de nós – nós é que precisamos dele!

Foi esse o acontecimento de ontem na terra que lhe serviu de berço. A comunicação social madeirense obliterou liminarmente a comemoração do 248º aniversário natalício. Pouco lhe importou, porque para ele os fogos fátuos da publicidade passam-lhe ao largo. Do silêncio marmóreo da sua efeméride o que exclusivamente ele quer que se retenha é o seu espírito aceso e a sua integridade de carácter, “de antes quebrar que torcer”, na defesa sustentada dos ideais da Liberdade, Igualdade e Fraternidade, mesmo à custa do próprio sangue, da sua própria liberdade.

Excelente a programação que iniciou com o soneto dedicado “À Pátria do Autor” (Machico), interpretado pela Tuna de Câmara de Machico, a que se seguiu o ex-libris da sua personalidade, o soneto “DAS ALMAS GRANDES A NOBREZA É ESTA”, recitado por João Manuel Henriques Fernandes, cujo pai, vereador da Câmara Municipal de Machico em 1954, deu corpo à iniciativa de colocar o delicado  Monumento-Livro-Mármore implantado no Miradouro que hoje ostenta o nome do poeta pensador. Em tempos da ditadura salazarista, foi Obra!

A conferência do Professor João Luís Freire, baseada na sua tese de Mestrado – “Alma Padecente” – trouxe à ribalta dos nossos dias a personalidade caleidoscópica do grande sonetista. Momento alto da noite foi a proclamação dos vencedores do “XIV Concurso Literário Francisco Álvares de Nóbrega”, iniciativa anual da Junta de Freguesia de Machico. O júri, presidido pela Profª. Drª. Maria  Teresa do Nascimento, da UMa, galardoou “ex-aequo”  os dois trabalhos (género conto), intitulados “O Mar é um Lençol de Seda” e “Plêiades”, respectivamente de Pedro Filipe Costa Gouveia e Nuno Rafael Silva Oliveira Costa, entre dois cenários aparentemente contraditórios, mas estruturalmente complementares. A não perder a sua leitura, no ‘sítio’ da autarquia promotora do concurso.                    


Mas a homenagem ao nosso Grande “Camões Pequeno’ atingiu o pleno quando apareceu em cena o vídeo da comemoração realizado pelos utentes idosos do Centro Cívico-Cultural e Social da Ribeira Seca. Não podendo deslocar-se ao centro da cidade, associaram-se à efeméride com a apresentação de quadras populares gravadas pelos próprios idosos, tendo como referência viva o legado de  Francisco Álvares de Nóbrega. E com que ênfase o fizeram! – o que veio demonstrar que a mensagem do nosso poeta encontrou eco na psicologia das gentes rurais.

Aliada a esta sensibilidade emergente da chamada “Terceira Idade”, foi notória e mui simpática a presença de duas turmas da Universidade da Madeira, que seguiram minuciosamente todas as intervenções produzidas, como que redescobrindo Alguém, cujo mistério estava ainda por desvendar.

 E foi precisamente esta osmose intergeracional que levou a Prof.ª Mónica Vieira, vereadora da Cultura da Câmara Municipal de Machico, responsável pelo evento, a pontuar a presença de Francisco Álvares de Nóbrega como polo aglutinador de mentalidades e sensibilidades múltiplas no seio da terra que o viu nascer “em pobre, sim, mas paternal morada”.                       


Bem haja quem promoveu o acontecimento e quem fez actual, no meio de nós, o nosso conterrâneo, talvez a maior alma que Machico produziu. Porque não é ele que precisa de nós. Nós é que precisamos dele!

 

01.Dez.21

Martins Júnior

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