Como quem conta os nós de
uma soca adulta  da nossa cana de açúcar,
um a um, até chegar à raiz, assim podemos percorrer os quarenta anos da
autonomia madeirense, começando pelo húmus que a  fez nascer. Chamemos-lhe  “idade da ternura”, aquela que estamos hoje a
comemorar, sendo certo que o organismo democrático  nunca poderá  crescer 
na almofada fofa do contentamento narcisista. Pelo contrário. Porque
está cercado  de  vírus pantanosos, pré-organizados nos
camuflados antros de interesses corporativistas, o crescimento democrático
exige sempre vigilância, frescura, água renovada, seiva corrente.
Faz hoje quarenta anos
das primeiras eleições para a Assembleia Regional da Madeira e,
consequentemente, do seu governo próprio. Foi uma cabazada de votos para a
formação partidária que até agora nos governa. Dos 41 deputados, 29 foram para o
PSD, 8 para o PS, 2 para a UDP e 2 para o CDS.
Este é  o testemunho de quem viveu dentro do furacão
de onde saiu um corpo desequilibrado, atacado de  macrocefalia logo à nascença,  a que pomposamente baptizaram de Autonomia. A
geração de hoje nem faz ideia do despudor e da barbárie de que foram capazes os
auto-proclamados donos da “Madeira Nova”.
Dois foram os paióis onde
se fabricaram as armas de arremesso fulminante: a barbárie do bombismo  flamista e o despudor de uma Igreja ajoelhada
ao trono do antigo regime. Ao mais isento observador ocorrerá, de certo, esta
pergunta: Como é possível uma aliança tão contraditória entre o altar e a
matança de inocentes? Resposta imediata: só num regime muçulmano do jhiadismo,
a “Guerra Santa” de Maomé e seus sequazes, em defesa de um sanguinário Alá!
Ainda está por descrever esse rasto
de sangue, destruição e morte que o movimento clandestino “Flama” deixou no
berço daquilo que chamam Autonomia. Isto, apenas, bastará de paradigma: 1) pela calada da noite, criminosos
assassinos colocavam nas mãos de jovens, ainda adolescentes, os explosivos
traiçoeiros que espalharam o terror, rebentaram  viaturas e construções, em nada proporcionalmente
diferentes dos atentados bombistas do Daesh. Aconteceu, até, o suicídio de um
rapaz, de certeza inexperiente, que viu rebentar-lhe mortalmente nas mãos a
bomba destinada aos defensores da verdadeira democracia conquistada no “25 de
Abril”.  2)  Um outro, a cujo
julgamento assisti na comarca de Santa Cruz, viria a enforcar-se (ou ser
enforcado) na prisão para que não fosse desvendada a  máquina infernal da “Flama”. 3) O bombismo terminou logo após a
subida de João Jardim ao poder regional – testemunho de um operacional da “Flama”.
4) A bandeira oficial da Madeira foi
decalcada, copiada daquela que a “Flama” usava, como sua,  nas inscrições murais
espalhadas por toda a ilha como
pré-aviso de ataques bombistas. Acrescento que, nesse período escaldante,
Machico viu-se livre desses atentados em virtude da constante vigilância
popular, dia e noite.
Ao lado da “Flama”
militava a Igreja, ocupada pelo bispo Francisco Santana,  promotor na Madeira do já derrubado regime
fascista. “Eu trato  por tu os ministros
do “Estado Novo” salazarista – confidenciou-me pessoalmente, ainda antes de ser
bispo. 1) Chegado ao Funchal, demite
da direcção do “Jornal da Madeira” o ilustre Pe Dr. Abel Augusto da Silva e
entrega-o a um rapaz factualmente conotado  com o regime salazarista, a União Nacional,
dirigida na Madeira pelo tio deste, Dr. Agostinho Cardoso. O dito rapaz usou o
Jornal da diocese como trampolim  para
chegar a presidente do governo regional, cargo que ocupou durante mais de 38
anos.  2)  Em vésperas de eleições
de 76, o bispo desmultiplicou-se, sem tréguas, numa campanha religiosa
manifestamente tendenciosa: publicou uma Nota Pastoral, lida em todas as
igrejas,  alertando os cristãos contra o
socialismo, que manhosamente qualificava  de “marxista”; promoveu o grande espectáculo
da missa do “Corpo de Deus” no estádio dos Barreiros e, no domingo anterior às
eleições, faz uma extensa homilia de teor marcadamente separatista, misturando
a “barca de Pedro” e Portugal a afundar-se, não hesitando ele, lisboeta, a  regionalizar-se madeirense: ”Queridos
ouvintes, que me escutais em Portugal e no estrangeiro, podeis ver como nós, Madeirenses,
 sabemos conviver, sempre que nos deixam ser
genuinamente Madeirenses”. (O negrito
dos caracteres é  tal e qual o mesmo do
Jornal da Madeira).   3)
A anteceder as eleições de 76, o citado bispo levou o jovem, novo director do
Jornal, a todas as paróquias, apresentando-o como o melhor para governar a
Madeira. O Padre Tavares Figueira, conhecedor profundo deste período, retratou
a situação, com humor mas com inteiro rigor científico, numa entrevista de
circulação nacional: “O PPD nasceu numa sacristia e o  pai foi o bispo Francisco Santana”.
Muito mais poderia acrescentar
sobre uma matéria que os jornalistas locais esconderam  e continuam a esconder em sub-reptícias reportagens
que não passam de “larachas da Autonomia”. 
Sirvam estas palavras,,
que comprovo sem qualquer receio, para interpretar a entrada da chamada
Autonomia na “idade da ternura”, desde o 27 de Junho de 1976 até  27 de Junho de 2016. Saibam os homens e
mulheres de hoje com que mãos se fez o parto desta Autonomia: o altar
transformado em quartel de guerra e, escondida sob as toalhas,  a pólvora clandestina que iludiu e matou.
Terei oportunidade, a seu tempo, de
trazer a público o que ainda não foi descoberto.
Duas notas finais:
Foi eleito nas listas do
Partido Socialista aquele que, pouco depois, guinou para o PSD como presidente
da Assembleia Regional, Dr. Miguel Mendonça. 
Recordo Paulo Martins,  hoje,  dia do seu aniversário natalício, eleito como
eu nas listas da UDP e em cuja companhia escrevemos páginas concretas em prol
da verdadeira autonomia dos madeirenses.
     
         27,Jun.16
         Martins
Júnior