Muito se tem afanado a Comissão Oficial
para oferecer aos madeirenses – quase impondo até à exaustão – a épica proclamação
dos “600 ANOS” do Achamento da Ilha. Importante seria abrir um espaço de
silêncio e prestar ouvidos ao eco dessas comemorações junto dos
madeirenses. Passaria, então, o Povo ao estatuto de emissor e a Comissão
quedar-se-ia no papel de destinatário. Mais que importante ou interessante, seria
intensamente enriquecedor auscultar a sensibilidade popular face à Grande Nova
do seu nascimento para a História e, muito acima disso, situar a efeméride não
apenas no pó dos arquivos ou nas rocambolescas e ruidosas manifestações
públicas, mas transplantar para o quotidiano das gentes as mensagens que daí advêm.
Ora, quem no último fim-de-semana subiu
até ao recinto de festas da Ribeira Seca, terá fruído uma das mais gratas
sensações ao ver desfilar no grande palco, precisamente, a sensibilidade do
genuíno Povo Madeirense face aos “600 ANOS”, descrevendo a fisionomia dos concelhos desta
Região. Numa linguagem limpa de artifícios, ao som de melodias originais,
jovens e adultos, adequadamente indumentados, exprimiram em canto e dança
episódios marcantes de cada concelho.
Eis
alguns tópicos mais identitários:
O
primeiro, como ilustra a gravura em epígrafe, enaltece a chegada da nau
henriquina, com esta legenda:
Lá vem o navio
Lá fora na barra
Traz uma bandeira
Traz uma guitarra
A canção da vida
Lá fora na barra
Apresentou-se,
depois, a coreografia representativa do concelho de Santana, com esta mensagem,
de vincada inspiração telúrica:
Cá nesta ilha
Tudo é regional
A espetada e o vinho e
a semilha,
O Governo e o Povo em
geral
Santana cidade
Jovem da Madeira
Quem cultiva a terra
É gente de primeira
Lindas maçarocas
Casinhas de palha
Palácios do Povo
Glória a quem trabalha
…………………………………………………………..
Seguiu-se-lhe
Santa Cruz, “Cidade antiga e famosa,
Nossa vizinha e amiga”, com trovas dirigidas a cada uma das suas cinco
freguesias, entre as quais:
Santa Cruz já tem
Imagem de marca
Juiz e juíza
Na sua comarca
Alô sr, piloto
Mais a hospedeira
Viva o aeroporto
Porta da Madeira
À nova cidade
Chamada Caniço
Olhem p’rao betão
Cuidado com isso
Somos da Camacha
Somos camacheiros
Cá para o bailinho
Somos os primeiros
Parabéns a Gaula
Gaula do Amadis
Um Povo que canta
É um Povo Feliz
…………………………………………………………..
Termino esta primeira fase da viagem pelos
vários concelhos da Madeira e Porto Santo, com a evocação de Câmara de Lobos,
cujos figurantes ostentavam no canto e na coreografia as duas componentes distintivas das suas
gentes: a pesca e a música.
Câmara de Lobos
De lobos do mar
Numa mão a espada
Na outra o cantar
Gente benfazeja na
terra a lavrar
Gente destemida que desbrava
o mar
Cabo das tormentas
Ilhéu de esperanças
Viva a Juventude
Vivam as crianças
Gente lá bem alto do
Cabo Girão
E Povo que sofre colado
ao chão
…………………………………….
Eis algumas das mensagens que no vale
da Ribeira Seca ecoaram em homenagem aos “600 ANOS”, expressões genuínas de uma
faixa da sensibilidade madeirense que assim pretende demonstrar a sua
interpretação de um acontecimento que se quer dinâmico e actualizado e não
apenas artificioso e superficial. Assim se prova que pertencem ao Povo os “600 Anos”
da sua história.
11.Set.19
Martins Júnior
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