domingo, 15 de agosto de 2021

QUANTIDADE versus QUALIDADE – TANTAS SENHORAS E TÃO POUCA “SENHORA”

                                                                         


Fazendo caminho, ao fim de semana, através das páginas do LIVRO, impossível passar adiante sem fixar o olhar no alto do Monte. Porque hoje é Dia da Senhora do Monte – uma designação autóctone e, por isso, só aplicável na Ilha da Madeira. Em todo o mundo católico, o 15 de Agosto tem uma outra direcção oficial: Homenagear a Assunção de Maria Senhora.

         No entanto, uma diversa antonomásia, de índole popular, classifica   esta mesma data como o “Dia das Sete Senhoras”, alusão ao número de festas dedicadas à mesma Personagem, mas sob outros tantos títulos, sendo um deles a “Senhora da Graça” no Porto Santo.

         São às centenas as vestes e os apelidos qualificativos que a imaginação dos crentes, secundada pelo magistério eclesiástico, atribui à mesma Senhora. Recorrendo a um axioma comum, dir-se-á que os títulos, a narrativa, alegorias e similares distribuídos à Senhora, Mãe de Jesus Nazareno, multiplicam-se como cogumelos por tudo quanto é canto. Proponho a leitura de um bem elucidativo opúsculo, da autoria do franciscano António Joaquim Dias, edição da ‘Paulus’, denominado ‘Santuários da Mãe de Deus’ .

Aí vem uma síntese dos incontáveis títulos dados à mesma Senhora. E uma das conclusões mais impressivas desse estudo é o facto sintomático de que cada país quer ter uma “Nossa Senhora” exclusiva, só sua, quase produto nacional, susceptível de exportação para o estrangeiro. Assim, a França tem a Senhora de Lourdes, o México a de Guadalupe, o Brasil a Senhora da Aparecida (de cor negra), a Polónia tem a Senhora de Czestochwa, Espanha a Senhora do Pilar, Itália a Senhora do Loreto, Venezuela a Senhora do Coromoto, Portugal a Senhora de Fátima e, para não alongar mais, a Madeira tem a Senhora do Monte, a cuja festa nunca faltam as engomadas e emproadas autoridades regionais, porque Ela também é a Padroeira da Ilha. É curioso motar que, além das “Senhoras” patrióticas nacionais, acontece que o povo crente cria outras, de carácter local, como a Senhora do Almortão, a Senhora do Fastio no alto Minho e, aqui no Funchal, a famosa “Nossa Senhora do Calhau”, a primeira capela construída na cidade.

Mas não fica por aqui a criatividade pietista da tradição mriana. O estudo que venho  citando traz um sintético cardápio, ao gosto popular, para todas as pessoas e circunstâncias da vida, tais como: A Senhora do Sim, a Senhora do Céu Estrelado, a Senhora do Céu Nublado, a Senhora das Quatro Estações, a Senhora dos Pobres, a Senhora dos Ricos, a Senhora dos Desempregados, a Senhora dos Quinze Anos, a Senhora das Lides Culinárias, a Senhora dos Filhos das Ervas, a Senhora das Brotas,  a Senhora do Engaranho, a Senhora da Agonia.  E fico-me por aqui porque quem me lê saberá de muitos outros nomes. Conta-se que, há 100 anos, o povo madeirense abalou a pé para a freguesia de Santana, porque correu a fama que Nossa Senhora teria aparecido a uns pastorinhos santanenses. Mas não pegou. Ao contrário, foi um logro pegado. Senão, teríamos hoje mais uma, a Senhora de Santana.

Reflectindo sobriamente: todos estes sobrenomes, embora folclóricos alguns deles, têm um fundo de devoção que não temos o direito de agredir gratuitamente. O problema é que os crentes ‘perdem-se’ e  comovem-se com as histórias, algumas vezes lendas e visões psíquicas, em vez de procurarem a verdadeira face de Maria, a autêntica, a sua personalidade íntegra e generosa, aquela que vem  descrita no texto do LIVRO. E esse é o perigo: desligam da Verdade e preferem correr atrás de ‘novelas’ piedosas. Já Paulo Apóstolo escreveu ao seu colaborador Timóteo, nestes termos: “Meu caro, mantém-te sempre vigilante, porque virá o tempo em que os homens não suportarão a doutrina sã e certa,  fecharão os ouvidos à Verdade para os abrirem às fábulas” .

Já vai longa esta descrição, em tempo da silly season. E falta o principal, ou seja, a que conclusão pretendo chegar, admitindo e respeitando (mesmo sem concordar) as opiniões contrárias.

É o que tenciono fazer no próximo dia ímpar, o do Senso&Consenso.

 

15.Ago.21

Martins Júnior

             

        

1 comentário:

  1. Aqui, em Palmital, Brasil, temos a rua "Padre José Martins". Uma justa homenagem....

    ResponderEliminar