Tanta
coincidência para quanta dissonância!
         A coincidência vem do LIVRO – o meu bem-estar
entre uma semana e outra – e o centenário velório ambulante na cidade de
Machico,  
         Os liturgistas do dicastério romano, (é
o departamento que detém o pelouro do alinhamento dos textos bíblicos para todos
os Domingos do ano) decidiram fixar para o 9 de Outubro de 2022 –  XXVIII Domingo Comum, Ano C – dois textos
narrativos em que são protagonistas onze homens leprosos e outras tantas
curas-milagres. Estas as coincidências mais tocantes do 9 de Outubro/22.
         Mas há diferenças, não só nas ‘fés das
pessoas’ mas sobretudo nas facturas e formas de pagamento do sucesso obtido
pela Fé.
         É de todo o interesse cultural penetrar
nos labirintos do espírito da Fé ou das ´fés´ dos intervenientes nestas duas
narrativas tão coincidentes  superfície.
Para tal, convém reler o capítulo 5  do “II
Livro dos Reis”, escrito entre 560 e 538 
a.C..  Deixo aqui os tópicos mais salientes, a
começar pelas três personagens marcantes, cada qual com sua Fé, todas diferentes:
o general Naamã, chefe das Forças
Armadas sírias, orgulhoso, descrente do Iavé judaico e do seu profeta,
incrédulo das águas do rio Jordão e das eventuais propriedades terapêuticas. Eliseu,o profeta de Iavé, altruísta,
homem de espírito, pouco dado a rituais excêntricos e supersticiosos. Giési, o ajudante  de Eliseu, seu servente e directo «colaborador,
egoísta, astuto, calculista e sem escrúpulos.
         Dissecando as três ‘fés’.
Concretamente, não foi a fé convencional que curou Naamã. Foi a sua
condescendência aos conselheiros, seus subalternos,  Acima de tudo, foi o seu voluntarismo, a coragem
do seu querer, paradoxalmente oposta à sua incredulidade, inclusive nos sete
mergulhos no rio Jordão. Cumpridor dos ritos pagãos, muniu-se de uma fortuna de
ouro e prata, acrescida de vestes sumptuosas, para pagar ao médico, curandeiro
ou profeta que o libertassem do terrível mal. Hoje, diríamos ‘pagar a promessa’,
ainda que não a tenha feito.
         A Fé de Eliseu, humilde, quase ausente
do grande feito, intimamente convencido que a força anímica que traz consigo
não provém das suas mãos. A única Fé verdadeira, ao serviço dos outros,
desinteressada! A sua despedida, tão afectuosa quanto exigente para um homem de
armas: “Vai em Paz”.
         E a de Giési?... Protótipo de todos os
tempos, sibilino, devoto, coadjutor, simoníaco, máscara acabada dos que, à
sombra da religião, põem a sua fé  exclusiva no dinheiro, nas sacas de moedas de
ouro e de prata, no aumento do seu pecúlio, enfim, o receptador oculto  das promessas, as prendas que seriam pertença
do Senhor Iavé.   
          Mais depressa, porém,  veio a sentença fatal: “Estás rico, podes comprar
tudo. Já que ficaste com a riqueza de Naamã, vais ficar também com a lepra dele”.
E a partir daquele momento, o corpo de Giési cobriu-se de lepra até morrer.
         Esta é a Palavra de Deus  exarada, há milénios, no LIVRO, o II dos Reis,
capítulo 5 e em Lucas, capítulo 17, 11-19.
         Essa a Palavra de Deus, repito. Mas há
quem prefira a palavra dos homens. Para esses, nada a fazer. “Nem que viessem
Moisés e os Profetas a este mundo” – disse um dia Jesus de Nazaré.
Em
tempo: Informam os noticiários que hoje é o Dia Mundial da Educação Cristã. E
eu proponho que faça parte do Programa da Educação Cristã a versão completa do
Capítulo 5 do “II Livro dos Reis”. Digo isto, porque os liturgistas do
dicastério romano que acima referi, elidiram, obliteraram, amputaram,  apagaram (ou seja o que for) censuraram a
lição mais forte da narrativa. É pura desinformação contra a Educação a que o
povo tem direito.
09.Out.22
Martins Júnior        

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