Não
tem morada exclusiva nem há caminho único para lá chegarmos. É assim o
Pensamento, a Ideia motriz que move montanhas e agita oceanos.
Do
mesmo pano é o Pregoeiro da Ideia Viva. Não tem casa própria, nem tribuna
exclusiva, nem emissor demarcado. Ele consubstancia-se com a Ideia, com a Vida.
Vimo-lo, domingo passado, fazendo de uma lancha o púlpito do seu pregão à
multidão apinhada ao longo da praia do Lago de Tiberíades. Hoje, apresentou-se
na montanha diante de romeiros caminhantes que, famintos da Palavra, vieram de
várias regiões da Judeia, Jerusalém, Tiro e Sídon – um viveiro incontável de
corpos e almas arrastados pelo “sedutor” que viera lá dos lados de Nazaré.
E
aí, no sopé do monte, Ele abriu o LIVRO do Verbo feito carne. Promulgou aos
ventos e aos rochedos a Constituição de um Novo Reino, uma Nação Nova, um outro
modelo civilizacional, numa palavra, abriu a Revolução. Sem sombra de dúvida,
Revolução, porque só fora dos cânones estereotipados e guardados a peso de
algemas - o poder absoluto de então – é que
vingaria algum sucesso a Nova Constituição.
Consoante
o convite de cada fim-de-semana, proponho a leitura do texto de Lucas (6, 17-25)
em paralelo com Mateus (1,1-15), as duas versões da mesma Grande Tábua da Nova
Lei. A tradição, os hermeneutas, os poetas, sonhadores de um Mundo diverso,
visionários de um Mundo Melhor, debitaram-lhe a romântica designação de “Sermão
da Montanha” ou das “Bem-aventuranças”. Chamar-lhe-ia também Código da
Felicidade Global, ou o mapa circular de um outro planeta dentro daquele que
habitamos.
O
Nazareno depressa incarnou a irreversível motricidade do tempo. Não havia tempo
a perder. Em meia dúzia de normativos compendiou os horizontes da sua Revolução
pacífica, mas perturbadora, quase insustentável, porque contraditória aos
créditos oficiais. Com efeito, quem acreditaria num Reino onde os desvalores
formais da sociedade apresentavam-se como os valores fundacionais desse
movimento regenerador, em tudo opostos aos códigos elitistas: “Felizes
e Bem-aventurados os pobres, os deprimidos em pranto, os mal-vistos na opinião
pública, os perseguidos pelo regime, etc.?”.
As
interpretações supervenientes dadas, de forma empírica e distorcida, ao texto
das Bem-aventuranças têm ensombrado a beleza e a transparência da Nova
Constituição. Jesus de Nazaré, ao ‘promulgar’ a sua Lei Fundamental, impugnava
a avareza, a ganância, a exploração e a corrupção que são os vírus geradores da
pobreza e do pranto universal.
O
“Sermão da Montanha”, de tão sintético e, ao mesmo tempo, tão vasto, figura no
topo das mensagens bíblicas de todos os tempos e lugares. Ousarei dizer que se,
por trágica ocorrência, se perdessem todos os livros do Velho e Novo
Testamentos e só ficasse o texto das “Bem-aventuranças”, pois nada mais seria
preciso para instaurar o Novo Reino da Vida, aquela nova ponte, a que se dá o
nome de Religião, não apenas para o
século I da nossa era, mas para o século XXI e, daí, para todos os séculos
vindouros.
Transformando
o mundo, não basta sermos “Bem-aventurados”. É preciso sentirmo-nos “Felizes”!
13.Fev.22
Martins Júnior
Sem comentários:
Enviar um comentário