A quem hei-de comparar aquelas duas mãos
trémulas sobre um vulcão, impropriamente chamado ‘urna’, vestida de negro?... E a que distância ficam
uns dos outros, os parabéns, os choros, os traumas, os palanques, os
esconderijos, as ambições e os trampolins que sobre a caixa negra se acobertam
na ressaca das eleições – chamemos-lhe quarta-feira de cinzas de uma
terça-feira de carnaval?!...
Enquanto os avaros contadores de boletins
de voto apertam e salivam papéis com o mesmo afã como se fossem cheques
bancários ou créditos bitcoin, prefiro
olhar o frenesi comum às incontáveis reações ao histórico (todos lhe dizem
histórico, único, decisivo) domingo eleitoral. Aproximo-me da tenda-pipa do
velho Diógenes e peço~lhe a chama do seu olhar pontiagudo para penetrar em dois
patamares situados nos antípodas um do outro. E faço-o como quem procura
serenar os ânimos atribulados da derrota ou refrear os estertores cavalares da
vitória.
Olho, primeiro, a remota povoação de um
genuíno “Curral de Moinas” e nele revejo todos os demais que se espalham por
esse mundo fora. Lá estão derrubados a um canto os vencidos, o candidato ao
bairro, ao beco, à sarjeta. Parece que o vulcão de ‘La Palma’ lhes caíu em
cima. E agora, como vai ser isto?... Contam as espingardas, roem as unhas,
queimam as pestanas sem sono, ‘eles hão-de pagar-mas’ – tudo somado, o planeta
desabou.
Mas no mesmo dia, na velha Germânia e
talvez na mesma hora, o SPD, a CDU, os VERDES, não têm pressa de formar governo.
Com a fleuma que lhes corre nas veias, conhecem o peso que têm aos ombros, as
exigências de uma economia alemã na esfera europeia, os delicados problemas
diplomáticos com a Rússia, os Estados Unidos, a China. No entanto, apesar de
terem o mundo no seu encalce, mantêm a serenidade, aparentemente impassível,
perante os dilemas que os esperam.
Enquanto isso, em ‘Curral de Moinas’
discute-se a vereda, o poio, o tubo da varanda, o tacho pedido e agora perdido,
a cunha ao presidente, a lâmpada fundida , questões ‘prementes’ que muitas
vezes acabam em vias de facto e, contadas as ‘facadas nas costas’, as traições,
os fura-votos, seguem~se perigosas
guerras intestinas.
Bem
sei que são os administradores das fábricas partidárias, com a habitual ganância
empresarial, os autores incendiários das rixas e traumas em todos os “Currais
de Moinas”, inclusive os directórios instalados que fomentam neuroses
desmioladas até nas próprias cúpulas e são os mesmos que provocam depressões
nos mais frágeis da população,
Ai, quantas emoções, negaças e ameaças,
golpes baixos, mentiras e ilusões, promessas de compra e venda de consciência
têm corrido nos subterrâneos das mesa de voto, ainda mesmo antes que o eleitor
comum tenha lá chegado!...
Desdramatizemos essa passagem de nível - a
votação – porque ela é feita para alcançar dias e rumos mais saudáveis e não
para atirar pedras, cinzas e lavas na paisagem que é nossa. E também porque
atrás de uma vem outra passagem de nível para inverter a meteorologia política
em que deambulam sociedades e cidadão. “Há mar e mar...Há ir e voltar”!
27.Set.21
Martins
Júnior
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