São
para os directórios partidários as análises, os contornos e as consequências
dos actos eleitorais. E nisso andarão bem se tiverem a coragem (para os
perdedores) e a sensatez (para os ganhadores) de pegarem pelas raízes os
resultados das urnas, pendam eles para onde penderem.
Limito-me neste breve observatório à
visão concreta, direi telúrica e genuína, que terá levado alguém a deixar a sua
casa, o seu passeio, o seu cómodo para traçar aquela cruzinha mágica num papel
colorido que lhe cai nas mãos. Justamente por isso, porque a cruzinha tanto se
assemelha a um sinal de trânsito, a um GPS, como nalguns casos a uma arma para
derrubar tronos e erguer mausoléus! Sinal de trânsito ou GPS decisivos para a
livre circulação de uma sociedade inteira. Como partilhante dessa mesma
sociedade não posso ficar indiferente, muito menos inerte ao fenómeno pós-eleitoral.
Eis-me, pois, aqui para perscrutar as poderosas
motivações (cada eleitor tem o seu poder autónomo) das votações. E, como já
tudo passou, o tempo indicativo presente – ‘Por que votas… Por quem votas? –
transforma-se no pretérito passado: “Por que votaste?... Por quem votaste?”.
O assunto daria trama para um ‘fac-símile’
dos Diálogos de Platão ou os Apólogos Dialogais e
Relógios Falantes de D. Francisco Manuel de Melo, ou qualquer outro
discurso directo entre votantes. Certo, mas tudo quanto dissessem os personagens
em cena sintetizar-se-ia em dois polos distintos, duas motivações opostas, dois
vectores conflituantes, que passo a identificar:
De um lado, o votante comum (comum
porque ele pertence a todas as classes sociais) ou cidadão-caracol da couve
fechada, que só vê o seu mini-espaço e faz dele o epicentro do mundo: o seu
chão, o seu beco, o seu tubo de água, o terreiro do seu casebre. E o seu voto,
aquele GPS social que atinge toda a comunidade,, não tem mais tamanho que a
torneira, o terreiro, a vereda estreita. E é só por isso, que se desloca à
assembleia de voto.
Do
outro lado, o cidadão do mundo (seja a cidade, o município, a aldeia) aquele
cujo voto tem a dimensão de um enorme periscópio e que lhe faz ver o todo da cidade,
do município, da aldeia, a tal visão holística que tanta falta faz aos
programadores sócio-paisagísticos.
Enquanto
para o primeiro conta apenas a visão egoísta, oportunista, auto-utilitária do
voto, para o segundo outros valores mais largos e mais altos se levantam,
torna-se altruísta, expansivo e generoso. Para o primeiro, o cidadão-caracol, “não votei no partido X, porque não me
acrescentaram o beco ou a vereda. Eram só dois metros”. Para o segundo, “não me deram nada, mas votei nele, porque o
presidente deu prioridade a um problema que era de todos nós”.
Enquanto
continuar a medrar no terro das nossas sociedades o joio da raça-cidadão
caracol, teremos sempre titulares medíocres, egoístas, oportunistas a dirigir o
povo, sabendo-se que ‘um fraco rei faz fraca
a forte gente’, já vaticinara Luis Vaz de Camões, desde há quinhentos anos.
O
calculista votante-caracol das chamadas ‘élites’ quer mais, muito mais: o
emprego ‘pró-menino e prá-menina’, o apoio e a benesse para a firma, o
cheque-em-branco polivalente nas horas. Quanta podridão me enoja em certas
maiorias esmagadoras!!!
Parafraseando o velho ditado, ajuntarei:
“Diz-me por que votas e eu dir-te-ei quem és”!
29.Set.21
Martins Júnior
Parabéns.....Bem dito, e sempre bem escrito pelo Mestre da Palavra..... Mas, qual seria a solução? (mostrou as falhas, agora mostre o caminho!)
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