quarta-feira, 27 de novembro de 2019

UM FESTIVAL QUE FICA! PARABÉNS!


                                                      

É a vantagem deste fluxo e refluxo dos “Dias Ímpares”: a oportunidade que se nos oferece de descobrir a beleza escondida por entre as raízes rasteiras que produzem as altas e copadas árvores.  É este o saboroso fruto que saboreamos quando o nosso olhar se demora naquilo que parecendo vulgar assume, afinal, o fulgor dos grandes feitos.
Aconteceu no último fim-de-semana, nas oitavas da festa da patrona oficial da Música, a famosa e nobre de Roma, Santa Cecília. E aconteceu aqui entre nós, no Palácio da Arte dos Deuses, o Teatro Baltazar Dias. Foi a coroa real de um império, cujo poder só produz paz, abraços entre povos e nações, apetências incomensuráveis em que a própria libido se enlaça em asas de prazer e sublimidade. É essa a saudável romã que a árvore da Música oferece em dádiva aos caminhantes do trivial quotidiano. E quando tudo acontece e nasce de mãos polícromas, variegadas, universais no tempo e no espaço – todas iguais e todas diferentes – então chegámos ao novo Éden, outrora perdido e agora reconquistado.
Apetecer-me-ia continuar a discorrer na macia planura da poesia, mas detenho-me para dizer ao que venho. É meu desejo e meu dever desentranhar do palco do Teatro, transportar para toda a cidade e toda a ilha o que foi e o que significou o IV Festival Internacional de Bandolim no Funchal. Talvez se não tenha ainda descoberto o monumento global que significa este magno evento. Magno, não tanto pela estrutura do espectáculo e pelo pesado esforço da sua organização, mas precisamente pela corrente mágica que o segura e lhe dá energia. Quem olhar  “com olhos de ver” a génese deste encontro há-de constatar com espanto e encantamento que ele não nasceu no sumptuoso palco do poeta cego da cidade, o também dramaturgo Baltazar Dias. Não, este encontro ou festival vem de mais longe, melhor dito, vem de mais perto. O palco é apenas uma ponte de passagem para alcançar novos horizontes. Explico: o Festival de Bandolim nasce das mãos do Povo, gente como nós, do meio rural e do meio urbano, do chão das aldeias, dos bancos das escolas, das casas do povo, das humildes  associações de base popular, até atingir o primor das academias superiores. Os executantes, na grande maioria, são fruto do empenho de líderes naturais, tocados pela magia da arte, que no silêncio de tardes e noites, tiradas ao lazer de mestres e alunos, se entregaram apaixonadamente à teoria do solfejo, ao manuseamento paulatino do instrumento, enfim, à persistência inquebrável de ler e assimilar as obras do Grandes Génios da composição musical.
Quer isto dizer que, muito antes de subirem ao palco, os executantes madeirenses trouxeram consigo toda a riqueza e toda a beleza do Festival, fabricaram-nas desde casa. Passar pelo palco foi como vestir o fato domingueiro para, no dia seguinte, voltar à oficina de trabalho, isto é, ao estudo do solfejo, à interpretação das partituras, enfim, à autêntica cultura de raiz. E é aqui reside toda a importância ( e toda a atenção às entidades oficiais) no sentido de entenderem que este encontro não se assemelha a um estampido de fogo de artifício que tão depressa lampeja no palco como depressa se esfuma e vai para fora da barra. Acontece com muitos e campanudos Festivais. Mas este espectáculo é diferente: nasce cá e continua cá, merecendo daí toda a carinho e apoio dos responsáveis pela cultura regional e local.
Voltando à estrutura do Programa, os seus organizadores intuíram na perfeição os objectivos primordiais do Festival: trazer ao palco, dar a conhecer ao grande público a ciência e a arte que gente nossa, sobretudo jovens e adolescentes, têm construído na penumbra silenciosa do quotidiano. E, como finis coronat opus (o fim coroa a obra) ou a ‘cereja em cima do bolo’, apresentar exemplares internacionais, sobretudo os genuínos músicos italianos na arte do Bandolim, afim de constituírem o protótipo e um estímulo maior no ânimo de todos os nossos artistas e aspirantes aos cordofones clássicos.
A “TCM-Tuna de Câmara de Machico”, da responsabilidade do CCCS-RS (Centro Cívico-Cultural e Social da Ribeira Seca), saúda a iniciativa, agradece o convite que lhe foi endereçado  e apresenta a melhor disponibilidade em futuras edições.
Uma palavra final que perpassa, do princípio ao fim, neste escrito, como o “genérico” que atravessa todo o texto: o reconhecimento às duas almas (porque com alma e amor é que isto se faz) que foram os obreiros deste “Grande Concerto” – Norberto Cruz e Lidiane Duailibi. Sem eles nada disto aconteceria. Por experiência própria, avalio e ergo bem alto, em tom maior, o seu esforço, dedicação, ‘dores de cabeça’ e sobressaltos diurnos e nocturnos, para que tudo corresse bem e se resolvesse  no magnífico sucesso que se viu. Valeu a pena!
E… “Da Capo”: Começar de novo o próximo Festival!

27.Nov.19

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