Centenas,
milhões, biliões foram esperá-lo, mesmo sem saber de que mar ou de que monte viria
o Desejado, o Venturoso, o “Pai Natal” dos graúdos. Sim, dos graúdos. Porque, assim como os
adultos iludem os miúdos com a expectativa do “Pai Natal” que vai chegar
carregado de prendas infantis, assim os graúdos iludem-se a si próprios com o
anúncio do Ano Novo abarrotado de espumantes, passas e balonas de fazer voar portas e corações. A avaliar
pela euforia consumista, são os bobos adultos
que fazem mais fé no “Fantasma” Ano Novo do que as crianças no “Pai
Natal”.
“Nomes
com que se o povo néscio engana”! – diria Camões. Porque o Ano Novo não existe.
Os homens é que esventraram o tempo, dissecaram-no, retalharam-no às postas,
aos lenhos, à fatias e às migalhas. E chamaram-lhes milénios, séculos, décadas,
lustros, anos, meses, dias, horas, minutos, segundos. Mas o tempo, no seu cerne
ontológico, é um corpo inteiro e único, indivisível, linha contínua e não
tracejada, rio ou levada, onde navegamos sem nos darmos por isso. Bem analisado
em si mesmo, aquilo a que chamamos passagem de 2019 para 2020, afinal, não
existe. O último segundo de 2019 é o primeiro de 2020, de tal forma que nem se
pode falar de uma ponte entre um e outro. Os dois estão justapostos, são
degraus siameses perfeitos debaixo dos nossos pés.
Neste
entendimento, se Fernando Pessoa tivesse oportunidade de escutar os votos e
saudações que mutuamente nos desejamos – “Que
o Ano Novo te traga sucesso… No Ano Novo as coisas vão mudar… No Ano Novo é que
vai ser… À meia-noite, vamos comer as doze passas da sorte” e outras do mesmo teor – ele, Fernando
Pessoa, não hesitaria em atribuir-lhes o mesmo desqualificativo das “cartas de
amor”: ridículas.
Ridículos
esses votos e saudações, porque não deverá ser o tempo (cronológico) a dominar-nos, mas nós a
tomarmos conta do tempo. O tempo, depois da saúde, é o nosso melhor activo, o
nosso capital em caixa. Somos nós o seu senhorio e o seu contabilista. E se o
tempo é dinheiro, como usa dizer-se, então nós somos o seu ministro das finanças.
Na esteira do grande filósofos Protágoras, para quem “O Homem é a medida de
todas as coisas”, devemos afirmar e assumir com a mesma força semântica que o
Homem é a medida do Tempo.
Fundamentos
estes suficientes para segurarmos em nossas mãos as rédeas do tempo futuro,
desde já o chamado 2020, ao qual prefiro numerar como o meu 2019-A, o meu 2018-B, o meu 2017- C… e assim sucessivamente, visto que não há
nenhum hiato entre eles. A história do indivíduo e das comunidades é (ou
deveria ser) um movimento contínuo, sem fundos
abissais nem passagens de nível, um
projecto em construção, sempre retomado e sempre inacabado.
Quando
deixaremos nós de desassossegar espíritos e endossar a seres extra-terrestres funções
e papéis que são estrictamente nossos, da nossa inteira responsabilidade?...
Esta
saudação-tributo a todos quantos me enviaram mensagens de Natal e Ano Novo,
apraz-me terminá-la da mesma forma como o fiz no ano transacto. Tal como John
Kennedy afirmara em Dia de Ano Novo – “Não perguntes o que é que a América pode
fazer por ti. Pergunta, antes: o que é que tu podes fazer pela América, que é o
teu país”. Assim também, não esperes nem peças a 2020 o que pode fazer por ti.
Pergunta a ti próprio o que é tu podes dar ou fazer para o sucesso de 2020!
31.Dez.19 e 01.Jan.20
Martins Júnior
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