As palavras caem-me ao chão
Como as armas das mãos dos condenados a
matar
Como os corpos às postas sepultos sem
caixão
Caem-me os braços o tronco o coração
Só dos olhos não me larga
Aquela berliet medonha carga
De cunhetes munições petardos
Onde inscreveram o meu nome
Também o meu nome
A um povo indefeso morto de fome
Em vez de pão
Levámos-lhe um natal português
Menino branco na ponta da G3
Hoje as mesma balas as catanas
Pintadas de Mafoma e de Corão
E um mesmo povo mártir carne pra canhão
Cabo
Delgado Cabo
Vala de Deus paiol do diabo
Onde deixei os cajueiros e as virgens
florestas
A mandioca em cima do braseiro
E as gentes correndo em debandada
Delgado arbusto de esperança
Embondeiro de saudade e de vergonha
Pedra dura onde a cabeça não descansa
E do terror antigo ainda cora e toda a
noite sonha
Hoje as palavras caem-me ao chão…
19.Nov.20
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