No
hiper-mercado do Natal, há bancas para todos os gostos, todas elas esmaltadas, engrinaldadas, super-estonteantes
de volutas néon e lantejoulas pré-réveillon, adequadas como
fatos-à-medida de cada cliente carente de hipnose efémera ou de alienação catártica.
Todos têm direito a optar. Da minha parte, viajo ainda nas ondas do Mar Vermelho-Negro
da vida e morte do Grande Líder sócio-evangélico da África do Sul.
Ficaria
claudicado – e, mais que isso, seria de uma tremenda injustiça – o comentário
final do último texto aqui reproduzido, tendo como pano de fundo o merecido
preito de homenagem e gratidão ao Arcebispo anglicano Desmond Tutu, por ocasião
da sua morte em 26 de Dezembrop.p..
Numa
abstração-síntese da realidade, coloquei lado a lado quatro efígies ou modelos
de Cristos, supostamente representativos daquela Criança atirada para um
estábulo de animais, nas campinas de Belém. São eles: o Cristo Anglicano, Sul-Africano
(protótipo de Desmond Tutu), o Cristo Romano e o Cristo Insulano, o da Ilha
nossa, o Cristo regional, cada qual com a dimensão e a caracterização daqueles
que se dizem seus representantes ou procuradores na terra.
Cheguei
à conclusão (e mantenho-a) da ficção falaciosa que tem sido arvorada no “Capitólio
Vaticano”, ao longo dos séculos, aliado dos poderosos e fautores dos
colonialismos europeus face a outros continentes, sob o signo da missionação. A
leonina legislação do malfadado “Padroado Português” foi bem o cutelo de morte
de uma Igreja que, em vez de proteger os indígenas indefesos, pôs-se muda e
comparsa ao serviço do Império Colonial, obrigando – cúmulo da
desenvangelização! - os padres-capelães a alistar-se no Exército perseguidor e
destruidor dos pobres africanos, desde 1961 a 1974. Também me coube essa
vergonhosa desdita…
No
entanto, cumpre-me fazer justiça e enaltecer a plêiade de bispos e padres que
cumpriram, com dor e paixão, o mandato do Nazareno, quer em África, quer no
Brasil, quer em Portugal. Recordo Sebastião Soares de Resende, na Beira, Manuel
Vieira Pinto, em Nampula, dois homens na mira do regime salazarista. Manuel
Vieira Pinto, idolatrado pela população moçambicana, foi expulso da sua
diocese, antes de 1974, e só lá voltou após a independência de Moçambique, a
pedido do presidente Samora Machel.
No Brasil, eminentes vultos da Igreja (quase
sempre olhados com desconfiança pelo Vaticano) deram corpo e alma pelas justas causas
do povo, arrostando com perseguições, calúnias e prisões. Cito António Fragoso,
do Nordeste, e aqueles que conheci pessoalmente: o bispo Calheiros, de Volta
Redonda, a quem o governo da ditadura militar instaurou três processos judiciais.
Em Olinda e Recife, ouvi eu da boca desse “Novo Paulo Apóstolo”, Hélder da Câmara, desafiar
o mesmo governo, em 1972, perante uma numerosa multidão que comemorava o “7 de
Setembro”, Dia da Independência: “O governo diz que sou contra o progresso do Brasil,
mas está enganado. Nós queremos o progresso do Brasil, mas nesta condição: Um
Brasil pelos brasileiros, com os brasileiros e para os brasileiros”.
Poderia
trazer à colação muitas outras figuras heróicas na defesa dos Direitos Humanos,
tal como fez Desmond Tutu. Em Portugal cito, por todos, o bispo António
Ferreira Gomes, do Porto, expulso de Portugal por ordem de Salazar, pelo facto
de, em Carta Aberta, ter tomado a defesa dos camponeses da sua diocese. Só lá
voltou após o 25 de Abril de 1974.
Gente
firme e valorosa que obedeceu à Palavra do Jesus de Belém e não à Igreja dos
homens, na esteira de Pedro e João diante do Sinédrio da religião judaica.
Gente de “Um só Rosto e de uma só Fé”, mas que só encontrou indiferença e
condenação por parte do “Capitólio Vaticano”!
Estes
homens – e mulheres, também as houve – ultrapassam a Instituição e nada têm a
ver com a duplicidade contraditória e a hipocrisia diplomática de que são
formatados os núncios apostólicos, embaixadores de Roma. É outro o seu
percurso, reflexo da Criança-protagonista do Natal, Aquele que um dia deu aos
seus colaboradores este princípio constitucional: “Que a vossa linguagem seja
esta: Sim, Sim – Não, Não”!
Ou
como afirmou um dia, de forma lapidar, Desmond Tutu: “Quando você diz que é
neutro em relação a uma injustiça ou a uma opressão, isso quer dizer que você
já decidiu estar do lado do opressor”!
E
eu permito-me interpelar os Códigos da (in)Civilidade político-social: Quando
está em causa a luta entre a Justiça e a
injustiça, por que razão só entram nela as vítimas, os sindicatos, as
organizações laicas?... Não deverá a Igreja perfilar-se na linha da frente?...
Oiçam Francisco Papa!... Façamos Natal, o verdadeiro Natal!
29.Dez.21
Martins Júnior
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