quinta-feira, 29 de agosto de 2019

COM O FOGO NÃO SE BRINCA… MAS COM O FOGO TAMBÉM SE FALA E SE SENTE!


                                                          

      Em tempo de lazer não há tempo para  habitar o tempo lunar do pensamento crítico. É tudo tão volátil, tudo empírico e descartável, tudo líquido, como classificava Zigmunt Baum a sociedade hodierna. Por isso, escolhi o óbvio – volátil, empírico e descartável – para o nosso entretenimento de hoje: o fogo. Não se trata de “brincar” com o fogo”, mas de vê-lo, ouvi-lo, falar-lhe e senti-lo.
Incontáveis são as marcas, os rótulos e variedades de fogo.
Há o fogo que aquece, alumia e constrói. E há-o, que arrasa cordilheiras, esgana casas e pessoas, pulveriza civilizações.
Há o fogo que abre clareiras no impenetrável negrume da floresta. E há-o, que carboniza o chão virgem que espera os nossos passos.
Há o fogo romântico na mesa redonda de um dia de namorados. E há-o, soturno, mortiço, no velório do finado da véspera.  
         Há o fogo feito de suor e sangue doado  em dádiva gratuita à terra, à história e memória de alguém. E há-o transacionável, moeda de troca por uma benesse vencida ou vincenda.
Há o fogo crepitante, vistoso, que desafia as altas nuvens. E também há-o,  o “amor-fogo, aquele “que arde sem se ver”, o de Luís Vaz de Camões, de Petrarca, dos verdadeiros amantes.
O tamanho das chamas só se o mede pela conta de bem ou de mal que espalham à sua volta. E a cor do fogo só a vê o nosso olhar-mente e coração. Assim, há o fogo que canta e o que chora estalando entre a rocha viva, Há o  fogo-obra de arte e o fogo bruto e brutal. Há o fogo puro, imaculado, sem mescla e há o fogo egoísta, utilitário, “dou-te se me deres”. Há o fogo que dobra círios e almas, mas há um outro que liberta e dá asas. Finalmente, há o tal fogo forte mas discreto, intimista mas purificante, em que os protagonistas ‘incendiários’, portadores da luz, diluem-se como sombras fugazes por entre as chamas. E há, nos antípodas,  os ostensivos e ostensórios ‘lucíforos’ que até se perfilam como os fariseus emproados no templo de Jerusalém.
Aí fica um breve mostruário dos fogos que povoam o mundo, o nosso pequeno mundo também. Cada qual poderá catalogar o seu ou os seus fogos,  que todos os dias deflagram, perto ou longe. A questão, porém, quase adivinha, que propus anteriormente cingia-se ao seguinte dilema: entre os dois fogos que fazem de Machico notícia e visita obrigatória – a Noite dos Fachos e a “Noite dos Milagres” - qual deles é o mais puro, generoso, altruísta e transcendente?    
     Deixo a questão em aberto. A palavra, livremente expressa ou assumidamente lavrada, a vós pertence. E todas, sem excepção, serão respostas credíveis e respeitáveis, porque sinceras.

29.Ago.19
Martins Júnior

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