Não
fora a nota de um dos meus companheiros de jornada pelas rotas dos ‘dias
ímpares’, nem eu voltaria às Sete
Maravilhas, até porque já encerrou o concurso regional e, para lá dele,
pouco pesa na balança do planeta um ligeiro episódio localizado, como é o dito
certame.
Eis
a observação que motivou este meu arrazoado:
Quanto
à primazia dos Fachos – “pode até ser verdade..... mas não é parte diária da
vida popular.....enquanto o bailinho e o bordado estão entranhados localmente e
por esse mundo além...Vi no Navio-Escola Sagres uma toalha bordada durante sua
estadia no porto de Santos, Brasil.... e a aglomeração de pessoas à volta
daquele tesouro era sinal da admiração etérea pela arte das mulheres da nossa
terra... e o bailhinho então... faz parte de muitas pessoas por cá”...
Nada
mais correcto e sensato! Por isso, subscrevo por inteiro as conclusões que
emergem das linhas e das entrelinhas do criterioso observador. Aliás, vêm
confirmar o que explanei no penúltimo blog
relativamente às premissas que devem fundamentar as nossas opções, sejam estas
em versão minimalista, sejam sobretudo numa paisagem-macro sobre questões da
máxima transcendência filosófica ou sociológica. E é, ainda por isto, que volto
ao caso. Porque quem faz um voto empenha nele a sua personalidade totalizante.
Recapitulando,
nesta versão-mini, começaria por Sebastião da Gama: “O poeta em tudo se demora”. Parto da convicção de que, diante das Sete Maravilhas candidatas, somos todos
poetas, porque o seu objecto ou paisagem maravilhosa
não têm outra veste que não seja a
Poesia, na sua expressão factual, concreta, manufacturada. Essa, pois, a
razão que levar-me-ia a votar em todas as Sete.
No
entanto a realidade, por mais objectiva que seja, não é unívoca, mas aberta,
como já Umberto Eco nos prevenira. Depende também do Observatório e da posição
em que o colocamos. Recordo, quando no curso de filosofia, aquela corrente de
pensamento, denominada “interpretacionismo”, em virtude da qual a cor não está
no objecto exterior mas nos olhos que a contemplam. A cor e, com ela, a beleza
ou a fealdade, o valor ou desvalor, a estreiteza ou a amplitude do objecto,
estão mais nas pupilas do espectador do que na realidade contemplada. Quando se
fala em pupilas referimo-nos à sensibilidade do sujeito perante o objecto, o
seu estado neuro-vegetativo, a sua ‘circunstância’, a sua preparação a
montante, enfim, a sua personalidade. Todos vêem o mesmo, mas não captam o
mesmo.
Não
recorro a casos exemplares, porque a nossa vivência quotidiana prova-o suficientemente. Esta diversidade
interpretativa dentro da unidade objectiva, resumo-a em Fernando Pessoa, (ele,
o multiplicador de heterónimos) naquele seu axioma poético, bem conhecido: “O binómio de Newton é tão belo como a Vénus
de Milo. O que há é pouca gente que dê por isso”. Paradoxal: uma equação
matemática – tão estética e deliciosa como a escultura de uma bela mulher!
Mas
é isso mesmo: Para o decorador florista, amante das orquídeas e das
estrelícias, não há sinfonia mais bela que os Tapetes… Contrariamente, aos romeiros festivaleiros, sobretudo se
emigrantes, ninguém lhes tire o Bailhinho
que amacia o espinho da saudade, mesmo sem saber que a canção do ‘Feiticeiro da
Calheta’ não tem mais que 82 anos… As
crianças azougadiças e os idosos de coração infantil lembrando os gostosos tabuleiros
dos arraiais de outrora, deliciar-se-ão com as Bonecas de massa… E quem entre nós, madeirenses, atraídos como
pássaros pelas luzinhas do presépio e pelo cheiro dos bolos-de-mel, qual de nós
recusaria o voto à Noite do Mercado?...
Os estudiosos da ruralidade, antropólogos dos usos e costumes das populações
primitivas, acharão nas Casas de Colmo um
precioso filão exploratório e só isso lhes interessa pra valorizar a historiografia
madeirense… E então o Bordado Madeira,
quem lhe resiste? Nem seria preciso um sofisticado curso de Designer para cairmos rendidos à sua beleza. No topo
dos cultores da arte, especialmente os apreciadores da feminilidade e do seu
encanto artístico (chamem-lhe glamour,
charme ou similares) levantam-lhe
um trono, estendem-no à mesa real ou a bordo do Navio-Escola ‘Sagres’ ou, mais
alto, sobem às sagradas aras.. As “Lágrimas Correndo Mundo”, em todo o tempo e
em todos os lugares, cativariam almas e
gerações.
Mas
há outros olhares e sensibilidades, iguais a tantas, mas diferentes na tonalidade
interpretativa: os que aliam a ancestralidade histórica à catarse colectiva de
um povo, ao longo de 600 anos. Além da mística iluminante de todo o vale, releva-se
o esforço braçal, a afirmação musculada de jovens e adultos que, com as próprias
mãos enegrecidas pelo óleo e pelo fumo, repõem no basalto da montanha o vigor de antanho.
Esses optaram pel’Os Fachos.
Todas
Diferentes e Todas Iguais! Assim são as Sete Maravilhas. O resto depende dos
olhos que as vêem. E do móbil que as transporta: a arte, a história, a
especiosidade, o esforço, a resiliência hereditária – ou o efeito imediatista,
o reclame publicitário, o consumismo, numa palavra o marketing estandardizado?!
Em
consonância com a síntese do observador que motivou esta reflexão – e que
registo com aprazimento – reitero o pensamento já aqui citado noutras
circunstâncias: “É tão belo e é tão nobre descascar batatas como construir
catedrais”. Tudo é belo! Tudo é nobre!
17.Jul.20
Martins Júnior
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