segunda-feira, 5 de abril de 2021

DIAS E NOITES DE PÁSCOAS ANTI-PÁSCOA

                                                                            


           Suicídio ou Assassinato – tudo acabou (ou recomeçou) na manhã de Domingo. E se me ocupei durante as últimas duas semanas sobre o caso, sempre em aberto, impõe-se agora que acompanhe também o seu epílogo. Se não com o mesmo olhar atento e crítico, ao menos com a ajuda de quem, antes de nós, se debruçou sobre tão assombroso quanto enigmático acontecimento

         Tertuliano, talentoso escritor cristão do século II, acerca da Ressurreição afirma: “Creio porque é absurdo”! Por seu lado, o eminente biblista português Padre Carreira das Neves, após descrever as tendências ressurrecionais post-mortem, na ideologia dos fariseus e afins, remata dizendo: “As testemunhas da Ressurreição não viram um homem com as dimensões físicas do homem da Galileia e de Jerusalém”. Leonardo Boff situa-se no tempo e diz que “a Ressurreição  significou o protesto contra a justiça judaica e contra o direito romano pelos quais Jesus foi condenado”.  E James Dunn: “A Ressurreição de Jesus não é tanto um critério de fé como um paradigma da esperança”.

         Da variegada literatura nascida do túmulo vazio, sobretudo os escritos dos séculos II e III, relevo apenas duas conclusões que proponho à consideração de quem me acompanha:

         - Não é a Ressurreição vitoriosa de Jesus que mais me motiva e arrasta ao seu encontro, mas sim o seu testemunho de vida.  Mesmo que Ele não tivesse ressuscitado, a integridade, a coragem, a transparência dos seus actos continuariam a impor-se aos séculos futuros. Tantos e tantas homens e mulheres, mártires das grandes causas, não tiveram o privilégio do Nazareno  Ressuscitado, mas ainda hoje continua vivo e mobilizador o  rasto que nos deixaram!

         - Enquanto não houver Páscoa no Mundo, verifico que foi vã, inútil, a Páscoa de Jesus. Esclareço: Jesus é o único Ser que menos precisa da Manhã Pascal. Ele não morre. Nele, nunca tem ocaso o Sol da Páscoa, desde antes e até ao fim dos tempos. Ele nem precisa de vitórias pessoais, pois que nem sequer se exibiu às grandes multidões que costumavam acompanhá-lo, nem mesmo desfilou triunfante diante do Templo dos Sumos Sacerdotes ou do Palácio de Pilatos. A sua Vitória é o Legado que nos deixa. Não é para Ele, é para nós, para o Mundo. De tudo o que ele fez e conquistou em vida, nada reservou para si. “Não tinha uma pedra onde reclinar a cabeça”, desabafou abertamente.  Foi tudo para os outros. Particularmente, o Pão e o Vinho  da Eucaristia, na Ceia de Quinta-Feira.

         E a bandeira da Vitória de Páscoa é a grande dádiva entregue a todo o Planeta: “Vai, faz o mesmo, ressuscita… Não te canses nem me marteles tanto com esses Alleluias formais… Tu é que serás o Alleluia real que tanto anseio”!...

         Diante dos cenários entremeados de sombras, tiros, lágrimas e sangue que, todos os dias e todas as noites, contemplam os nossos olhos impotentes,  é caso para dizer que foi vã a Páscoa de Jesus. Arrancar as rugas de um rosto triste e transformá-las num sorriso, ainda que sofrido e breve – é isso a Páscoa de Jesus.

         Pensando nesse angustiante e angustiado Cabo Delgado, onde muito se cultua o Islão, aproximo o pensamento de Maomé: “Levar a alegria nem que seja a só um coração é melhor que construir mil altares”. Melhor, mais belo e pascal  que cantar Alleluias mil!

 

         05.Abr.21

Martins Júnior                                

                                                                                                                          

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