Não
serei o único, neste país, a fechar os olhos e os ouvidos a um acontecimento
que, desde há cem anos, ganhou foros de cartaz nacional e, em tempos de Estado
Novo, chegou a cognominar-se de patriótico.
É
o 13 de Outubro! O ápice, o clímax, a apoteose!
Passarei
ao largo das margens e dos muitos afluentes
que este ano (não) correram para a
azinheira transformada em monumento de betão e cal branca. Apenas um traço
geométrico – estranha quadratura do círculo! – em que os extremos se tocam.
São semelháveis, siameses, ao menos na coreografia simétrica de passos e
gestos. A este propósito, recolho aqui a opinião de um conhecido e atento observador dos vida social
aquando da agitação publicitária acerca de uma determinada festa vermelha,
também ícone nacional e ‘patriótico’. Dizia assim: “Só há duas organizações
exemplares na preparação e condução de eventos-ajuntamentos na praça pública: a
Igreja e o Partido Comunista”.
E
viu-se. Na realidade, o “13 de Outubro” foi impecável em Fátima, tal como o “Avante”
também no chão da Atalaia: ordem, afastamento (com marcação prévia no terreno),
asseio, programação. Tão diferentes e tão iguais. Iguais por fora, diferentes
por dentro. Digam lá, sábios da
Escritura, que segredos são estes da natura.
Semelhanças
e dissemelhanças à parte, vou ao cerne da questão, esta mais séria, mais aguda,
até porque quem no-la trouxe foi mestre “Covid”, aquele tanto mata o corpo como
purifica o espírito de todo o ser pensante que se abra à sua enigmática
mensagem.
Paradoxalmente,
o “Covid” apresenta-se também como ventilador implacável das ideias gastas, das
praxes contaminadas pela naftalina da opacidade mental. Ele pode vestir o
camuflado do agitador público que devassa labirintos obscuros, arrasa raízes daninhas,
destrói monstros de negra espuma e, em seu lugar, abre pistas seguras, planta
vinhas suculentas e ergue referenciais de luz na espessura dos amanhãs onde
possamos respirar e viver em plenitude.
Tudo
isto passou na planície do “13 de Outubro”.
O “Covid” marcou presença – tão impressiva e eloquente quanto a ausência
das multidões! Do lado de dentro, as seis mil pessoas da estatística oficial.
Do lado de fora, as dezenas, centenas de milhares que todos anos se
acotovelavam no grande palco.
Feito
o balanço/apreciação das duas ‘turmas’ em jogo, pergunta-se: Quem ganhou e Quem
perdeu?... O observador de bancada, que
olha e não vê, responderá pronto, assim no bom estilo português: “Ganharam os
seis mil que agarraram lugar na praça”.
Pois,
que direis vós – pergunto eu agora – das dezenas e centenas de milhares que lá
não foram? Perderam?... Mas perderam o quê?... O espectáculo, a emoção
colectiva, o passeio turístico?!
Com
poucas palavras, ousarei entrar no debate para ver (ou, ao menos, desejar) a
vitória dos que não estiveram lá. O “Covid” terá destruído o espectáculo,
contido a emoção colectiva, estragado o passeio turístico. Em vez disso, porém,
terá reposto na essencial centralidade do pensamento (chamem-lhe Fé, homenagem,
simpatia ou o que quiserem) dos ausentes faltosos uma pergunta fatal: “Que é
que teria eu lá encontrar que não possa achar e construir dentro de mim?”.
Porque
a questão é vasta - e vastíssimas as respostas - recolho-me apenas na imponente
declaração que Jesus de Nazaré fez à mulher Samaritana “Os verdadeiros
adoradores do Me Pai são os que O adoram em espírito e verdade”. E sem tempo de
respirar, atira-lhe com esta ‘tremenda’ proclamação: “Por isso, Eu te garanto, mulher,
que está chegando a hora em que nem neste monte da Samaria nem no Templo de
Jerusalém adorareis o Deus Verdadeiro”. (Jo.4, 21,23).
Terá chegado mesmo essa hora?... Ou não
chegará nunca?...
“Quem tem ouvidos de entender, que entenda”! (Mt.11,15).
13.Out.20
Martins Júnior
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