Em
véspera e dia contraditórios, entre ficar em casa e sair para votar, cai-nos
nas mãos o Livro da civilização judaica, o manual didáctico que moldou a nossa, a chamada civilização cristã
e ocidental. Trago-o hoje ao nosso convívio porque (é caso para dizer: “Nem de
Propósito”) ele fala-nos dos ancestrais antepassados dos confinamentos em que
os sucessivos inquilinos do planeta se têm deixado enredar. Limpo de notas de
rodapé ou de comentários avulsos, transcrevo apenas o relato bíblico de Jonas,
o Profeta insubmisso.
Coube-lhe na sina ajudar uma grande
cidade a libertar-se da degradação e da ruína total. Nínive entrara num estado
de depauperamento ético-social, de risco
extremo, diríamos hoje. A mentalidade corrupta e as práxis comportamentais dos ninivitas atingiram
tal cúmulo que Jahveh (era o dogma do regime teocrático) ameaçou-os de morte,
de alto a baixo. Surgiu então Jonas, enviado a-contragosto à cidade – Mais quarenta
dias, esta cidade será destruída – e convenceu os habitantes a mudar de
vida.(Jon.3,1 sgs):
Os
homens de Nínive acreditaram e proclamaram um jejum e vestiram-se de saco, do maior
ao mais pequeno… O rei levantou- do seu trono, despiu-se das suas vestes, cobriu-se
de saco e assentou-se sobre a cinza. E promulgou este decreto: Nem homens, nem animais,
nem bois, nem ovelhas provem coisa alguma, nem se lhes dê pasto, nem bebam
água.
Todos
os ninivitas abandonaram o seu mau caminho e a violência que havia nas suas
mãos.
A ‘novela’ vetero-testamentária inclui
terminologia, conceitos e topónimos avocados ao tempo e ao lugar: Há quase 3000
anos. Fica no entanto, o essencial, que consistiu na alteração radical de estilos e hábitos
sociais, até ao mais sofisticado e humilhante formulário: na alimentação, no
vestuário, no isolamento (cinzas), enfim, um sobressalto cívico, um corte
implacável nos usos e costumes de toda a
sociedade, de alto a baixo, a começar pelos paços reais.
Foi
o férreo confinamento – a cidade parou! - que devolveu a saúde pública e a normalidade
aos habitantes de Nínive.
***
“Nem
de propósito”, repito.
É
que nos textos deste mesmo fim-de-semana, propõe-se-nos um código de conduta
que parece talhado à medida dos tempos que correm. Passou-se há 2000 anos. E é
Paulo de Tarso quem assume a tribuna de ‘legislador’, numa Carta dirigida aos habitantes
da cidade de Corinto (I, 7,29-31):
O que tenho a dizer-vos
é que o tempo é breve.
Doravante,
os que têm esposas procedam como se
as não tivessem
os que compram, como se não
possuíssem;
os que utilizam este mundo, como se
realmente não o utilizassem.
De facto, o cenário deste mundo é
passageiro.
Em forma de conclusão e sem mais
considerandos:
Estará escrito, ou nas estrelas ou no
chão da história, que o Homem – relapso compulsivo! – ficou desde sempre condenado
a pagar tributo severo à Vida, numa inexorável catarse ciclicamente
repetida?...
23.Jan.21
Martins Júnior
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