Meio
milhão de anos foram necessários para que a mesma palavra perdesse a cor e o
sentido! “Escândalo” é o vocábulo. E o seu conteúdo semântico.
O
Leão do século XVI seria hoje o escândalo insuportável aos olhos do mundo. E o
Francisco do século XXI teria sido há
500 anos a vergonha e o escárnio universais.
Quem
é esse Leão da fábula incarnada na história dos homens?
Filho
da nobilíssima família dos Médici, Giovanni de seu nome, estava predestinado à
mais cobiçada coroa europeia, a magnificente tiara do Vaticano. Aos 13 anos já
era cardeal de Roma, fruto das manobras, por vezes mesquinhas, da corte pontifícia e da nobreza
romana, como de resto sempre foram atribuídos os barretes cardinalícios. Dizem
os seus biógrafos que, tendo optado pelo cognome de Papa Leão, (O Décimo), com apenas 38 anos de idade, “no
dia da coroação,11 de Março de 1513, Roma assistiu à maior festa alguma vez vista desde os tempos
do Imperador Nero”. Amante do luxo e das caçadas, “possuía uma fabulosa coleção
de animais exóticos que incluía leões, camaleões, papagaios e, o mais preferido
de todos, o elefante albino Hanno, que
lhe oferecera D. Manuel I, Rei de Portugal. O banqueiro do Papa Leão X,
Agostino Chigi, era o homem mais rico da Europa do seu tempo”.
Foi
este Papa, bom vivant, hábil e
faustoso no trato diplomático com os seus pares estrangeiros, os monarcas
europeus, foi ele que lançou a pena capital, a excomunhão, contra Lutero,
quando este monge germânico pretendeu moralizar a cúria romana. Desta condenação
soltaram-se violentas lutas na Igreja, originando o divisionismo dos cristãos,
disseminados pelas multiformes igrejas protestantes. Quem , hoje, século XXI,
acreditaria que um tal ocupante do Vaticano, abarrotado de riquezas, nadando no
luxo e na opulência do poder, seria representante de Jesus de Nazaré, capaz de
condenar sem apelo nem agravo um cristão que lutasse por uma Igreja autêntica?
Digo:
hoje! Mas foram precisos 500 anos para chegarmos à visibilidade quase perfeita dos
contornos que identificam a matriz original da verdadeira Igreja de Cristo. Aí
temos, em contraluz, a radiografia desse original constitutivo:
Um
homem, herdeiro de Francisco, Il
Poverello, (a antítese de Leão), despido do fausto leonino do século XVI,
confessando-se peregrino, penitente, mendigo da Paz, avança, entre tímido e
esperançoso, para o epicentro das guerras político-religiosas, abre os braços cansados
da idade e pesados de toda a angústia humana e pede a Fraternidade Universal.
Leão
ruge e condena. Francisco implora e abraça. Aquele tem o império e as armas,
este as mãos vazias e limpas. Aquele divide e destrói, este baixa-se e junta do
chão os escombros da fé, os estilhaços da guerra para recompor a grande Mesa da
‘Casa Comum’ onde todos têm lugar. Naquele, o enfarte da astúcia, neste a transparência que liberta.
Achei oportuno trazer ao nosso acervo pessoal
este elucidativo contraste no dia em que Francisco Papa pisa solo iraquiano,
outrora Terra da Promissão, Pátria de Abraão, Jardim Terreal – e hoje rio de
sangue e lágrimas. Darei continuidade no próximo ‘Dia Ímpar’, porque, embora
incomensuravelmente distantes no tempo e na mensagem, os dois – Leão e
Francisco – habitam sob o mesmo tecto: o segundo é, de certo modo, inquilino do
prédio que o primeiro construiu. E acerca disto, o nosso Mestre e Líder, Jesus
de Nazaré, tem uma dura palavra a dizer no próximo domingo.
05.Mar.21
Martins Júnior
......o mesmo reformador que queria a pureza inicial da Igreja autorizou o massacre dos "sem-terra" da época....Apoiou os príncipes que lhe deram a chance de espalhar suas ideias..... Como sempre, falta a nobreza e a simplicidade das sandálias do "Pescador!"
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