Quis
o calendário gregoriano – e assim coincidiram os fastos nacionais e locais –
que o “Dia da Língua Portuguesa” ganhasse o pódio central da semana maior da
Capitania-Concelho de Machico, a Primeira da Diáspora Lusa, por outorga directa
do Infante de Sagres a Tristão Vaz Teixeira, em 8 de Maio de 1440.
Precisamente, hoje, 5 de Maio,
hasteia-se a bandeira multicolor do nosso Portugal: “A Minha Pátria é a Língua Portuguesa”,
já a definiu Fernando Pessoa. Por isso, outra lauda mais alta não haveria como
esta de anunciar os “Anais do Município da Antiga Vila de Machico”. Porque as
bucólicas “ Cantigas de Amigo” da poesia trovadoresca, a “Menina e Moça” de
Bernardim Ribeiro, as crónicas de Fernão Lopes, o “Leal Conselheiro” de D.
Duarte e. mais tarde, o génio de Camões e a eloquência de Vieira ficariam confinados ao rectangular
cadeado continental, se nas barcaças dos velhos lobos do mar e no seu bojo arrancado
ao do pinhal de Leiria não viajasse o verbo atlântico e não balanceasse o ritmo canoro da Língua-Mãe da nossa
nacionalidade.
De onde se pode inferir que, ao mesmo
tempo que a Madeira se afirmou como baluarte e diocese de aquém e além-mar, até
África, Brasil, Índia, também se deverá sinalizar Machico como epicentro
propulsor do idioma português transmitido e multiplicado por esse mundo fora.
Por aqui passou o rio subterrâneo do linguajar da gente lusa na demanda dos
vastos horizontes do planeta.
Merece, pois, redobrado aplauso a
iniciativa da edilidade machiquense em dar à estampa o ‘Livro de Ouro’ do nosso
Município, da autoria do escrivão municipal José António de Almada, publicado no
periódico A Flor do Oceano, no
cumprimento do Alvará Régio de D. Maria II (1819-1891) e determinação do
Governador José Silvestre Ribeiro (1807-1891) Será o culminar das comemorações
do “Dia do Concelho”, em boa hora reposto no seu galarim histórico (data da sua
nascença oficial no quadro administrativo de Portugal) após largo debate e
apreciação pública nas cinco freguesias do Município.
Por
hoje, limito-me a este apontamento casual, permanecendo o intuito de reproduzir
uma visão global dos “ANAIS”, em cujo Prefácio deixei exarada a síntese do histórico
documento. Entretanto, não resisto a sublinhar um dos aspectos mais impressivos
do referido Prefácio:
“Uma
nota peculiar perpassa, desde o início, nas páginas da obra identitária de
Machico, o seu espírito autonomista e a indefectível resiliência da população
na defesa dos seus direitos e legítimas prerrogativas, fosse contra a
prepotência dos governantes, fosse nos conflitos jurisdicionais e/ou
fronteiriços inter-concelhos, fosse ainda na reconstrução da sociedade local
pós-epidemias e catástrofes naturais. Agradecemos ao autor José António de
Almada o ter vincado este honroso carácter genético para os vindouros, também
para nós, hoje, construtores de um Município evolutivo”.
Ficaria
severamente claudicado este breve apontamento se não prestasse homenagem ao intenso
trabalho de criteriosa análise dos Professores e Investigadores Ana Cristina
Trindade, Carlos Barradas, Luisa Paolinelli, Paulo Perneta, Rui Carita, Naidea
Nunes, Thierry Proença dos Santos.
Justas saudações ao Presidente do
Município Ricardo Franco e à sua equipa pelo manifesto serviço prestado à
História e ao Povo de Machico.
05.Mai.21
Martins
Júnior
LÍNGUA PORTUGUESA
ResponderEliminarÚltima flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura,
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!",
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
OLAVO BILAC
Publicado no livro Tarde (1919).