Venham daí filósofos e sábios, acordem sociólogos e psicanalistas, ergam altares salomónicos os incuráveis pedéfilos, desde os de sola rapada aos sardanapalos da corte adoradores irrecuperáveis dos pés e chuteiras, venham e digam que secretas pulsões removem as placas tectónicas de um povo convulso, que esquece as dores e mazelas, o covid e a fome, as moratórias e as falências – para fundir-se em bebedeiras de arroubos lunares de levitação hipnótica e transformam um país num imenso manicómio de visionários sem freio!!!
Desde
manhã, tarde e noite, ligar o televisor ou abrir a telefonia, não se achava maneira
de fugir ao tsunami imparável de uma
arena colossal, onde vermelhos e pretos, verdes e amarelos e, por osmose, azuis
e laranjas punham em delírio os “heróis do mar, nobre povo, nação valente e
imortal”. É, sem dúvida, o espelho de um povo despido de si mesmo.
Refiro-me
aqui, não apenas ao “Leão Marquês” que hoje, em alucinante redondel, destrona o
Marquês Leão de Pombal”, mas a todo o fenómeno foot, que toma conta dos neurónios, enfurece as multidões,
mercadeja nas feiras francas os escravos milionários, esconde crimes e corrupções.
Pelo muito apreço que tributo ao saudável desenvolvimento atlético do cidadão,
causa-me um asco insuportável constatar que, desde a antiguidade clássica, um
tão nobre instrumento de compleição holística – Anima sana in Corpore sano – se tenha abastardado em degradantes
espectáculos de gladiadores dentro do campo e numa horda de quase bárbaros fora
dele, completamente acéfalos, escoltados e “algemados” pelas forças-da-ordem
pública.
Lá
vão eles (ontem uns, hoje estes, amanhã aqueloutros) entronizados ambulantes, os
heróis para os ‘patriota-foot’. Para
os que fazem da bola uma religião, lá vão eles, os santos mártires da pátria,
sob o pálio do céu vasto. E para os doentes crónicos do relvado, lá vão os
milagreiros da vacina tutelar.
Pelo
que vi nas redes sociais, o Me-too da
verde Laurissilva vestiu todo o país: o mar é verde, a terra é verde, o vento é
verde e até o padre da Calheta passará a usar esverdeados paramentos e – brade aos
céus! - vai mandar pintar de verde as rubras bandeiras do Espírito Santo!... É
o mito que corre.
E
sem prejuízo da justificada euforia dos ganhadores, vejo-me eu próprio hoje
também rendido ao “Teo-Foot”. Vencido,
mas não convencido! Vencido pela notícia, mas convencido de que o Desporto deve
ser mais, muito mais, outra fasquia e outro horizonte que não a alucinação cega
e surda, a corrupção encapotada, o paraíso tóxico de milhões perdulariamente
atirados aos anfíbios profissionais que gravitam à mesa dos orçamentos transacionados
do Banco Foot.
11.Mai.21
Martins Júnior
Muito bem!
ResponderEliminarDuarte Mendes
Fantástico texto. Uma vez mais deliciei-me. E dizia o Filósofo Dr. Manuel Sérgio que o desporto deveria ser "Jogo, Humor e Festa". Não pode ser "alucinação cega e surda". André Escórcio.
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