segunda-feira, 9 de setembro de 2024

O ESPÍRITO DE ANTÓNIO ALEIXO NO CORPO DO TRABALHADOR ! Respigos de um memorável encontro em Loulé






 Oportuno, estratégico, semeador de férteis colheitas a haver.

         Foi em terras de Aleixo, aquele que da rude terra e das palavras por polir fez de Loulé a oficina do pensamento crítico e lançou para o mundo ouro fino e pedras de jaspe duro atiradas à consciência universal, seja qual o tempo, seja qual o lugar.

Contado ao pormenor, resume-se a cerca de uma vintena de Aprendizes do Saber, Professores, investigadores, filósofos, psicólogos, historiadores, sociólogos, homens, mulheres, vindos de diferentes azimutes, de Coimbra, do Porto, de Lisboa, de Paris, do Brasil. E um único polo agregador: o universo laboral, mas explicitamente, a problemática do Trabalho. Em fim de férias e reinício da actividade – reabertura do ano escolar e do novo ano judicial, retoma dos programas áudio-visuais, debate  do Orçamento - do Estado, das Regiões, das Autarquias – nada de mais oportuno e estratégico do que fazer incidir o olhar clínico sobre o eixo propulsor de toda a transfiguração do Humus original, da Natureza primeva, em síntese, de tudo quanto existe: o Trabalho.

Desde a antiguidade, as forças produtivas e a relação da promoção, no regime ateniense, até à conceptualização do Trabalho no pensamento dos teorizadores da revolução industrial, a antinomia Capital-Trabalho, a ambição do lucro e a “empresa-máquina de moer trabalhadores”, o trabalho nocturno e suas sequelas, génese e desenvolvimento do sindicalismo, enfim, o percurso de um lustro de investigação, codificado este ano entre 3 e 6 de setembro, sob a égide da infatigável realizadora Raquel Varela e do sociólogo Roberto dela Santa, com o apoio da Câmara Municipal de Loulé. Da minha parte, coube-me o papel da Igreja Católica, particularmente em Portugal, sobre tão momentoso tema e respectivas implicações sociais.

Aguardamos a publicação, em livro, das incursões e perspectivas de acção traçadas ao longo destes cinco anos de análise e aprofundamento.

                                                     


  

Deveras revelador, para mim, o testemunho do Presidente do Município de Loulé, a encerrar a conferência do Prof. Dr. Duarte Rolo sobre a temática do encontro, partindo da obra de Adorno, o que motivou a interessada participação de munícipes, inclusive dos jovens, que encheram literalmente o salão nobre da Câmara.

Relevo a intervenção do Presidente Victor Manuel Gonçalves Aleixo – não fosse ele próprio neto do famoso e lúcido poeta António Aleixo – pelo vasto conhecimento das matérias focadas (situação rara em políticos da esfera executiva) e pela coragem frontal, esclarecida, dos módulos estratégicos a implementar para a vitória contra a supremacia hegemónica do mais forte, da ditadura capitalista. Confesso que me senti regressar à juventude e ao afã de outrora na luta pela recuperação do poder popular, no sentido mais positivo e construtivo deste termo.

Parabéns aos promotores, participantes e apoiantes desta nobre e promissora iniciativa.

 

07.Set.24

Martins Júnior

 

                 

   

                 

  


quarta-feira, 4 de setembro de 2024

60 ANOS PLENOS A SERVIR EM 90 BREVES ANOS A VIVER!

Merecia-a plenamente. E da forma como a organizaram: singela, sentida, vivida. E pelo palco

escolhido. E pela qualidade dos participantes. E pelo programa adequado, explícito, preciso.

Refiro-me à homenagem prestada ao Cónego Manuel de Freitas Luís Júnior, por ocasião do seu

90ª aniversário. O respeitável sacerdote passou por diversas paróquias da diocese, onde deixou

marcada a sua actividade, a diversos níveis: religioso, catequético, cultural e social. Mas, de todas,

aquela que hoje me proponho exaltar é a sua paroquialidade na, então, recém-criada jurisdição

canónica da Ribeira Seca.

Corria o ano de 1961, quando o Padre Luís Júnior, (sabe-me melhor esta designação mais

genuína) natural de Santana, chega à velha Capela do Amparo, construída em 1692, por Francisco Dias

Franco, morgado daquele burgo e capitão-secretário da Câmara Municipal de Machico. O primeiro

sacerdote residente da nova paróquia encontrou um povo bom e trabalhador, mas sem as mínimas

condições de existência: sem estradas, sem água potável, sem luz eléctrica, sem escolas. E pior ainda, a

própria capelinha, sede provisória da paróquia, estava muito degradada pelo tempo, até chovia dentro

e o próprio Padre Luís Júnior teve de pernoitar na sacristia, onde também caíam bátegas de chuva,

sobretudo na altura de tempestades torrenciais que impediam passar a vau o leito dos ribeiros, pois

nem pontes havia.

Foi visto o esforço do jovem pároco na construção da vereda junto à levada de rega, único

acesso à Capela do Amparo. O próprio padre carregou pedra do fundo da ribeira, ao lado dos

paroquianos, para o calcetamento da mesma vereda.

Imagino o sacrifício ingente do colega Luís Júnior, eu que, oito anos depois, fui nomeado para o

seu lugar, pois que ainda encontrei um povo desumanamente privado de água, luz, estrada. Imagino

ainda e pressinto na pele a árdua tarefa de construir a nova igreja em 1963, sem apoios nenhuns, além

das escassas poupanças e muita mão-de-obra do pobre povo da Ribeira Seca. Foi sobre este trabalho

porfiado que procedi em 1999 à requalificação e ampliação do referido templo.

Insisto em que foi esta passagem do Padre Luís Júnior pela Ribeira Seca como a sua ‘medalha de

ouro’ ao serviço da Igreja e do Povo de Deus. Dele pode dizer-se o adágio popular: “Comeu o pão que o

diabo amassou”. Porque nada havia e ele tudo teve de fazer para sobreviver e valorizar aquela gente.

Ele, o verdadeiro pioneiro da nova centralidade ali criada por decreto do Bispo David de Sousa!

Por isso, merecida foi a homenagem dos seus 90 anos. Aconteceu na paróquia de Santo Amaro,

no Funchal, lugar da sua residência pessoal. Sem espectacularidade, sem anúncios publicitários, sem

ostentação mundana, até sem a presença do bispo diocesano. Felizmente, ali compareceu o bispo de

Leiria-Fátima, José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, natural do Porto da Cruz,

juntamente com muitos habitantes da mesma freguesia. onde o homenageado tinha sido pároco muito

estimado pelo valioso contributo dado á Igreja e à Cultura. Paroquianos de outras localidades por onde

passou marcaram também presença simpática.

O Padre Luís Júnior a todos agradeceu, na sua alocução final, de improviso e sem esquecer

ninguém. Afectado pela cegueira física, parece que cresceu a sua visibilidade intelectual, a sua notória

espiritualidade.

Da minha parte, permita-se-me recordar três etapas da vida deste homem de Deus. Primeiro,

termo-nos conhecido no Seminário do Funchal: estava ele no 3ºano, quando eu entrei para o 1º.

Convivemos como bons colegas durante nove anos. Mais tarde, em 1961, era eu ainda seminarista e ele

pároco da Ribeira Seca. Vi-o mais de uma vez entrar na Câmara Municipal, com as costumeiras “botas-

de--água”, certamente ia ao presidente reclamar da falta de pontes nas ribeiras e de acessos condignos

para a população.

O terceiro episódio leva o selo da minha gratidão: Quando celebrei a minha Primeira Missa, em

1962, na igreja matriz de Machico, o Padre Luís Júnior foi um dos sacerdotes concelebrantes. Guardo

essa feliz memória, agora, 62 anos depois. Um abraço fraterno e o preito da minha sentida homenagem!

Aproveito a oportunidade para saudar, hoje, 4 de Setembro, as bodas de prata sacerdotais do

Rev. Cónego Manuel Gonçalves Ramos, natural do Porto da Cruz e que esteve também na homenagem

ao Cónego Luís Júnior. Venham outros 25!


04.Set.24

Martins Júnior