quarta-feira, 31 de julho de 2019

UM “FURADO” DE EQUÍVOCOS


Propositadamente recorro ao dialecto ilhéu – “Furado” – porque é disso mesmo que se trata: um tunelzinho recheado de velharias, sem  talento nem originalidade, tresandando ao mofo dos velhos baús. Devo dizer que nunca me predisporia à crónica de hoje (mais a mais em tempo ameno de férias a abrir)  se não fora a “originalidez” de um entrevistador todo-o-terreno da nossa praça, quando desceu ao Paço Episcopal para, entre outras charlas, indagar do Bispo do Funchal se “garantia que o padre Martins cumpriria a promessa de não entrar mais na política activa” e à qual o Prelado Diocesano respondeu com mestria e civismo.
         Quanto ao conteúdo da pergunta, de tão gasta e regasta, já se tornou enjoativa, sabendo toda a gente que deixei definitivamente as lides parlamentares há 14 anos e as funções autárquicas há mais de 20.
         Mas a “sábia originalidez” encobria outra laracha e outro destinatário: fazer crer ao público telespectador que a minha suspensão (de há 42 anos) tinha por fundamento a participação na vida política activa. Quantos milhares de vezes mais terei de reafirmar que a minha suspensão nada teve a ver com tal pressuposto?... Já foi dito e repetido que aquando da dita suspensão não era nem presidente de câmara, nem deputado (tinha renunciado ao cargo no ano anterior) nem sequer candidato. Fui suspenso porque o Senhor Bispo Santana, naquele Domingo de Crismas na igreja matriz de Machico, não me permitiu concelebrar (e tinha-o feito em 1975 quando aí eu presidia ao município…) também não me permitiu ser padrinho de um crismando (exibi então o boletim assinado pelo pároco) e, finalmente, para pasmo de toda a gente exigiu que eu abandonasse o templo, “Sem saíres da igreja, não começo o Crisma. E se não saíres, vou-te suspender a Divinis”. Claro que não saí. Na Segunda-feira, saía o solene Decreto(!!!) da suspensão. Falta dizer que o Bispo Francisco Santana (Deus o tenha) preferiu suspender-me em vez de administrar o Crisma a quase uma centena de jovens que ali estavam com seus padrinhos e familiares. Não houve Crismas.
         Foi a partir dessa data que resolvi recandidatar-me à Assembleia Regional, à qual tinha renunciado anteriormente, como já referido. Mesmo assim, tomei mais tarde a decisão de, perante o novo Bispo Teodoro Faria, colocar com toda a transparência as cartas na mesa: “Se o Senhor Bispo não quer que eu seja deputado, devolva-me a jurisdição da paróquia da Ribeira Seca. Porque, então, já nem poderei ser candidato, sou inelegível, por força da lei. Está na sua mão”.
     Ele está vivo e bem pode testemunhá-lo. E acrescentar que não teve coragem de aceitar a minha proposta. Pelo que, posso afirmar com toda convicção que foi a Diocese – os seus Prelados – quem me ‘empurrou’ para a vida política. Esclareço, ainda, que ser deputado não é rigorosamente impeditivo de ser padre, desde que não tenha jurisdição como pároco. E prova-o o facto histórico do Padre Dr. Agostinho Gonçalves Gomes, meu antigo e distinto professor, então Vigário Geral da Diocese, ter sido deputado da nação na Assembleia Nacional, pelo partido de Oliveira Salazar.
         Espero não ter de voltar mais a este tema, que o sr. Entrevistador quis meter num desajeitado “Furado” de equívocos e embustes, sendo que o maior de todos foi ter a veleidade – indigna de uma informação isenta – de afirmar que eu fora “militante”. Só faltou dizer de que partido. Consulte os Diários da Assembleia e retrate-se diante de todo o auditório da RTP/M.
         Nunca fui militante. Fui sempre “independente”, Como o Povo, a que pertenço.

         31.Jul.19/01.Ago.19
           Martins Júnior     

segunda-feira, 29 de julho de 2019

NADA É MEU, NADA É TEU E TUDO É NOSSO!



Ao desenhar o título desta noite adivinho logo logo as instintivas suspeições que ele suscita, ao menos por parte de quem vê na propriedade privada o único dogma e a matriz inalienável de toda a condição humana. Daí passa logo logo ao inapelável  anátema da praxe: “Ui, que isto cheira a pólvora, Ui que aí vem o colectivismo marxista, a mais bruta barbárie, o roubo legalizado”!
Longe disso. Paradoxalmente, é o seu contrário que pretendo defender e transmitir. E por mais estranho que pareça, fui desencantar esta ideia numa entrevista de Jair Bolsonaro à imprensa internacional, na qual o conhecido opositor dos mais elementares direitos humanos respondeu ao clamoroso protesto das nações, sobretudo de Emmanuel Macron e Angela Merkel: “A Amazónia é do Brasil, não é de vocês”!  Assim, o presidente de um país pejado de gritantes desigualdades sociais justificava o tremendo crime ambiental que está em curso impune no maior pulmão do Brasil e no seguro estabilizador dos ecossistemas do planeta. Resposta esfarrapada – dir-se-ia na gíria popular. E sê-lo-ia apenas isso, “esfarrapada”, se não colidisse com o bem estar social, a manutenção desta “Casa Comum”, que é de todos e para todos. Resposta escabrosa, obscena, tribal!
Tanto mais ruinosa e condenável esta ideologia, a roçar a paranoia, quando se sabe que é nesse infecto epicentro que assentam os regimes de pendor nacionalista, monopolista, populista e afins, que abalam a paz mundial. Enquanto cada país e cada região fizerem dos seus recursos uma arma exclusivista da sua economia e da sua prepotência, não é possível andar por aqui. Direi, no limite, não vale a pena nascer.  Ninguém poderá subsistir de pé quando à força da razão se sobrepuser a razão da força.
     Nesta conjuntura, a razão está na vivência da verdadeira globalização, aquela que sendo universalista no seu conceito mais amplo, reproduz-se em círculos gradualmente mais próximos de todos nós: o país, a cidade, a aldeia, e escola, a rua, a casa que habitamos. É desolador ver a olho nu a insensibilidade – que mais não é que o culto do mais rasteiro egoísmo – no âmbito da arquitectura paisagística, no descontrolo dos ruídos, na forma, até, de estacionar a viatura (como se a rua não pertencesse a todos), na poluição e desperdício das águas, no desrespeito pela floresta e, daí, a deflagração de incêndios devastadores.
Será preciso inscrever nos códigos jurídicos e, sobretudo, na consciência da grei o precioso normativo dos “direitos difusos” (e consequentes deveres) em virtude dos quais todos temos o direito de disfrutar do coeficiente inato da dignidade humana, na higiene, na alimentação, na saúde, no ar que respiramos, na água que bebemos, enfim, de nos sentirmos seguros e bem na “nossa casa”, que é também “casa dos outros”.
Até onde levar-nos-iam estas pistas de responsabilidade solidária?!
Trago-as hoje, na abertura do almejado período de férias, propício à saúde ecológica noutras paragens, diversas do nosso quotidiano, mas ao mesmo tempo propensas a abusos e riscos motivados pela inconsciência dos “direitos difusos” e respectivas obrigações.
Contra a boçalidade irresponsável das declarações bolsonarianas, ofereço-vos este breve diálogo, vivido aquando das minhas anteriores lides autárquicas:
O PROMOTOR (DONO ) DA OBRA   
 - Eu quero o prédio assim, e mais assim, e com tantos andares, tem de subir tantos metros acima dos outros.
O RESPONSÁVEL AUTÁRQUICO
 - Desculpe, mas não será possível, porque o RGEU (Regulamento geral das Edificações Urbanas) não lho permite. Há a densidade, os afastamentos,, a paisagem envolvente, as existências. Não lhe é permitido infringir direitos de terceiros.
O PROMOTOR, embarcadiço, endinheirado:
- Mas o terreno é meu, o dinheiro é meu, faço o que quiser.
 UM VIZINHO, homem mediano, de condição popular. Aproxima-se e pede licença para entrar na conversa. Dirige-se directamente ao Promotor:
- O terreno é seu, o dinheiro é seu. Mas o ar é nosso, a paisagem é nossa!    
Caso encerrado. Reproduzo aqui a velha máxima: “Quem tem ouvidos de entender – entenda!

29.Jul.19
Martins Júnior

sábado, 27 de julho de 2019

NARRATIVAS QUE NÃO MORREM


                                                 

Em fim  de semana da estação mole e solarenga que nos traz sono e barafunda sem limite, agarro-me ao fio da história contada no Livro de tempos imemoriais. Neste sábado-domingo, o Livro de há séculos e milénios toma conta de mim, pela imensa razão de ver reflectida nas suas páginas a história de hoje, do aqui e agora.
 Primeiro:
Duas cidades, Sodoma e Gomorra, foram condenadas à destruição total. Alguém impetrou à Suprema Divindade que perdoasse os crimes daquelas populações depravadas. Procedeu-se então a várias  tentativas de resgaste: se houvesse 50 cidadãos probos e honestos, as cidades não seriam arrasadas. Depois, 45, 40, 35, 30, até chegar ao dígito mínimo. “Se houvesse 5 ou 4 ou 3 ou 2 ou 1 justo, o Supremo Juiz revogaria a sentença fatal. Mas nem 1 justo havia naquelas duas cidades. Por isso, foram arrasadas, completamente destruídas. Vem no Livro do Génesis, capítulo 18.
Lição de ontem, de hoje, de sempre! Quem constrói ou quem destrói as cidades, as vilas, as aldeias, as instituições, mesmo as ditas sagradas, não são os deuses: sãos o que lá habitam ou as dirigem. Muito antes de sentenciar Camões que “um fraco rei faz fraca a  forte gente”, já o Livro tinha decretado. É o povo que faz o rei e faz o reino, a região, a cidade e freguesia. Ninguém espere salvadores extra-terrestres para libertar o território. Só os que lá vivem serão capazes e suficientes para minar e reduzir a pó os muros  da vergonha que apertam e oprimem os seus habitantes.
Segundo:
Um amigo acorda o outro amigo, altas horas da noite, para pedir de empréstimo dois pães necessários à família. Há insistências, protestos, insultos – “não posso levantar-me, vai-te embora da minha porta, não me enerves, desaparece, vem amanhã” – mas foi tanto o batente na porta que, ao fim de muitas imprecações, o “amigo” levantou-se e obrigou-se a despachar favoravelmente o pedido. Vem em Lucas, capítulo 11.
O Mestre e Pedagogo do Povo sintetiza a narrativa: “Procurai e achareis, bati e abrir-vos-ão a porta”.
Procurai, Bati insistentemente à porta … e vencereis.
Antes, muito antes dos estrategas sócio-políticos, Alguém dissera o mesmo: “Só é derrotado quem desiste de luitar”!
Nós aqui, sabemo-lo bem e de “um saber de experiência feito”!
Assenta bem o pregão: “A LUTA CONTINUA”!!!


27.Jul.19
Martins Júnior

quinta-feira, 25 de julho de 2019

SERÁ ESTA A SINA DE MACHICO ?...


                                             

Era uma vez uma criança… Nasceu à beira-rio “entre dois íngremes rochedos que levantam aos céus fronte orgulhosa”, no grande vale de Machico. Seu nome de baptismo: Francisco André Álvares de Nóbrega.
Podia começar assim um romance bucólico, uma novela de fazer sonhar corações! Mas não. É um registo trágico, ocorrido entre os séculos XVIII-XIX. Vem descrito com a mestria de um exímio sonetista. Ei-lo:

11 –

SONETO.
Ao Excellentissimo e Reverendissimo Bispo do Funchal o Senhor D. Luiz Rodrigues Villares.

Prelado Excelso, o Nobrega doente,
Cá das margens do Tejo, onde o remistes,
Vai , sôbre as asas de seus versos tristes,
A beijar-vos humilde a mão clemente.

Inda se lembra da tenaz corrente,
Que de seu rôto pé Sábio despistes,
Quando em cárcere abjecto em luto o vistes
Dos Pais, do Benfeitor, da Pátria ausente.

Só vós o fado meu vencer pudestes,
Só vós os agros dias me adoçastes,
Do vosso antecessor mimos agrestes.

Conheça o Mundo o quão diverso andastes:
Aquelle me espancou, vós me acolhestes;
Aquelle me prendeu, vós me soltastes.

              Decifrando a narrativa:
 A criança crescera, fora trabalhar para a cidade do Funchal. O deão da Catedral e professor de Retórica incentivou o jovem Francisco a entrar no Seminário do Funchal. Aí desenvolveu o seu talento e deu largas ao estro poético que trazia desde nascença. O Bispo de então, José da Costa Torres, moveu-lhe uma tal perseguição que só terminou na cadeia do Limoeiro, onde contraíu uma doença fatal que o levou à morte em Lisboa. Era o terrível e execrável tempo da Inquisição em Portugal. Calúnias sobre calúnias de carácter doutrinal desabaram sobre o jovem seminarista. Pouco antes de morrer, o seu substituto, Dom Luís Rodrigues Villares, intercedeu junto das autoridades que soltaram o grande vate madeirense, natural de Machico. Com 33 anos apenas, despediu-se da vida.
Um bispo o condenou, outro o absolveu. José da Costa Torres “matou-o”. Luís Rodrigues Villares “ressuscitou-o”. Há mais de duzentos anos! Protagonista: a Igreja Católica Romana!
E a mesma terrível pergunta permanece: Em que Igreja acreditar?...

25.Jul.19
Martins Júnior

terça-feira, 23 de julho de 2019

PERGUNTAS ESCONDIDAS NO CHÃO DA RIBEIRA SECA


                                                     

Podem chamar-lhe idílica e mágica, podem bordá-la da mais fina filigrana ou enclausurá-la no gineceu da maus cândida açucena. Mas o que ele é, de verdade, – a Ilha, qualquer Ilha – resume-se a um conceito-objecto denominado campo experimental virgem, reserva integral do pensamento, numa palavra, laboratório vivo e único, de onde pode sair o vergel mais perfumado e onde, paradoxalmente, pode medrar um antro de ossadas pútridas, infestantes.
Neste caso, a Ilha, a nossa, não foge à regra. A olho-nu, ela desdobra-se a quem quer “vê-la” e não apenas “olhá-la”. Na orografia, na produção agrícola, na criação artística, no desporto, na organização sócio-política … e na administração eclesiástica. Aqui, tudo é diferente, porque tudo é possível. Aqui, a originalidade ganha foros de anormalidade. Porque “fica tudo em casa” e ao que ousar sair tem logo o mar por todas pontas, onde tudo se afoga ou muito dificilmente consegue navegar. É o drama – e a glória – de ser Ilha.
Propus-me penetrar hoje no “dentro mais dentro” do recente caso Ribeira Seca, cujo protagonista foi e é, sem sombra de dúvida, a Igreja Católica e a sua hierarquia pós-25 de Abril na Ilha da Madeira. Para apreender mais seguramente as premissas desta análise, socorro-me do texto do abalizado filósofo e teólogo Prof.Dr. Anselmo Borges, transcrito no ‘blog’ anterior: o paradoxo de uma Igreja universal marcada, de um lado, “pelo descentramento de corações de um Deus-Amor e, de outro, por uma máquina dogmática centralizadora e um aparelho político-jurídico (denominado Código de Direito Canónico) à procura de visibilidade”. Citando Olivier Robineau, este paradoxal estatuto “tanto pode dar lugar a um São Francisco de Assis como a um Torquemada”. Por outras palavras, tanto pode produzir um santo como um inquisidor-assassino. Neste dilema, a questão que se nos depara inexoravelmente é esta: em que Igreja acreditar? Qual delas é válida? A  do “Deus-Amor” que produz um Santo ou a do aparelho político-jurídico que dá à luz um ‘piedoso monstro’,  um implacável torturador de corpos e almas?
Os dados estão lançados. É só jogá-los, lê-los, analisá-los sobre o tampo verde desta mesa chamada Madeira. Sejamos claros e directos. Sem azedumes, mas com toda a objectividade:
Um Bispo, peça-chave do regime salazarista no aparelho político-jurídico eclesiástico e seu indesmentível serventuário, chega à Madeira em 1974 e a decisão canónica mais solene que toma é suspender um padre católico, sem processo algum e sem direito ao contraditório. O padre não exercia então qualquer cargo político-partidário. O Bispo incendeia a opinião pública através do diocesano Jornal da Madeira, amaldiçoa o padre e os paroquianos, recusa-se a dar o Crisma e – brade aos céus! – proíbe  a venda de hóstias para a Eucaristia daquele povo cristão e católico, o que levou o mesmo povo a adquirir uma máquina para o efeito. O Bispo morreu.
Sucedeu-lhe um Bispo madeirense e, depois, um Bispo algarvio. O madeirense notabilizou-se por um episódio escandaloso, único na histórica Madeira de 600 anos: pediu aos governantes que mandassem 70 polícias ocupar a igreja. Sem mandado judicial. O povo resistiu. Passados 18 dias e 18 noites, os agentes policiais desocuparam a igreja, deixando-a livre para o povo que retomou normalmente a vida espiritual no seu templo.
O terceiro Bispo não deixou por mãos alheias os seus pergaminhos nesta história singular: aproveitando a vinda da Imagem Peregrina à Madeira, proibiu que ela entrasse na igreja, ficando a imagem, escoltada por muitos policiais, à entrada do adro, apinhado de gente de toda a Ilha. E lá se foi, sem nele ter entrado, perante a indignação contida da imensa multidão.
Porque a História não se compadece com novelas sombrias e  sem rosto, estes três Prelados têm nome: Francisco Santana, Teodoro Faria, António Carrilho.
Um outro Bispo – o quarto, neste roteiro estritamente narrativo - chega à Madeira em Fevereiro de 2019  e no exíguo espaço de quatro meses apaga o “rasto viscoso e sujo” de 42 anos de prepotência anti-evangélica: revoga a suspensão do padre, abre os braços a um povo irmão e, sem escrúpulos doentios nem subserviências de espécie alguma, visita aquela gente, entrando e abençoando aquele templo que os seus antecessores tinham amaldiçoado. O povo, que durante 42 anos (mais 8)  se manteve sempre fiel à sua igreja nativa, rejubilou de coração em festa no abraço de todos os irmãos com o seu Pastor Diocesano. Pacificou-se a Ilha, enfim! Este Bispo tem nome: Nuno Brás.
Retomando a questão inicial – que é, afinal, o que mais interessa em toda esta saga do incrível – falta responder à pergunta fundamental:  Em qual Igreja acreditar? Na de Francisco Santana, Teodoro Faria, António Carrilho?... Ou na Igreja de Nuno Brás?!
Obtida a resposta no íntimo de cada um, postula-se inevitavelmente uma outra mais profunda: Onde estará a verdadeira Igreja de Jesus Cristo?
É inesgotável o filão de ideias e perspectivas que o caso Ribeira Seca encerra. “O Caminho faz-se caminhando”. E enquanto caminhamos, termino esta longa reflexão com a parábola do “Bom Samaritano”, parafraseando a pergunta que Jesus fez aos hipócritas “doutores da lei judaica”, leia-se lei “jurídico-canónica”:
Qual destes quatro Bispos vos parece ter sido o Próximo do Povo de Deus?

23.Jul.19
Martins Júnior

domingo, 21 de julho de 2019

UMA IGREJA DUAL: EM QUAL DELAS ACREDITAR ?


                                                       

Tinha-me proposto, anteriormente, aprofundar a essência dos acontecimentos ocorridos neste modesto rincão madeirense, chamado Ribeira Seca. Porque o que mais se tem relevado publicamente, quer no áudio-visusal, quer nas redes sociais, tem a ver com um cenário transbordante de alegria, pacificação e até de um certo folclore tão caro à sensibilidade colectiva em circunstâncias festivas. Mas é pouco, muito pouco. Porque o “caso” radica em pressupostos, mitos atávicos e grosseiras  distorções que abalam os mais elementares códigos de qualquer ser pensante e, por maioria de razão, a mentalidade dos crentes, exigindo da nossa parte uma corajosa reflexão. A este propósito não me sai do ouvido e da consciência crítica aquele interpelação, em forma de samba,  do grande poeta-músico-diplomata brasileiro Vinicius de Morais: “Você que olha e não vê, Você que reza e não crê”… Mas eu quero ver – não apenas olhar – o “caso” Ribeira Seca, convidando à mesa deste repasto espiritual quem se sentir tocado por este impulso de penetrar a casca da árvore e descobrir-lhe a seiva vivificadora.
Não é tarefa mole nem túnel seguro. Por isso, enquanto procurava um foco projector que iluminasse o caminho a seguir, deparei-me com o artigo do Doutor em Filosofia e Teologia, Prof. Anselmo Borges,  em DN/Lisboa. É isto mesmo – exclamei -  o guião ou “GPS” que conduzir-me-á à meta proposta, concluindo pelo paradoxo de uma Igreja dual, quase contraditória. Ei-lo, com a devida vénia:

A Igreja tem dentro dela, inevitavelmente, uma tensão, que a conduz a um paradoxo. Esta tensão e este paradoxo foram descritos de modo penetrante, preciso e límpido pelo sociólogo Olivier Robineau, nestes termos: “A Igreja Católica é uma junção paradoxal de dois elementos opostos por natureza: uma convicção — o descentramento segundo o amor — e um chefe supremo dirigindo uma instituição hierárquica e centralizada segundo um direito unificador, o direito canónico. De um lado, a crença no invisível Deus-Amor; do outro, um aparelho político e jurídico à procura de visibilidade. O Deus do descentramento dos corações  que caminha ao lado de uma máquina dogmática centralizadora. O discurso que enaltece uma alteridade gratuita coexiste com o controlo social das almas da civilização paroquial — de que a confissão é o arquétipo — colocado sob a autoridade do Papa. Numa palavra, a antropologia católica tenta associar os extremos: a graça abundante e o cálculo estratégico. Isso dá lugar tanto a São Francisco de Assis como a Torquemada.”
  É com este paradoxo que o Papa Francisco tem de conviver, ao mesmo tempo que tem feito o seu melhor para dar o primado ao Evangelho, ao Deus-Amor, para que a Igreja enquanto instituição — e é inevitável  um mínimo de organização institucional — não atraiçoe a Boa Nova de Jesus. Ele é cristão, no sentido mais profundo da palavra: discípulo de Jesus, e quer que todos na Igreja se tornem cristãos, a começar pela hierarquia. Assim, tem denunciado as doenças da Cúria, avisa os bispos e cardeais para que não sejam príncipes, anuncia para breve uma nova Constituição para a Cúria, o governo central da Igreja”.
Sublinho: Uma Igreja “que dá lugar tanto a São Francisco de Assis como a Torquemada”. E volto à pergunta em epígrafe: Em qual  Igreja acreditar?...
Agradeço. Prof. Anselmo, a luminosa pista que nos deixou hoje para descobrirmos  amanhã o “dentro mais dentro” dos acontecimentos ocorridos.

21.Jul.19
Martins Júnior

sexta-feira, 19 de julho de 2019

CONVOCATÓRIA “PESSOAL E INTRANSMISSÍVEL”


                                                ?

  Só é nosso aquilo que nos questiona: seja pedra ou flor, brisa suave ou vendaval, bicho ou homem, vida ou morte – tudo o que acontece só é nosso quando somos interpelados e temos coragem de encontrar-lhes resposta. São efémeros – não são nossos – o prazer, a fama, o sucesso ou o desaire, a própria dor, se não nos demorarmos a escutá-los como a alguém que nos aperta o braço e espera o nosso olhar. Por isso, “o poeta em tudo se demora”. Por isso, todo o mundo é seu. Não só o poeta, mas todo o ser pensante, viageiro do tempo e do espaço. Cada um de nós!
Os acontecimentos ocorridos, domingo passado nesta pedaço de terra situado a leste da ilha, exigem de nós escuta, interpelação e resposta. Para serem nossos!

19.Jul.19
Martins Júnior   

quarta-feira, 17 de julho de 2019

TOMADA DA BASTILHA EM MACHICO


                                                                 

      Sobrevoam ainda no ar as palmas, o canto livre, os abraços e até as lágrimas que corriam silentes no rosto enrugado dos mais velhos, os pilares daquela modesta igreja que ninguém, “nem as portas do inferno  prevaleceram contra ela” . De todas as emoções e de todos os olhares, captei num típico sotaque alsaciano esta espontânea exclamação: “Olalá, mais c´est la fête! Aussi en France, aujourd’hui  nous fêtons la prise de la Bastille”!  Era  um jovem casal recém-chegado de Colmar à sua terra natal em gozo de férias.
         Fez-me cismar, primeiro. Mas de seguida, fez-me pular de inspiração no meu íntimo. E de irreprimível júbilo. Era aquilo mesmo que se estava a passar naquele vasto recinto de festas. Mais do que um celebrativo exercício de carácter administrativo-canónico ou de uma espectacular explosão de alegria rural, o que ali decorria era uma autêntica demonstração natural do derrube de uma outra “Bastilha”: da ditadura inquisitorial, da maldição satânica (ou “Santânica”) travestida da mais supina sacralidade, enfim, o derrube da ignorância arvorada em deusa no altar de “cegos que guiam outros cegos”. O que ali estava em causa não era a aclamação, muito menos a entronização do indivíduo. Era a libertação de um Povo,  livre por dentro, mas algemado por fora. Não obstante a prisão a que nos acorrentaram, podemos afiançar, parafraseando Gilbert Cesbron, que a “nossa prisão era um reino”, onde litávamos e cantávamos, construindo o Dia Aberto da nossa Liberdade de crentes e humanos.
         Assim como a invasão da Bastilha em 1789 não foi golpe do momento mas fruto de uma premeditada elaboração de ideias e estratégias, assim também o “14 de Julho” na Ribeira Seca tem um percurso de quase 50 anos, calcetados de conhecimento e informação, enxugados de sofrimentos e clamores, iluminados pelo brilho inextinguível das páginas evangélicas que nos fizeram prosseguir viagem sem medo das minas com que armadilhavam o caminho. Chegámos, enfim!
         Não falamos em vitória, embora tenhamos  o pleno direito de dizê-lo. Falamos em abraço de reconciliação, de onde sobressaem duas palavras de ordem, como duas asas esvoaçantes, cada qual com sua mensagem: Para uns, um sentido “Perdoai-lhes, Senhor, porque (talvez!) não souberam o que fizeram”. Para outro, o actual prelado, um caloroso “Bem-Haja” e o desejo decidido de  continuarmos de mãos dadas, abrindo as pequenas e médias Bastilhas que se atravessam no percurso de todos nós, tal como cantou o nosso Poeta de Abril:

“Hei-de passar nas cidades
Como o vento nas areias
E abrir todas as janelas
E abrir todas as cadeias”
             
17.Jul.19
Martins Júnior


segunda-feira, 15 de julho de 2019

CANTO NOVO NA VOZ DO POVO!


                                                                      

Chegou, enfim, o “Amanhã” que anteontem tinha eu  anunciado. É caso para dizer e confirmar que não é vã a boa nova dos “Amanhãs que cantam”! E porque foi o Povo da Ribeira Seca o grande protagonista e destinatário dessa vitória, dou a palavra ao mesmo Povo, reproduzindo aqui os versos que Josefina Mendonça, natural e residente nesta localidade, dedicou então ao Prelado Diocesano:

“Boas-Vindas, Senhor Bispo
À nossa simples igreja
A sua nobre visita
Já há muito o povo deseja

O Senhor Padre Martins
O Senhor Bispo Nuno Brás
Vê-los juntos de mãos dadas
Que enorme alegria nos traz

Veio repor a Verdade
O Senhor Bispo Nuno Brás
Agora feita a Justiça
Podemos viver em Paz

Como o nosso Papa Francisco
Nosso guia e protector
Que respeita toda a gente
Não importa raça ou cor

Os nossos pais e avós
Queriam ver este dia
Infelizmente partiram
Sem terem essa alegria

Aqui vêm as crianças
São flores destes jardins
Que há 50 anos cultiva
O Senhor Padre Martins

O nosso muito obrigado
Por nos dar felicidade
À nossa Ribeira Seca
E a toda a comunidade”

15.Jul.19
Martins Júnior

sábado, 13 de julho de 2019

QUANDO O ÍMPAR SE FAZ PAR


                                       

Acontece…
Quando a noite se faz dia. Quando o rio se faz mar. E quando as armas de  guerra se transmutam em oásis de amor e paz.
Hoje é assim neste “Consenso”.
Amanhã, logo verão que a porta ímpar de julho crescente transfigurar-se-á em portão largo,  aberto de par em par!
Até lá!
 13.Jul.19
Martins Júnior     

quinta-feira, 11 de julho de 2019

SOL DE ABRIL NESTE FIM DE SEMANA!


                                                         

Como o Amor, também o “25 de Abril” não tem tempo nem medida!
Há-os de vários tons e variegadas cores. Há-os de tronos e nações. Há-os até  de templos e religiões. Os pesos da balança falham e nem a métrica tridimensional consegue abarcar a amplitude do “25 de Abril”, seja ele  intimista ou colectivo.  Porque o sabor da libertação tem todos os perfumes e paladares que o mundo é capaz de conter.
O Povo de um modesto rincão suburbano da ilha verá uma réstia desse sol aprilino, a partir de 12 de Julho. Será Festa! Em homenagem à Terra-Mãe e que ela produz,.
o Pão e ao Vinho, matéria prima da Eucaristia. Homenagem em linha recta ao Prelado da Diocese, o Bispo Nuno  Brás, que estará presente no templo da Ribeira Seca. Há mais de 50 anos que um vigilante máximo da diocese e Pai da Cristandade madeirense abandonou o Povo Católico daquela localidade.
         Por isso, é Festa!. Primeiro, a Festa do Perdão na sexta-feira, dia 12, sem a qual não poderá haver nenhuma outra. No sábado 13, a partir das 20,30H, a vigília festiva e no domingo, a partir das 17H, a visita do Prelado Diocese, com Eucaristia e Cortejo Processional, seguida de animação lúdico-cultural, preenchida pelas canções originais do reportório do Grupo de Cantares da Ribeira Seca, Machico.
Será Abril renovado para quem o proclamou, o Bispo da diocese e, no mesmo plano, para quem o recebeu, o Povo da Ribeira Seca que aguentou firme e resoluto um ostracismo que durou mais que os quarenta anos que o cativeiro do Egipto.
“Seja bem-vindo quem vier por bem”!

11.Jul.19
Martins Júnior

terça-feira, 9 de julho de 2019

TERRA FÉRTIL!


                                                

Aqui, a terra antiga traz na barriga de jovem-mãe primaveras renovadas. As raízes de outrora, ensopadas em sangue e húmus, cantam as dores de um parto, quase impossível, mas que um dia havia de chegar!
Não são as loas de Tristão e Zargo. Nem de outro herói datado. É o trono do anti-herói que se levanta, silencioso, inexorável e belo.
Porque aqui e agora, herói anónimo é o Povo.
Por isso, desde o alto dos montes até à fundura dos vales, um só grito ressoa: 
“O POVO É QUEM MAIS ORDENA”!

09.Jul.19
Martins Júnior        

domingo, 7 de julho de 2019

UM DOMINGO PARA TODA A SEMANA, PARA TODA A VIDA

                                                                             

Do XIV Domingo comum:
“Alegrai-vos com toda a Jerusalém, vós que a amais. Alegrai-vos com ela, vós que participastes do seu luto”.
Isaías: 66, 10
“Para mim, nem a circuncisão nem a incircuncisão valem alguma coisa.
O que tem valor é a nova criatura”.
Paulo: Gálatas, 6, 4~5
                                          *****

Quem mandou a Isaías  que neste domingo falasse para a Ribeira Seca, para a Madeira, para o Mundo?... É que nós amamos a nossa Aldeia-Cidade e durante mais de42 anos  partilhámos  do seu luto. O nosso luto chamou-se luta, acção e canção. Por isso, cantamos com ela.
 E quem ordenou a Paulo de Tarso que viesse justificar a razão da nossa paz e da nossa resistência?... Porque o único valor que importa é manter a
nova criatura que há dentro de nós.
         07.Jul.19
         Martins Júnior

sexta-feira, 5 de julho de 2019

TODO O TEMPO E TODO O MUNDO EM MACHICO!


                                                            

Fosse onde fosse, o que ontem aconteceu em Machico mereceria sempre a subida honra do título: “Todo o Tempo e Todo o Mundo”. Porque é fora de suspeita a realidade factual ali dita e desdobrada perante a magna assembleia de educadores, professores e jovens estudantes ali presentes, envolvidos e abraçados sob o signo em epígrafe.
O brilho da educação e  as suas imensas derivadas apresentaram-se de braço dado com a intuição e a criatividade humanas focalizadas no amplo conceito do “Empreendedorismo”. E o mais impressivo, desconcertante e, ao mesmo tempo, ajustado de tudo foi a dedicatória presente em todo o acontecimento: as crianças em idade escolar. Aliás, foram elas as protagonistas e as destinatárias dos esforços de tantos professores que, ao longo de vários anos, assimilaram a essência da iniciativa e puseram em prática as linhas programáticas do programa. Que bela identidade lhes deram “Brincadoras de Sonhos”.
Ali, ao vivo e pela mão dos seus operacionais assistiu-se à anatomia do ensino, as suas consequências, as suas exigências. Viu-se a educação por dentro, os prós e contras do figurino actual, estático, direi, quase-escolástico, narcísico, talvez autista das escolas tradicionais. Em contraponto, surgiu uma nova face do ensino, de carácter pragmático, caminhando lado-a-lado com a vida, integrando-se nela e com ela fazendo a pareceria perfeita. Neste módulo, o alunos já não é um segregado, fechado numa sala ainda mais segregada, mas um companheiro do saber, contracenando com o conhecimento científico. discutindo com ele e com ele “ganhando competências”, ampliando o espírito crítico através da criatividade inata ou adquirida.
Para nós, adultos, formatados  no apertado escantilhão do ensino dogmático de outrora, custa a entender os dados da “escola nova”, gizada ao ritmo da vida e na ponta de um dedo. É por isso que se torna imperativo incondicional o aproveitamento de todos as componentes e valências da vida em sociedade, incluindo as redes sociais, os ‘tablet’s”, os telemóveis e a sua forma de usá-los. Enfim, um mundo novo, um tempo novo!
Brilhante - e mais que brilhante – substancial e rico foi o elenco de professores intervenientes neste seminário, com obra feita na docência de várias universidades portuguesas e estrangeiras e com trabalhos reproduzidos em livros e revistas da especialidade. Singular, motivadora a exposição do catedrático brasileiro Paulo Eirado Dias Filho. Nota máxima para todos! Não menos cativante foi a narrativa das actividades escolares, a cargo das professoras de estabelecimentos de ensino da Madeira e do Continente (apoiados pelos respectivos municípios ali representados) como num sugestivo filme em que aparecia o talento empreendedor dos alunos. Duas notas dominantes: os programas são direccionados para o futuro das crianças, tornando-as autónomas, auto-confiantes, capazes de superar os obstáculos supervenientes. Concomitante a este propósito,  os prelectores incutiram o verdadeiro conceito do empreendedor, não tanto como empresário de negócios, mas como programador do seu próprio futuro, o seu e o da sociedade envolvente.
Mais um dia pleno: a plenitude da grande família humana que juntou docentes e discentes, crianças e adultos num mesmo sentir, o de construir o futuro. E a plenitude de outros espaços geográficos onde já estão em marcha os  novos paradigmas pedagógicos. Ocorreu-me o pensamento crítico  de Galopim de Carvalho, em recente entrevista, relativamente aos códigos anquilosados da aprendizagem: “Não estamos a educar crianças. Infelizmente estamos apenas a amestrar crianças”.
Parabéns aos dois ilustres madeirenses, Prof. Jacinto Jardim e ao Prof. Eduardo Franco, pelo dinamismo verdadeiramente empreendedor de unir mestres e aprendizes de todo o país nesta inovadora estratégia didáctica. Parabéns à entidade promotora da presente iniciativa, o Município de Machico, na pessoa da Vereadora da Cultura, Mónica Vieira, pela inteligente metodologia com que liderou todo este movimento. Numa altura em que ‘virou’ moda e vício meter tudo ao ‘baralho’ dos “600 anos”, ainda bem que a autarca libertou Machico dessa rede viciada e até ridícula. No entanto, foi incisiva a sua evocação de Tristão e Zargo, para apelar aos “Brincadores de Sonhos”, os jovens e as crianças de hoje, a que se assumam como descobridores e empreendedores de um mundo novo. O seu, o nosso Mundo!

05.Jul.19
Martins Júnior


quarta-feira, 3 de julho de 2019

POVO QUE FAZ, FESTEJA E AGRADECE


                                                            

Como é saudável a transparência dos contrastes! E que  brilho de alma acender una vela no antro da nocturna escuridão. Tal como  ver recrutarem-se à luz do sol nascente os verdes plúmbeos da montanha ou o negrume basso do nosso basalto. Há mais verdade  e cor dentro e fora de nós!
Foi o que me foi dado ver e seguir, passo a passo, nas comemorações do Achamento da Ilha, entre 1 e 2 de Julho.  O dia primeiro apresentou-se opado com recheios de gente de fora – Bem-vindo quem vier por bem -  e adereços de fino artifício. A “glória de mandar, a vã cobiça a que chamamos fama”, diria Camões. O dia segundo, porém, modesto mas pleno, em aberta praça pública e democrática partilha da população de Machico. Sem desdourar o primeiro, manda a verdade dizer que o segundo ganhou-lhe a palma. Porquê?...
A evidência não deixa dúvidas. No 2 de Julho, as gentes de Machico sentiram o pulsar histórico do seu “Dia”. E fizeram a festa, Os poemas, as canções, as emoções. Tudo quanto foi servido à mesa de Tristão e Zargo, 600 anos depois, foi tudo manufacturado, vivido, assimilado pelo povo da terra. Na expressão plástica do baixo-relevo, da autoria de um homem de Machico, o escultor Luis Paixão, condensa de forma iniludível a fidelidade deste Povo fiel à verdade histórica do seu nascimento para os Anais do Tempo.
Insofismável, porém, foi a prova que, em jeito de pré-anúncio, apresentou  o Presidente da Junta de Freguesia ao revelar em primeira mão a decisão de reeditar a colectânea “AQUELE ESPESSO NEGRUME”, uma obra editada em 1982 pela Junta de Freguesia, então presidida por quem escreve estas linhas. Trata-se da recolha de textos dos autores iniciáticos que perpetuaram por escrito a evocação do Grande Feito de 1419. O mérito da obra reside na energia porfiada de um punhado de jovens estudantes que, há 37 anos(!), pesquizaram e reproduziram os primeiros testemunhos de cronistas coevos, desde Francisco Alcoforado, Gomes Eanes de Azurara, João de Barros, Gaspar Frutuoso, Luís Vaz de Camões, a que seguiram poetas e romancista que, nos séculos seguintes, versaram o mesmo tema. Jovens audazes do concelho, rapazes e raparigas que abraçaram entusiasticamente a minha sugestão e  deixaram para o futuro uma autêntica memória científica.
Será, talvez, a coroa que faltava nestas comemorações, a qual saúdo efusivamente na pessoa do Presidente da Junta de Freguesia de Machico, Alberto Olim, com votos de que seja o bandeirante dessa iniciativa, esta sim, feita em Machico, por Machico e para Machico. Um Bem Haja!

03.Jul.19
Martins Júnior