terça-feira, 13 de abril de 2021

JESUS CRISTO, COMUNISTA?!... “Eles punham tudo em comum”!!!

                                                                               


         O título nada tem a ver com as “manchetes” bombásticas que tomam conta dos telejornais e dos tablóides da ‘Última Hora’. Já tem mais de dois mil anos e é-nos oferecido para toda esta semana, através das leituras feitas oficialmente, anteontem, em todos os lugares de culto. Ei-las, em  discurso directo, Actos, 4, 32-35:

         “Os que tinham abraçado a fé eram perfeitamente unidos, tinham uma só alma e um só coração. Nenhum deles dizia que os seus bens eram apenas seus, mas punham tudo em comum. Entre eles, ninguém passava necessidade, porque os que possuíam campos, propriedades ou casas vendiam-nas e entregavam o dinheiro aos apóstolos e estes repartiam por cada um conforme as suas necessidades”.

         Teremos entendido bem estas palavras?... Lemo-las a frio, sem por um instante cortar a respiração?... Onde encontraremos – país, democracia, monarquia, patriarcado ou matriarcado, trono ou templo – onde encontraremos uma Constituição tão sumária e tão extensa, gigantesca, avassaladora, revolucionária?!... E, no entanto, ela é factual, verídica! Merecia bem  ser gravada em pedra, mármore, o mais puro, prata e oiro fino:

         Povo – Unido!

         Mentalidades e sensibilidades – um só tronco!

         Egoísmo – zero!

         Assimetrias – zero!

                  

Guerras – zero!

Recursos - os “meus” só valem enquanto função social!

 

Enfim, o melhor de todos os mundos! A utopia, o sonho, o Nirvana em corpo vivo, o Paraíso Terreal sob os nossos pés!

Quem o fez? O decreto do Imperador?... O arauto de Pilatos?... Caifás e o Torá?... Não, nenhum poder extrínseco, só a Voz do Nazareno e o eco da Consciência!

Mas, desde aqui até apodarmos Jesus Cristo de comunista vai tanto de distante como de tão perto. De tão perto, em termos de pragmatismo igualitário ou sociologicamente proporcional; e de tão distante, se considerarmos a orgânica interna, os métodos e os instrumentos usados para atingir os mesmos fins. É uma velha questão sob cuja ponte têm corrido rios de tinta. Nem será aqui autonomizada, muito menos dissecada. No entanto, é útil recorrer ao pensamento de alguns, entre tantos, analistas que se debruçaram, uns sobre a questão teórica, outros no chão prático da acção.

Começando por Roger Garaudy: “O nosso problema consiste em conceber um tipo de sociedade em que a liberdade da pessoa não degenere em individualismo de selva e onde o comunitário se não degrade em totalitário”. E Francfortois, citado por Eric Voegelin, em As religiões Políticas”, acentua: “Se a criatura se apropria de qualquer coisa de Bem, como são o ser, a vida, o conhecimento, o poder, e se pensa que isso é seu ou lhe pertence, ou vem dela, é frequentemente uma aversão (direi, aberração). Que fez o diabo, ou o que foi a sua queda, senão apropriar-se também de ser qualquer coisa, pensando que qualquer coisa era só sua ou só lhe pertencia? Esta apropriação, os seus “eu”… “me”…”a mim”…”meu”… foram a sua aversão e a sua queda”.

Alain Birou, em Luta Política e Fé em Cristo, passa ao campo da acção concreta e, referindo-se à revolução comunista, define: “A revolução como mito transforma a política em mística, em religião”. Para, logo de seguida, censurar os cristãos: “Pela sua passividade, pelos seus compromissos, a sua instalação no mundo, a sua confusão com os poderosos da terra, os cristãos são, em grande parte, responsáveis pelo aparecimento desta nova religião”. E quantas vezes tem o Papa Francisco direccionado a sua crítica no mesmo alvo?! É sobejamente conhecida a sua insistente recomendação (contra o luxo cardinalício da Cúria Vaticana) para que o crente não sinta vergonha de “sujar as mãos na lama social e que os pastores não fujam ao cheiro das ovelhas do seu rebanho”.

A este propósito não posso deixar de evocar essa grande personalidade, o Padre Abel Varzim, pároco da Encarnação, no Bairro Alto, Lisboa, onde, entre 1951 e 1964, liderou uma dolorosa campanha contra a prostituição e os lupanares daquela zona problemática. No livro-testemunho dramático da sua luta, Procissão dos Passos, Uma vivência no Bairro Alto, deixou-nos apelos angustiantes e contundentes, como os que se seguem, escritos na década de 50, do século passado:

“O comunismo surge na História como uma nova fonte de salvação. Importa, por isso, sair de nós próprios e dos nossos templos demasiadamente fechados, por mais abertos que pareçam, prestar atenção à Procissão invisível que passa cá fora… Deixar-se embalar e adormecer pelos cânticos religiosos ou embriagar-se com o perfume do incenso ou com o rendimento dos cofres dos altares, as mais das vezes cheios de moedas da superstição, não me pareceu coisa séria nem trabalho honesto”.  

Eloquente testemunho. E actualíssimo. Também aqui na Madeira.

Para fazer jus ao título deste bloco, passo a palavra ao próprio Abel Varzim:

“ Viu bem o problema um dirigente comunista que um dia me disse:

Li com profunda atenção os Evangelhos e as Cartas dos Apóstolos, estudei a fundo a vida dos cristãos dos primeiros séculos. Se vós pusésseis em prática o Evangelho e se fizésseis como eles fizeram, nós não seríamos precisos”.

 Tema este, apaixonante, longo, interminável, a merecer maior aprofundamento!

 

13.Abr21

Martins Júnior

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