quarta-feira, 15 de setembro de 2021

JORGE SAMPAIO: ONTEM, HOJE E SEMPRE EM MACHICO !!!

                                                                               


Enquanto ele começa a rota das cinzas - às quais somos todos candidatos, inelutavelmente eleitos – ficam cada vez mais acesas no coração do mundo as memórias de alguém que «passou a vida fazendo o bem”.

Cantem-lhe os historiadores e panegiristas os grandes feitos, enalteçam-lhe os parlamentares e analistas internacionais a visão universalista do seu olhar sobre Timor, Macau, Síria, Rússia, Afeganistão. Da minha parte, fico-me contemplando as suas mãos debruçadas sobre uma minúscula parcela do planeta, distante dos grandes centros de decisão e, malogradamente, ostracizada pelos poderes mais próximos.

Algo de intensamente histórico-político liga Machico à capital portuguesa. Foi nem 1989. Jorge Sampaio é eleito presidente da Câmara Municipal de Lisboa. Na mesma data, precisamente, em exclusiva coligação com a população do concelho de Machico, foi-me entregue a condução dos destinos municipais, pondo fim ao consulado de 13 anos de governação autárquica subjugada ao regime musculado que, ainda hoje, domina a Região dita Autónoma da Madeira.

Só eu sei – e depois soube-o a população – a degradação e o charco terceiro-mundista em que o PPD deixou o município: sem dinheiro (milhões de dívidas), sem equipamentos (o governo retirou todas as máquinas que tinha em serviço no concelho), sem pessoal técnico (muitos, a maior parte, obedeceram servilmente à cúpula regional e requereram licença sem vencimento) e, o mais escandaloso, as únicas duas viaturas do lixo degradadas, completamente inoperacionais. Enfim, o caos total. Perante a hostilidade mais tacanha da governação regional, apostada em liquidar liminarmente a acção do novo executivo camarário, para quem havia eu de voltar-me?... Para Lisboa, cuja Câmara tinha como líder Jorge Sampaio.

De minimis non curat praetor – lembrei-me do ditado latino da época imperial romana. Por isso, timidamente dirigi-me ao município-capital e aí expus a situação ao presidente que, logo de uma assentada, predispôs-se a mandar reparar na totalidade uma das viaturas nas oficinas da Câmara de Lisboa, o que cumpriu em tempo recorde, completando a oferta com mil contentores para recolha pública do lixo amontoado nas estradas. O “Príncipe dos Municípios Portugueses”, sensível à carência dos mais elementares recursos de uma modesta vila ilhoa, perdida no Atlântico!

                                                                


Não ficou por aí a magnanimidade do seu apoio a Machico e às suas gentes. De idêntica degradação sofria a rede de distribuição domiciliária de água potável, ou pelo desgaste da canalização obsoleta, ou pela inércia dos serviços da anterior gestão, ou ainda pela deficiente estratégia das condutas, o certo é que perdiam-se imensos caudais ao longo do percurso. Mais uma vez, impetrei ao Dr. Jorge Sampaio o seu apoio para matar a sede às nossas populações. E prontamente enviou um quadro técnico superior de supervisão do referido sector da Câmara de Lisboa, que calcorreou veredas, levadas e valados, por onde serpeava a rede de água. Três semanas de trabalho intenso, sem custo algum para Machico. Nessa enorme e inestimável tarefa, acompanhou o referido técnico um jovem voluntário chamado Ricardo Franco, hoje sábio e competente presidente do município de Machico! Colaboração eminentemente premonitória do que iria passar-se anos depois!

Se, na sequência do brocardo latino supra-citado, o grande líder não se ocupa de coisas mínimas, tal não sucedeu com Jorge Sampaio. Do alto do seu pedestal, quer como autarca hegemónico, quer como Presidente da República, auscultou os gemidos e as dores dos mais pequenos, fosse em território continental, fosse em terras mais longínquas das Ilhas portuguesas.

É no manuseio das coisas pequenas e na atenção aos mais rasteiros seres vivos que se manifestam a sensibilidade e a nobreza das grandes almas! Assim foi Jorge Sampaio. Por isso, Machico acompanha-o, com incomensurável gratidão, na sua viagem pela rota das cinzas – as dele, as nossas, as vindouras. E junta-se a Jorge de Sena, no poema que ele tanto amava, emoldurando-o com a transcendência poética e o realismo telúrico de Fernando Pessoa, no seu heterónimo Ricardo Reis:

Para ser grande, sê inteiro,

Sê todo em cada coisa, Põe quanto és

         No mínimo que fazes.

Assim em cada lago a lua toda

         Brilha, porque alta vive.

 

Assim brilha Jorge Sampaio na baía-lago de Machico.

 

15.Set.21

Martins Júnior

 

 

 

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