segunda-feira, 3 de julho de 2017

FERNANDO PESSOA PERGUNTA, MACHICO RESPONDE


Em cada ano, chegado o mês de Julho, a Descoberta renasce e toma o encomiástico  sobrenome de Redescoberta. É assim em Machico. E é-o na Madeira. Porque nisso deve consistir o corpo de toda a efeméride evocativa dos primórdios do ‘Achamento’. E mais que o corpo, é o seu espírito que deve enformar as comemorações do nascimento da Ilha para a História.
Já ontem referi as encenações proclamatórias da Autonomia e observei a liturgia enfaixada com que os titulares e os títeres do poder pretendem engalanar-se aos olhos do vulgo, sem que para isso tenham factualmente contribuído.
Muitas e sonoras parangonas, frases feitas, estados de alma sôfrega de mais Autonomia, clamorosos panegíricos aos 600 anos! Faltou apenas o essencial – o essencial apenas – faltou ali Fernando Pessoa a apostrofar os patrioteiros regionais com o mesmo tom com que se dirigiu ao “Mar Salgado’… “VALEU A PENA”?!
Viro as costas aos vernizes do “teatro das operações” oficiais, incandescentes da hipocrisia encobridora de interesses corporativos, partidários, jogos assolapados do poder político-económico --- e volto-me para Machico, o Pórtico das Descobertas, e pergunto, olhos nos olhos, aos meus conterrâneos e a mim próprio: Valeu a pena terem aqui chegado Tristão e Zargo?... Que diriam se voltassem ao berço que eles deitaram neste solo para criar e fazer crescer 598 anos de vidas, sonhos e ambições?
Deixo para o julgamento da História as décadas e os séculos que não foram nossos e cravo os olhos na majestade deste vale: “Que fizemos deste mar, deste céu e desta terra que nos deram para cuidar como inquilinos e possuidores?... Sente-se cada um de nós senhorio e colono, benfeitor e beneficiário, dono provisório e utente inteiro desta nesga de húmus vivo, que sendo nosso deixará de sê-lo mais tarde?... Que remos e velas temos içado para fazer deste ecológico berço de outrora uma baía de humanismo e  esperança no futuro?... Que passos temos dado para alcançar o cume destas montanhas que nos chamam a amar o sonho e o ideal de um Povo Melhor?...
“TUDO VALE A PENA SE A ALMA NÃO É PEQUENA”. Respondeu Fernando Pessoa. Mas queremos mais: Que o corpo acompanhe a alma! Mais que um fugaz estado de alma, Machico quer plasmar no concreto quotidiano o plano produtivo que animou o Visionário Infante no promontório de Sagres que tornou a Ilha numa sementeira fértil e promissora para a economia, para a arte e para a ciência dos oceanos.
Esta é a nossa hora, porque em toda a hora soa aos nossos ouvidos a sábia palavra: “Não perguntes o que é que a tua Pátria pode fazer por ti. Pergunta, antes,  o que é que tu podes fazer pela tua Pátria”?
À interpelação de Fernando Pessoa, Machico responde:
Por nós, aqui e agora VALEU A PENA!  

03.Jul.17

Martins Júnior

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