terça-feira, 3 de novembro de 2020

CEMITÉRIO DESCONFINADO

   


Vi-os entrar

Braçados de flores nas mãos

Lágrimas no rosto enxugadas

E breves

 

Só lhes senti o peso das passadas

Caídas nos meus ombros

Quando o silêncio falou

 

Eram preces, vagidos, soluços

Promessas não nascidas

Juras interrompidas

E tantas tantas que ficaram por dizer

 

E eram palmas éclogas vilancetes madrigais

Adágios e Allegros triunfais

Que a saudade tudo cria e nutre no seu seio

 

Por um instante

Descobri-me infinito Campo-Santo

Onde morrem sobrevivem ressuscitam

Homero e Camões Petrarca e Pessoa

Da Vinci Vieira e Pascal

 

Levou-me a lanterna de Diógenes

À campa rasa dos heróis

Corpos de argila braços salgados do mar

Levou-me à cerca-violeta das mulheres

Trigueiras Divas do Povo

E às algemas ainda não quebradas dos escravos

 

Não acompanho a romagem-espectáculo

Do dia dos finados

Porque em meu cérebro correm

Os rios subterrâneos de todos os cemitérios

Vencidos e vincendos

Não há lousa maior nem mausoléu

Como este imenso e meu

Estreito panteão

Que aperto entre uma e outra mão

Gótico verde na interior alameda dos ciprestes

 

No cemitério desconfinado que eu sou

Só me falta encontrar

Os sete palmos de terra

Onde toda a noite morro

Para todo o dia ressuscitar

 

02/03Nov.20

Martins Júnior

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