segunda-feira, 9 de novembro de 2020

TRÊS PARÁGRAFOS PARA SÓ UMA EMOÇÃO

                                                                          


Não, não sou e não serei o único a sentir na pele, desde a ponta dos dedos até ao vértice craniano, aquele baloiçar do azul atlântico, quando um povo multicolor colocou na mão pacífica de Joe Biden o calhau decisivo atirado ao charco que infestava o mar do Novo Mundo. Curvei-me, apaixonadamente rendido, à nomenclatura dominante: Uma pedra lançada na costa americana enche as marés de todos os continentes. Chegou aqui também a onda azul. E de tal forma que, assim como eu dizia “Je suis Charlie Hebdo”, também agora, no reverso da medalha, proclamo garbosamente: “I am American, I am Biden”!

Porque é “Hora de respirar um pouco de ar puro”… Peço ao nosso romântico intérprete que não pare a canção, enquanto vou sorvendo, a plenos pulmões, a brisa suave e gostosa que milhões de homens e mulheres, crianças, jovens e anciãos respiram em liberdade, tão ampla e  avassaladora que nem o corona vírus consegue travar.  Acabou-se o terror, dissipou-se o espesso fantasma, os punhos cerrados como feras, os esgares tribais, as calúnias mais repugnantes, a espuma e o vómito pelos dentes fora contra jornalistas, contra quem “se lhe atravessasse no caminho”. Acabou-se o sacrílego refúgio nas igrejas, de bíblia numa mão… e a arma na outra.

Ninguém, por certo, perguntar-me-á o porquê desta emoção sem limite. Não me perguntam, “mas eu adivinho”. E apresso-me a dizê-lo. É que “eu sou daquele tempo”… O tempo em que conheci um ridículo sósia de Trump: com os mesmos pavores disfarçados de furores, a mesma raiva (já não disfarçada) contra “quem se atravessasse”, os mesmos arrotos paranóicos na sala nobre do povo, os mesmos olhares estrábicos contra jornalistas e, cópia perfeita, a mesma manta sacrista servindo de escudo defensivo. Enfim, o super-imaginário Trump, dono de uma América de 741  Km2 e 250 mil habitantes.

Por isso, “Não, Não sou o único”  a respirar o ar puro que me traz o Atlântico, lá das praias americanas. Só espero que, um dia antes da partida, chegue a hora de poder  ver a ilha definitivamente azul. Porque, até hoje, essa hora ainda não chegou…

 

09.Nov.20

Martins Júnior      


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