domingo, 3 de outubro de 2021

OUTONO REVESTIDO DE PRIMAVERA NASCENTE – CERTEZAS E INCÓGNITAS

                                                                              


        Começar a semana quando começou o mundo: é inspirador e é premonitório. Porque sempre que o sol nasce ou a noite chega, há  a promessa de um amanhã novo à nossa espera. É o mundo que recomeça.

         Foi o LIVRO que nos trouxe hoje a inspiração, colocando-nos no ‘paraíso terreal’ como espectadores da criação dos dois  primeiro exemplares da nossa espécie: um Homem e uma Mulher. É meu propósito nesta fruição semanal, não a interpretação apologética do acontecimento, mas apenas um escopo serenamente didáctico sobre o mesmo.

1.     Da narração bíblica, que tem tanto de poético como de pitoresco e novelístico – é uma aberração imaginar-se, sequer, que a Mulher vale apenas uma costela do Homem – apraz-me citar o sábio teólogo Frei Bento Domingues: “Estas narrativas pertencem aos mitos de origem, não pretendem fazer ciência. Quem as lê como um dogma assinado por Deus perde o seu tempo e a ocasião de desfrutar da beleza destas peças literárias”.  Com efeito, a descrição de Moisés, no Génesis, (2,18-24) reflecte tão-só a mentalidade machista e patriarcal da civilização judaica e que foi severamente responsável pelo estatuto de subalternidade e servidão da Mulher através dos tempos, quer no judaísmo, no islamismo e na religião cristã e ocidental.

2.     O estigma genesíaco de ajudante ou auxiliar do Homem foi o pretexto para os fariseus proporem ao Nazareno a questão do “certificado de divórcio” que o marido tinha o direito de passar à Mulher, “despedindo-a por um motivo qualquer” (Ms.10, 2-16). Aí, o Mestre saiu em defesa da Mulher e instaurou o casamento monogâmico e indissolúvel, expressão máxima do Amor inquebrável, com todo o potencial de felicidade, entreajuda e plena realização que nele se contêm e, simultaneamente, com toda a gama de problemas, inibições e eventuais incógnitas que a vida traz.

3.     A este propósito – mormente os da vida conjugal – reproduzo aqui a observação que em África, Moçambique, no defeso das actividades militares, ouvi eu da boca de um emigrante europeu, aquando da Encíclica de Paulo VI, ‘Humanae vitae’ sobre a pílula e a limitação da natalidade: “Ó Capelão, explique-nos o que é que tem o Papa e o que é que tem a ver a Igreja para  se meterem na alcova do casal?”. Há segmentos e soluções que competem mais à ciência médica e psíquica do que à Igreja. Daí, a minha parcimónia no assunto, sem prejuízo do atendimento a quem o solicitar.

4.     Paralela a esta ideologia (e em contraposição) recordo aquele intelectual suíço que, há cerca de 60 anos no Porto Santo, confidenciou-me que dedicara a vida inteira  a neutralizar todas as tentativas de divórcio ou separação, convencendo casais problemáticos, quase  in extremis, a manterem a unidade conjugal. E justificou: “Ainda hoje sofro os traumas da separação dos meus pais, tinha eu apenas oito anos de idade”.

5.     “Maior milagre que mudar a água em vinho (como  nas Bodas de Caná da Galileia) é o milagre de unir duas vontades livres, essência do matrimónio. E suprema validade é o de conservá-lo por muitos e longos anos, contra ventos e marés.  Até os próprios pagãos, caso da Grécia Antiga, valorizavam a unidade conjugal personificada em Penélope e a tela que ela própria tecia durante o dia e desfazia-a durante a noite, sempre à espera do “seu” Ulisses levado para a guerra de Tróia. Com esse pretexto, evitou submeter-se ao veredicto do pai que pretendia casá-la com um príncipe pretendente.

6.     Nunca se sabe o que se passa dentro das quatro paredes de uma casa. Os tempos da pandemia que o digam. Por isso não nos é lícito julgar ninguém, muito menos na praça pública.

7.     E por isso também, Honra e Glória, palmas de Vitória a todos os casais que mantiveram acesa a chama do seu compromisso, superando dificuldades, atravessando vagas de mar alto, calcando sob os pés ensanguentados os espinhos e os abrolhos que se atravessaram no caminho.

 

Bem hajam todos aqueles e aquelas para quem a conjugalidade não foi apenas corpo. Foi também alma sempre viva e renovada !!!

 

02.Out.21

Martins Júnior

1 comentário:

  1. Desta excelente reflexão sobre a unicidade das nossas origens (homem e mulher), fico com a firme convicção que a família é muito mais alma que corpo e sem valores bem estruturados não há muralha que resista às mudanças dos tempos.

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