quinta-feira, 2 de novembro de 2023

VIDA E MORTE DE ISRAEL – DA BÊNÇÃO À MALDIÇÃO

                                                                            


        Dois hemisférios e dois mundos – 1 e 2 de Novembro – nos antípodas um do outro, tão perto e tão distantes!      Como tão longe ficam uma da outra a glória e a abjecção, a bênção e a maldição, a vida e a morte!

          1 de Novembro: a Vida no epicentro da história, Igreja Triunfante (como lhe canta o ritual litúrgico) chamemos-lhe o “Dia dos Óscares” para os gloriosos Felizes Bem-Aventurados!

          2 de Novembro: a Morte como epílogo, a meta que não foi cortada, mas imposta e, nalguns casos, auto-imposta. E se, para uns, muito poucos, é a coroa de louro na fronte dos atletas vencedores (“Aqueles que da lei da morte se vão libertando”) para outros, os governantes ditadores e os países que administram, significa a abjecção, o suicídio, a maldição.

          Coube-me, neste ano de 2023, contemplar o extenso mural da história e nele ver desfilar, como protagonista impressivo, um nome incontornável – mapeado de exaltação sagrada, sangue derramado, dominação e escravidão – um nome, um povo e uma nação que incarnam toda a semântica do 1 e 2 de Novembro

Epopeia trágica em dois Actos!

          No Antigo Testamento, Israel, povo escolhido, Povo de Deus. Israel, morada única de Iahveh-Jeovah, cujo representante ostentava a tripla tiara de Sacerdote, Profeta e Rei! Israel, regime intocável, porque teocrático, poderoso por ter como Comandante Supremo o “Senhor Deus dos Exércitos”, amado e temido, umas vezes misericordioso, outras vingativo, mas sempre, sempre respeitado e adorado. Enfim, a Glória de Israel!

          Volvidos milénios sobre milénios de errância nómada por todo o planeta, outorgaram-lhe, a Israel, uma nacionalidade, um Estado Soberano, desde 1948, sob compromisso de respeitar os territórios dos palestinianos, o que nunca cumpriu. Pelo contrário, com o alargamento dos colunatos, os habitantes da Palestina viram-se sitiados, presos e vigiados na sua própria terra, durante 75 anos, um sufoco que explodiu no bárbaro assalto do Hamas  – ouçam bem os fanáticos defensores de Israel a opinião de quem escreve estas linhas! – bárbaro assalto, a todos os níveis condenável, contra inocentes israelitas indefesos.

          Foi então que a ‘sacrossanta’ Israel galgou a onda e descarregou a mais cega violência contra indefesos palestinianos inocentes. Ao contrário dos antepassados hebreus, cujo êxodo partiu da escravatura para a liberdade da pátria amada, hoje os israelitas seus descendentes expulsam os palestinianos para a mais execranda escravidão e para  o ostracismo, um “nefando genocídio”, ao menos na forma tentada e ainda em acção na Faixa de Gaza. Hoje, 2 de Novembro, choram-se na Palestina e em todo o mundo os milhares de mortos, sepultos e insepultos - sobretudo as crianças - que me trazem à memória o pranto  daquela mãe judia, Raquel, inconsolável pela morte dos filhos, de quem nos fala o profeta Jeremias (31,15). E ao ver centenas de expatriados para o Egipto, revejo uma criança, nascida em Belém, transportada nos braços da mãe a caminho do mesmo Egipto para fugir às garras assassinas de Herodes. Passados mais de dois mil anos, ‘ei-los que partem velhos e novos’, rumo à mesma nação vizinha, para escapar ao genocídio de um outro Herodes, de nome Netanyahu.

          Ao fazer estalar as bombas sobre os campos de refugiados, quem morre é a própria Israel que, sem pudor, se considera auto-vitoriosa. É tão degradante este vexame, ultraje insanável na história do Povo de Israel, que em muitos templos cristãos o atributo Israel, glorioso nome de outrora, foi banido dos cânticos e orações litúrgicas. E com toda a justiça. Adeus, “Shalom, Shalom”, Terra da Paz”. Não mais, “Portas Sagradas de Jerusalém”!  

          Da minha parte, já faz algum tempo que, em retiro anual do clero diocesano, manifestei ao bispo e aos colegas presentes a minha recusa em fazer da Salmódia uma oração, como tem preceituado a Igreja. Poderei seguir o texto dos Salmos de David – Sacerdote, Profeta e Rei – apenas como informação do devocionismo do seu suposto autor, mas nunca como módulo de oração, visto que estão pejados de guerras ( o vocábulo ‘inimigos’ é uma espécie de repetido refrão), imprecações e ameaças contra os exércitos opositores, pragas horrendas, como as do Salmo 135 (136), que reza o seguinte: “Senhor, tornai felizes e bem-aventurados todos aqueles que agarrarem as crianças dos nossos inimigos e as despedaçarem contra a rocha”.

          Quem, senão os monstros Herodes e Netanyahu, poderá fazer destas hediondas palavras uma oração?!

 

          01-02.Nov.23

          Martins Júnior         

 

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