quinta-feira, 7 de maio de 2020

MACHICO, PRIMEIRA CAPITANIA DA MADEIRA


                                                       

Esperei até ao fim do dia ímpar para poder chegar às portas do dia oitavo e abri-las de par em  par com esta nova: “Alvíssaras, Machico! Chegou o teu dia, o da Proclamação do teu nascimento autónomo para a História”.
Eis-me aqui, feito estafeta, moço do Infante, transportando o extenso e solene ‘alvará’ da identidade primeira de Machico:

CARTA DE DOAÇÃO

“Eu, o Infante Dom Henrique, Regedor da Ordem de Nosso Senhor Jesus Christo, Duque de Viseu, Senhor da Covilhã……………………….
Faço saber a quantos esta virem que dou cargo a Tristão, Cavalleiro da minha caza, na Ilha da Madeira des além do Rio do Caniço, de passar, como váe, pelo rio acima até à ponta de Tristão, que elle mantenha, por Mim, em Justiça e Direito, e morrendo elle, a Mim praz que o seu filho 1º ou 2º se tal fôr, tenha este Cargo por guiza SUSODETA e assim descendentes por linha direita……………….....................................
ITEM Me praz que todos os fornos de pão………………………………………
ITEM Me praz, que tendo elle sal para vender…………………………………     
ITEM Me praz, que elle possa dar por suas contas Cartas …………………………
Outro si Me praz, que os gados bravos possam matar os da Ilha ……………………
Em testemunho disto, lhe mandei dar esta Carta assignada por Mim e sellada de Meo sello. Feito em Santarém aos oito dias de Maio. Ayres Pires a fez, ãno de 1440. O INFANTE D. HENRIQUE”.
         Daqui, do século XXI, o nosso olhar deverá alcançar mais longe e divisar no pico mais alto da nossa história não só o 2 de Julho de 1419, do Achamento da Ilha e desembarque na nossa baía, mas mui particularmente aquele “8 de Maio de 1440”, porque ele atesta o marco da supremacia de Machico em toda a Madeira, dado que ao Funchal foi outorgada tal distinção, dez anos depois, em 1450.
         Em boa hora, os machiquenses, através da sua edilidade, colocaram  no seu devido trono a efeméride maior do seu percurso hexa-secular. Cientificamente está provado que persistir no grave lapso de “1803” significaria amputar a Machico 400 anos da sua existência.
Seria esconder a personalidade dos machiquenses, demonstrada em muitos expressões de resiliência face a poderes exógenos que pretendiam afectar a sua autonomia e os seus direitos. Seria ignorar a elevada consideração do Infante D. Henrique por Machico quando pessoalmente recomendou ao Prior de Tomar, D. Frei Pedro Vaz, enviasse o Padre Frei João Garcia como primeiro vigário da paróquia de Santa Maria de Machico. Recomendação esta que foi  reiterada pelo Infante D. Fernando em carta escrita ao novo Prior de Tomar, D.Pedro de Abreu, em 12 de Setembro de 1469.
Começar o Dia Áureo de Machico pelo “9 de Outubro de 1803” corresponderia ao esquecimento total das restantes freguesias do concelho. Consideremos a data da criação da Freguesia de São Sebastião, do Caniçal, por alvará d’El-Rei D. Sebastião em 12 de Setembro de 1564: ou a de Santa Beatriz, de Água de Pena, por alvará régio de  D. Sebastião, em 14 de Junho de 1572;  ou, ainda, a de Nossa Senhora da Guadalupe, do Porto da Cruz, por alvará do mesmo monarca, em 26 de Setembro de 1577. De registar a anexação da Ribeira de Machico  à  Freguesia de Santo António da Serra, por deliberação da Câmara de Machico, de 18 de Dezembro de 1781.
Perante toda esta síntese de dados colhidos nos Anais de Machico, o Dia do Concelho nunca poderia começar por 1803, visto que estaríamos a criar um pequeno monstro e uma enorme falácia, isto é, os filhos e filhas (as freguesias) teriam nascido primeiro que o cabeça-de-casal…
Seria um longo estendal de memórias a evocação do grande oceano que é a nossa história. Não poderei, seja por que for, deixar de formular esta interrogação – que acaba por ser um veemente canto exclamativo: Como esquecer todo um passado, ao saber que já em 1633, o vimaranense Manuel Tomás, no seu poema épico “INSULANA”, celebrava a beleza acolhedora da nossa baía!? O mesmo direi de um outro vate, madeirense de gema, nascido em 1768, Francisco de Paula Medina e Vasconcelos na sua obra “ZARGUEIDA”. Nesta galeria de poetas, ergue-se, como príncipe dos vates de Machico e da Madeira, o exímio cultor do “Soneto”, Francisco Álvares de Nóbrega, nascido aqui em 1773!
Quanta gente, quantos vultos distintos, estrelas de primeira grandeza ficariam no obscuro se se contasse Machico, só a partir de “1803”…
Da minha modesta mas patriótica Proclamação por Machico não verei a tradução apoteótica que merece este Dia. Assim nos obriga o confinamento do “Covid-19”. Louvam-se as iniciativas particulares, as actuações musicais  e as mensagens da edilidade transmitidas pelas redes sociais. Da nossa casa, do nosso jardim, da nossa janela ou da nossa varanda saudemos entusiasticamente o Nosso Dia. E se o “19 do Convid” não nos deixa juntar na praça pública, levantemos mais alto um outro “19” - o do Achamento - e o “8 de Maio de 1440” – a bandeira autonómica da Nossa Capitania, a Primeira da Madeira!

7/8.Mai.20
Martins Júnior   


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