terça-feira, 9 de junho de 2020

NADA SE MEDE AOS PALMOS ou “SMALL IS BEAUTIFUL”


                                                                     

          Não vou incomodar o repouso dos justos nem sequer remexer a terra ainda fresca e sadia, onde o nosso Padre Tavares ensaia o “seu soninho primeiro”.  Mas, do mesmo passo, não consigo remeter ao silêncio da morte quem não teve outro pulsar nem outro sentir senão a Vida – sempre viva, sempre jovem, sempre fértil, reprodutiva. Por isso, tentarei exumar a sua memória, mantê-la acesa e fecunda para todos aqueles que, inelutavelmente, continuam a marcha da vida, sem pensar (e bem!) que estão em lista de espera para o ‘confinamento final’.
         Foram imponentes as exéquias, participadas pelo Prelado, muitos colegas presbíteros, autoridades, muito povo. Como convinha ao protocolo solene, embora desadequado da singeleza e da transparência do homenageado. Porque para ele – e demonstrou-o na indumentária que escolheu na última viagem – o que importa é a essência e não a aparência, a seiva mais que a casca, a nudez eloquente mais que os ouropéis vazios e fugazes. No Padre Tavares, tudo era o elogio da verdade sem pregas, da natureza aquímica, da pequeneza franca contra a opulência barroca e bacoca.
         Sempre que olhava o Padre Tavares via na sua fronte o título que Ernst Friedrich Schumacher deu ao livro que publicou em 1973: Small is Beautiful. O título e o conteúdo. Dou-lhe uma tradução mais telúrica – “Nada se mede aos palmos” - precisamente para enaltecer o Homem e a Terra que ele incorporou em todo o seu percurso. Figura frágil,  meã, nascido na mais genuína ruralidade. Igual a ele, a terra pequena, resguardada nas montanhas, esquecida do mundo, apertada pela exiguidade de meios. Enfim, todos os arreios para ficar presa, anónima, geneticamente condenada ao ‘confinamento perpétuo”, sem direito ao cartão de cidadania.
         É esta aldeia  escassa e é este homem ‘pequeno’ que quero exaltar. “Cantando espalharei por toda a parte”, quem me dera poder fazê-lo como o nosso épico. Porque no mercado vilão das vaidades mundanas, só há palanque para os polvos gigantes, para os lagartos garimpeiros, para os que, envergonhados da terra onde nasceram, crescem à custa das altas cúpulas hospedeiras. Valorosos são os que do sequeiro fizeram rico vergel e da pedra extraíram pão.
         O Autor do Small is Beautiful traça as linhas programáticas para o futuro de um planeta habitável, o nosso. Ao examiná-lo, descubro, um por um, a personalidade criativa do Padre Tavares, o seu sonho sempre inacabado, mas já plasmado na terra e nas pessoas que a habitam. Ei-las, sucintamente:
         “A ecologia e o combate à poluição, Respeito pelos recursos naturais, Desenvolvimento rural, Ajuda eficaz (não apenas publicitária) aos países pobres, Criação de pequenas e médias empresas que evitem a desumanização dos trabalhadores, Educação como solução ideal”.
         Outro rumo não teve toda a vida do Padre Tavares. E se Ernt Schumacher o tivesse conhecido  tê-lo-ia proposto ao mundo como o mais eficiente intérprete do seu livro e como exemplar construtor do Mundo Novo que urge recriar, sob pena da destruição do planeta.
         Por isso e porque todos nós precisamos de referenciais iluminantes nos meandros obscuros do quotidiano, dedicarei os próximos escritos à Vida e Obra do lutador, pedagogo e arquitecto de um Mundo Melhor, o Padre Mário Tavares Figueira.


09.jun.20
Martins Júnior
   
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1 comentário:

  1. Tenho a perceção que muita gente sem nome de palco lê estas profundas reflexões do Pe. Martins Júnior, sobre o que lhe escorre de mais familiar e de mais gritante na alma. Argumenta-las não é a praia de todos, porque exige um urdido trabalho critico à altura do nível intelectual, em que são na verdade estruturados estas reflexões. No entanto, lê-las, já é um ganho maior, e uma das formas de respirar ar puro e de construir pedra sobre perda, aquilo que somos e vamos oferecendo humildemente aos outros.

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